quinta-feira, novembro 28, 2013

Um vice-primeiro-ministro com tanto de mentiroso, como de vicioso e lariloso (ou panascoso como é costume dizer-se no Parque Eduardo VII)


"2013 será o melhor ano de sempre das exportações"
garante o Paulinho das Feiras


O vice-primeiro-ministro voltou a referir uma viragem económica para o país. As declarações de Portas foram feitas à margem da abertura de mais uma edição do "Portugal Exportador". O governante afirmou que nos últimos cinco anos, o peso das exportações no Produto Interno Bruto (PIB) passou de 28% para 41%. A economia portuguesa está em crescimento há 2 trimestres, tendo saído do buraco da recessão técnica.

[Público - Sem os combustíveis, as exportações teriam crescido 1,5% e não 4,1% até Maio. Mais de dois terços do crescimento das exportações de bens registado durante os primeiros cinco meses do ano é explicado pelo aumento da venda de combustíveis transformados em Portugal, algo que teve o contributo decisivo da entrada em funcionamento de uma nova unidade de refinação da Galp em Sines. O acréscimo de produção para exportação tem vindo a aumentar, à medida a que se assiste a uma quebra muito acentuada da procura interna.]

[As empresas exportadoras representam uma percentagem muito pequena do total de empresas portuguesas. Em Portugal, segundo o INE, existem cerca de um milhão de empresas, e menos de 0,5% é que exportam. As restantes, que são mais de 99,5%, vivem apenas do mercado interno.
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Paulo Portas, embora radiante com o exponencial aumento das exportações dos nossos jovens mais qualificados, saliva pesaroso por ver os produtos tão do seu agrado (exceto moçoilas) terem de ir para fora do país... para tão longe dele, de São Bento, de Lisboa, do Parque Eduardo VII...


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Por motivo de uma política assassina, levada a cabo por funcionários bancários que a Grande Finança colocou à frente do governo português, os maiores ativos do país - jovens licenciados, jovens com mestrados e jovens doutorados – são exportados às pazadas para países que agradecem receber por tuta e meia uma riqueza que foi paga e produzida num Estado cada vez mais pária.


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Expresso – 29.11.2012

A melhor geração está de partida

Olhamos à nossa volta e vemos, todos os meses, milhares de jovens emigrar. Ouvimos amigos e filhos de amigos falar dos seus planos para partir. Não com a satisfação de quem procura novas experiências, mas com a frustração de quem sente que o País onde nasceu não lhe dá nem lhe dará no futuro qualquer oportunidade.

Comparamos muitas vezes esta emigração com a do passado. É incomparável. O que estamos a perder agora são as primeiras gerações de gente qualificada. Qualificada graças a um investimento que, no discurso dominante, é tida como um luxo incomportável.

[...] O emigrante atual é jovem, qualificado e procura carreira, e não apenas dinheiro para sobreviver no estrangeiro e depois regressar. [...] Esta vaga de emigração não terá apenas um efeito catastrófico no já desastroso equilíbrio demográfico do País. Terá efeitos profundos na sustentabilidade da segurança social, na competitividade da nossa economia, na capacidade de inovação e em todos os domínios do futuro de Portugal. Envelhece, desqualifica e atrasa o País.

[...] Estes emigrantes são sobrequalificados para o tecido empresarial português, que, por culpa própria e do Estado, não acompanhou o investimento público na qualificação do trabalho. O modelo de desenvolvimento que este governo defende, com uma aposta na competitividade pela redução dos custos de produção, não dá aos jovens emigrantes qualquer esperança de regresso. Portugal acentua todas as razões que os levam a partir.

[...] Pode até acontecer que esta seja a última vaga de emigrantes qualificados. Por uma simples razão: se o nosso modelo económico despreza a qualificação, deixaremos, com o tempo, de qualificar os nossos jovens. [...] E agora, que os nossos amigos, os nossos filhos e os nossos netos partem, porque os que sempre viram estas conquistas como "demasiado generosas" finalmente levaram a melhor, choramos por o que estamos a perder.

segunda-feira, novembro 25, 2013

Sobre a diferença dos que veem o Governo como uma caterva de incompetentes (com uma ideologia neoliberal suicida), e dos que o veem como um grupo de criminosos (a soldo da ganância assassina dos que controlam a Finança)


PAPA FRANCISCO INCITA À VIOLÊNCIA

Jornal Público - 26/11/2013

Papa Francisco: "ESTA ECONOMIA MATA"!

O Papa Francisco atacou o capitalismo sem limites como “uma nova tirania” e advertiu que a desigualdade e a exclusão social "geram violência" no mundo e podem provocar "uma explosão", na sua primeira exortação apostólica, divulgada nesta terça-feira pelo Vaticano.

O Papa Francisco expressa mais claramente do que nunca as posições que tem vindo a assumir de luta contra a pobreza e a exclusão neste documento. Apelou aos políticos para que garantam a todos os cidadãos “trabalho digno, educação e cuidados de saúde”, e aos ricos para que partilhem a sua fortuna: "Tal como o mandamento 'Não matarás' impõe um limite claro para defender o valor da vida humana, hoje também temos de dizer 'Tu não' a uma economia de exclusão e desigualdade. Esta economia mata", afirma Francisco na exortação apostólica.


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Mário Soares: "o sr presidente e o governo devem demitir-se (...), enquanto ainda conseguem ir para casa pelo próprio pé".

Mário Soares não teve meias palavras na abertura do encontro que promoveu na Aula Magna, em Lisboa, descrevendo a situação do país como "de grande risco" e mesmo "a caminho da ditadura". O ex-chefe de Estado pediu a demissão do governo e do actual Presidente e afirmou que "a violência está à porta".

Mário Soares considerou a acção de Cavaco Silva "inaceitável", porque "jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição e não o está a fazer". "Só protege um único partido, que é o seu próprio", disse Soares convidando o Presidente e o governo a demitirem-se "enquanto ainda podem ir para as suas casas pelo seu próprio pé". Se isto não acontecer, de acordo com a tese do ex-presidente, "serão responsáveis pela onda de violência que aí virá e que os vai atingir".

Para Mário Soares, Cavaco Silva "é o principal responsável da situação inaceitável a que se chegou. Porque é o protetor do seu partido e também não dialoga com ninguém, porque tem medo de sair à rua e falar com as pessoas. Lá saberá porquê", remata o histórico socialista, depois de chamar a atenção para a "situação de desespero em que as pessoas estão, que pode conduzir à violência". Soares defende ainda que só um novo Governo e um novo Presidente poderão criar condições para "dialogar com as pessoas, lutar contra o desemprego e evitar os suicídios, o desespero, a criminalidade, a emigração e a miséria".


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Àqueles (cada vez menos) que consideram um apelo à violência as palavras de Mário Soares e que dizem: "o Governo foi eleito democraticamente", "as instituições parecem funcionar normalmente", "estamos a respeitar os nossos compromissos (porque somos um Estado de bem)", é necessário fazê-los compreender que o Estado está sequestrado por uma Máfia Financeira, cujos tentáculos dominam:


1 - O Governo: um bando de "funcionários bancários" que passam por políticos e que tem por único propósito enriquecer a Banca à custa do Estado, das Empresas e da População;

2 - A Assembleia da República (que não passa de um centro de corrupção e de uma grande central de negócios);

3 - Os Grandes Escritórios de Advogados que redigem legislação perfeitamente impercetível, com muitas regras para ninguém perceber nada, muitas excepções para beneficiar os amigos e um ilimitado poder discricionário a quem aplica a lei;

4 - A Procuradoria-Geral da república que, não só não investiga, como trava as investigações;

5 - Os Media: os jornais e as televisões com os seus exércitos de propagandistas mentirosos a entrarem-nos diariamente em casa.


E, sabendo disto, não terá a população motivos mais que suficientes para se revoltar violentamente? As condições não estarão reunidas para que cidadãos civis, polícias e militares iniciem a caça à escumalha que nos está atirar a todos para a miséria, a fome, o desemprego, a criminalidade, o suicídio e a morte?

A política deste governo tem sido de uma violência inaudita contra milhões de portugueses. E numa situação em que um povo inteiro está sonegado de todas as entidades que o deveriam defender contra a Máfia do Dinheiro, acolitada por políticos corruptos, legisladores venais e comentadores a soldo, só existe uma solução para resolver a «Crise»... Somos 10 milhões contra algumas centenas de sanguessugas... e não há buracos suficientes para elas se esconderem...


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Não há um único indivíduo honesto em cargos de alguma relevância política e sobretudo no Governo. Toda esta escumalha ascendeu a cargos políticos de importância por decisão, a priori, da Banca. Somente por já estarem vendidos, à partida, à Grande Finança é que esta os colocou em cargos de poder político.

A Banca escolheu para "governar" o país uma escória que sabia lhe iria ser submissa, sem rebuço, sem vergonha e com um pingo de humanidade. Sem o apoio da Banca, esta canalha nunca teria chegado a cargos de poder. E, naturalmente, depois do trabalhinho feito, depois de tudo terem feito para encher a mula à Banca, esta recompensa-os com cargos muito bem pagos, tanto nas suas fileiras como em grandes empresas por ela controladas.

A recompensa aos governantes por terem colocado a riqueza do país e dos cidadãos nos bolsos do Poder Financeiro:


Banca é refúgio para ex-ministros

Jornal Expresso - 2 de Outubro de 2010



Dirigentes do Bloco estudaram o percurso de 115 ex-governantes: 84 foram para a Banca ou tiveram uma ligação ao sector bancário, passando por órgãos sociais dos mais diversos bancos. Mais interessante ainda: desses 84 ex-governantes com ligação à banca, na grande maioria dos casos (56, ou seja, dois terços,) essa ligação não tinha antecedentes, e só surgiu depois da passagem pelo Governo.

Os dados apurados permitem aos autores sustentar a tese da integração sistémica assegurada por estes dirigentes... A generalidade dos bancos reconhece a importância deste "ativo estratégico" e vai buscar ex-ministros e secretários de Estado (sobretudo os que passaram pelas finanças e economia, mas não só...

A banca é o máximo denominador comum neste universo, mas os ex-governantes ganharam destaque nas mais variadas empresas e grupos económicos. Destaque-se o Grupo Mello, as empresas públicas ou aquelas onde o Estado tem participação relevante também se tornam autênticos albergues de ex-governantes — veja-se a CGD, a PT ou a EDP...

Por outro lado, esta contaminação entre política e negócios permite "a promoção de uma meteórica mobilidade social ascendente", pois a passagem pelo Governo é "um condão que transforma dezenas de quadros técnicos, docentes universitários ou responsáveis partidários em administradores de empresas privadas ou participadas, com acesso a rendimentos absolutamente incomparáveis com os auferidos anteriormente”.

Os bloquistas apontam um terceiro aspeto deste fenómeno: a "forte promiscuidade", com “governantes que transitam diretamente da tutela para a gestão de topo de empresas cujo quadro de atuação condicionaram imediatamente antes”. Há bons exemplos nas obras públicas (Ferreira do Amaral, Jorge Coelho, Luís Parreirão) e na energia (Pina Moura, Fernando Pacheco). A grande maioria dos ex-governantes portugueses que se dedicaram aos negócios privados têm ou tiveram uma ligação ao sector bancário...


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A ilusão da livre escolha entre Direita e Esquerda




The Establishment's Two-Party Scam

Chris Gupta: Esta fraude consiste na fundação e financiamento pela elite do poder de dois partidos políticos que surgem aos olhos do eleitorado como antagónicos, mas que, de facto, constituem um partido único. O objectivo é fornecer aos eleitores a ilusão de liberdade de escolha política e serenar possíveis sentimentos de revolta contra a elite dominante.

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Dr. Stan Monteith: "De há muito, o principal problema da vida política americana tem sido tornar os dois partidos congressionais (o partido Republicano e o partido Democrata) mais nacionais. O argumento de que os dois partidos deviam representar políticas e ideias opostas, uma, talvez, de Direita e a outra de Esquerda, é uma ideia ridícula aceite apenas por teóricos e pensadores académicos. Pelo contrário, os dois partidos devem ser quase idênticos, de forma a convencer o povo americano de que nas eleições pode "correr com os canalhas", sem na realidade conduzir a qualquer mudança profunda ou abrangente na política."

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George Wallace (foi candidato à Presidência norte-americana. Este afirmou: "... não existe diferença nenhuma entre Republicanos e Democratas."
"... A verdade é que a população raramente é envolvida na selecção dos candidatos presidenciais; normalmente os candidatos são escolhidos por aqueles que secretamente mandam na nossa nação. Assim, de quatro em quatro anos o povo vai às urnas e vota num dos candidatos presidenciais seleccionados pelos nossos 'governantes não eleitos.' Este conceito é estranho àqueles que acreditam no sistema americano de dois-partidos, mas é exactamente assim que o nosso sistema político realmente funciona."

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O Professor Arthur Selwyn Miller foi um académico da Fundação Rockefeller. No seu livro «The Secret Constitution and the Need for Constitutional Change» [A Constituição Secreta e a Necessidade de uma Mudança Constitucional], que foi escrito para aqueles que partilhavam os segredos da nossa ordem social, escreveu:

"... aqueles que de facto governam, recebem as suas indicações e ordens, não do eleitorado como um organismo, mas de um pequeno grupo de homens. Este grupo é chamado «Establishment». Este grupo existe, embora a sua existência seja firmemente negada; este é um dos segredos da ordem social americana. Um segundo segredo é o facto da existência do Establishment – a elite dominante – não dever ser motivo de debate. Um terceiro segredo está implícito no que já foi dito – que só existe um único partido político nos Estados Unidos, a que foi chamado o "Partido da Propriedade." Os Republicanos e os Democratas são de facto dois ramos do mesmo partido."

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O Professor Carroll Quigley, foi o mentor de Bill Clinton quando este era um estudante na Universidade de Georgetown.  O Professor Quigley deu aulas tanto na Universidade de Harvard como na de Princeton antes de se fixar na Universidade de Georgetown.

No seu livro «Tragedy and Hope: A History Of The World In Our Time» - [Tragédia e Esperança: uma história do Mundo dos nossos dias], Quigley documenta as origens da sociedade secreta que controla os nossos partidos políticos hoje e que se manifesta nas posições chave ocupadas pelo Council on Foreign Relations [Conselho das Relações Exteriores].

"... De forma optimista, podem sobreviver para o indivíduo comum os elementos da escolha e liberdade no sentido em que ele será livre de escolher entre dois grupos políticos antagónicos (mesmo que estes grupos tenham pouca latitude de escolha política dentro dos parâmetros da política estabelecida pelos especialistas), e o indivíduo tenha a oportunidade de escolher mudar o seu apoio de um grupo para outro. Mas, em geral, a sua liberdade e poder de escolha serão controlados entre alternativas muito apertadas"...


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Discurso integral de Pacheco Pereira:

Como é que vos (nos) devo (devemos) tratar?

Queria evitar o frémito que Mário Soares provocou na última destas reuniões ao me chamar "camarada", coisa que gerou alguma excitação nas hostes. Devo por isso dirigir-me ao nosso anfitrião como "companheiro", a fórmula de conveniência, que se usa, ou melhor, usava no PSD? Ou, na tradição republicana, "correlegionário"? Ou devo lembrar que "camarada" é, entre outras coisas, uma fórmula de tratamento que os nossos militares aqui presentes reconheceriam nos seus "camaradas de armas"? Ou, se ainda houvesse tipógrafos, lembrar que esta era uma forma de tratamento comum entre profissionais de vários ofícios, para além dos ideais políticos de cada um? Ou, para fugir à carga das palavras, sinal também ela da crise que atravessamos, usar uma fórmula de tratamento esquecida, usada pelos velhos operários esperantistas, "samideano", no seu significado de "com as mesmas ideias", ou numa tradução de um dicionário esperantista, "co-idealista"? Não devo, porque há muitos materialistas na sala e não há palavra, nem em esperanto, para co-materialista.

Vou usar outra fórmula, aquela que o Manuel Alegre conhece bem, que vinha da Rue Auger, Alger, Algerie e que iniciava as emissões da Rádio Voz da Liberdade, com um tonitruante "Amigos, companheiros e camaradas".

Como membro de uma minoria em extinção, pelo menos no topo do meu partido, o PSD, a dos social-democratas, não se espere de mim nem uma palavra de justificação por aqui estar. Bem pelo contrário, farei a muitos a pergunta de por que razão não estão aqui de corpo, já que de espírito muitos estarão. Não os represento, não represento ninguém a não ser a mim próprio e mesmo assim de forma bastante imperfeita, mas os tempos não estão para inércias nem para confortos, nem para encontrar pretextos do passado, ou diferenças no futuro, para não se lutar, não pelas mesmas coisas, mas contra as mesmas coisas. Em momentos de profunda crise, tem que ser assim, sempre foi assim, e esse é o sentido mais profundo deste tipo de iniciativas de Mário Soares. O incómodo que geram, no poder e na oposição, vem disso mesmo.

Nós somos de facto muito diferentes entre nós, somos aquilo que no mundo anglo-saxónico se chamaria "strange bedfellows", estranhos companheiros de cama. Não se assustem as almas pudibundas, porque a expressão vem de Shakespeare e refere-se ao manto em comum que protege os marinheiros da tempestade, "misery / acquaints a man with strange bedfellows".

Na verdade, estranha assembleia esta que junta quem quer rasgar o memorando e colocar delicadamente a troika na rua, quem a quer colocar na rua menos delicadamente, com quem aprovou o chamado Pacto Orçamental, com quem pensa que o memorando, filho da necessidade extrema, podia ser aplicado de modo muito diferente, sem o rastro de incompetências e mistelas ideológicas deixado nestes dois anos.

É ambígua essa "unidade"? É sem dúvida, mas seria muito mais perigoso não ter qualquer forma de entendimento quando o mal que se está a fazer ao país, a Portugal, a tempestade que nos assola, é tão grave que considerações de conveniência só servem o Deus dos trovões e da chuva que nos quer afundar o navio. Sim, até porque muitos marinheiros já estão na água, como aqueles a quem se chama eufemisticamente "desempregados de longa duração", ou seja, aqueles portugueses cuja vida está estragada até ao fim dos seus dias.

E nem sequer estou certo que o que nos une seja o lema deste encontro: "Em defesa da Constituição, da democracia e do estado social". Não me entusiasma como lema, ninguém se mobiliza por uma lei, mas por aquilo para que essa lei serve, ou aquilo que essa lei defende: democracia, confiança, soberania, contrato social. Ninguém se mobiliza pelo “estado social” que é muitas vezes uma abstracção ideológica. Mobiliza-se por que todos possam ter uma vida decente, saúde, educação, segurança, – muita gente esquece-se que existe também um direito à segurança, – e para que ninguém possa ser excluído desses bens básicos porque não tem dinheiro. E se alguns podem, devem apoiar os que não podem, não como caridade ou assistência, mas como forma natural de viver em sociedade. Tão simples como isso. Vem no Programa do PSD escrito por Sá Carneiro, vem na doutrina social da igreja.

Mas, acima de tudo, custa-me a ideia de que o papel dos que aqui estão seja apenas "defender" como se estivessem condenados a travar uma luta de trincheiras. Não, os que aqui estão não estão a defender coisa nenhuma, mas a atacar a iniquidade, a injustiça, o desprezo, o cinismo dos poderosos para quem a vida decente de milhões de pessoas é irrelevante, não conta, é um "custo" que se deve "poupar". A transformação da palavra "austeridade" numa injunção moral serve para um Primeiro-ministro, apanhado pelo sucesso dos celtas, sorrir cinicamente para nos dizer que a "lição" da Irlanda é a ainda precisamos de mais austeridade, ainda precisamos de mais desemprego, ainda precisamos de mais pobreza. E sorri muito contente consigo mesmo.

O discurso de contínua mentira e falsidade que nos diz como se fosse uma evidência, que “as empresas ajustaram, as famílias ajustaram, só o estado não o fez”, como se as três entidades fossem a mesma coisa e o verbo "ajustarem" significasse o retorno a um estado natural das coisas de que só o vício de quererem viver melhor afastou os portugueses. Na verdade, pode-se dizer que "as empresas ajustaram". Sim algumas "ajustaram", mas a maioria "ajustou" falindo e destruindo o emprego, - que para quem não tem outra "propriedade" é o seu modo de vida. As famílias não "ajustaram", empobreceram e estão a empobrecer muito, para ter que ouvir como insulto os méritos de perderem a casa ou o carro, ou a educação superior para os seus filhos, e o valor moral de deixar de comer bife e passarem a comer frango.

No entanto, há uma coisa em que estou de acordo, de facto o estado não "ajustou", continua religiosamente pagar os desmandos dos contratos leoninos das PPPs, a negociar com vantagem para o sistema financeiro, os contratos swap, em vez de receber a lição do sucesso judicial de empresários que recorreram aos tribunais, a baixar uns impostos para algumas empresas ao mesmo tempo que continua a permitir que um contínuo entre um establishment no poder ligado ao sector financeiro capture as decisões políticas, tornando intangíveis os seus interesses na razão directa em que viola todos os contratos com os homens e mulheres comuns, destruindo toda a confiança que numa sociedade democrática é a garantia do contrato social.

Nos comícios da oposição antes do 25 de Abril cantava-se muito o hino nacional. No grande comício de Norton de Matos no Porto, em 1949, deve-se ter cantado pelo menos meia dúzia de vezes, nem que seja pelo prazer de gritar o "às armas", que mais do que um grito "às armas", - estejam sossegados não é isso que quero dizer, - era um grito pela resistência da nação face aos seus inimigos. Não sei se os organizadores desta sessão previram esse acto, mas deviam ter pensado nisso porque é de Portugal que se trata e o hino não é só para usar no futebol.

Quem sente Portugal como uma comunidade, dos pescadores do Algarve, da Nazaré, das Caxinas, dos pequenos empresários de Leiria ou de Viseu, dos operários têxteis do Ave, dos professores de todo o país, dos agricultores dos Açores, do Minho ou do Ribatejo, dos comerciantes do Porto e de Lisboa, dos universitários de Aveiro ou de Braga, dos funcionários públicos que permitem o funcionamento de escolas, tribunais, municípios e hospitais, dos trabalhadores da indústria metalomecânica, da cortiça, dos moldes, dos transportes, dos agentes das forças de segurança e militares, dos reformados e pensionistas, percebe a enorme destruição desta crise, que atinge avós, pais e netos, todas as gerações, que atinge quem tem muito pouco e quem ainda tem alguma coisa, mas que não atinge quem tem muita coisa. Esta é que é a nossa comunidade, um Portugal cuja mera enunciação viola a afrontosa redução de tudo e todos à ambígua designação de "empreendedores" de um lado e "piegas" gastadores do outro. Ou que torna inaceitável o obsceno uso da palavra soberania ou do protectorado para desresponsabilizar o governo e os seus apoiantes de políticas que abraçaram com todos os braços, e que agora, quando correm mal, fazem de conta que não é com eles.

O que nos une aqui é um outro dilema, a "questão que temos connosco mesmos" do poema de Alexandre O’Neil:

Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso,
fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes,
sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de todos nós . . .

É para não termos esse remorso que estamos aqui, não à defesa, mas ao ataque. Ao ataque por todos os meios constitucionais.

Por aquilo a que chamávamos no passado "a nossa pátria amada".


quarta-feira, novembro 20, 2013

Alvin Toffler: O governo da maioria, o princípio legitimador-chave da era da Segunda Vaga, está crescentemente obsoleto. Não são as maiorias, e sim as minorias, que contam.


DEMOCRACIA DIRECTA (I Parte)


Texto meu: «No último século e meio, o mundo civilizado só conheceu dois tipos de governo: o Ditatorial e a Democracia Representativa – qual deles o mais perverso. Entretanto, hoje, a evolução da Informática e das Telecomunicações está em condições de colocar o poder de decisão nas mãos dos cidadãos. De que é que estamos à espera?»




"A Terceira Vaga", do sociólogo Alvin Toffler, foi editado em 1980. Lançou o «slogan» da «terceira vaga» e dividiu a história humana até à data em três vagas: a primeira que correspondeu à revolução agrária, a segunda baseada na revolução industrial, e a terceira nascida desde o final da Segunda Guerra Mundial baseada no conhecimento. É a obra mais conhecida do autor e que o consagrou como futurólogo. Trinta anos depois, as suas palavras permanecem actuais.


Excerto de "A Terceira Vaga" de Alvin Toffler:




CAPÍTULO 28 - DEMOCRACIA DO SÉCULO XXI


A obsolescência de muitos dos governos de hoje não é um segredo qualquer que só eu tenha descoberto. Tão-pouco é uma doença apenas da América. O facto é que construir uma nova civilização sobre as ruínas da antiga implica a concepção de estruturas políticas novas e mais apropriadas em muitas nações ao mesmo tempo.

Segundo todas as probabilidades exigirá uma batalha demorada para renovar - ou sequer desmontar - o Congresso dos Estados Unidos, os comités centrais e os politburos dos estados comunistas industrializados, a Câmara dos Comuns e a Câmara dos Lordes, a Câmara dos Deputados francesa, o Bundestag, a Dieta, os gigantescos ministérios e as entrincheiradas administrações civis de muitas nações, as constituições e os sistemas judiciais - em resumo, grande parte do aparelho pesado e cada vez mais impraticável de governos supostamente representativos.

Esta onda de luta política tão-pouco parará ao nível nacional. Ao longo dos anos e das décadas futuras, toda uma «máquina de leis» mundial - das Nações Unidas, numa extremidade, ao concelho municipal, na outra - enfrentará eventualmente uma crescente, e finalmente irresistível, exigência de reestruturação.

Todas estas estruturas terão de ser fundamentalmente alteradas, não por serem inerentemente más, nem sequer por serem controladas por esta ou aquela classe ou por este ou aquele grupo, mas sim porque são cada vez mais inviáveis, por já não corresponderem às necessidades de um mundo radicalmente mudado.



Estas estruturas já não corresponderem às necessidades de um mundo radicalmente mudado.

Essa tarefa envolverá muitos milhões de pessoas. Se tal mudança radical encontrar resistência rígida, isso poderá desencadear derramamento de sangue. Consequentemente, a pacificidade do processo dependerá de muitos factores - da flexibilidade ou intransigência das elites existentes, da mudança ser acelerada por colapso económico, de ocorrerem ou não ameaças externas e intervenções militares. Claramente, os riscos são grandes.

No entanto, os riscos de não mudarmos as nossas instituições políticas são ainda maiores, e quanto mais depressa começarmos tanto maior será a segurança.

Para construir de novo governos viáveis - e para executar o que poderá muito bem ser a tarefa política mais importante do nosso tempo - teremos de arrancar os clichés acumulados da era da Segunda Vaga. E teremos de repensar a vida política em termos de três princípios-chave. Na verdade, eles podem muito bem vir a ser os princípios radicais dos governos de Terceira Vaga de amanhã.



I - PODER DA MINORIA

O primeiro princípio herético do governo da Terceira Vaga é o do poder da minoria. Defende que o governo da maioria, o princípio legitimador-chave da era da Segunda Vaga, está crescentemente obsoleto. Não são as maiorias, e sim as minorias, que contam. E os nossos sistemas políticos devem reflectir cada vez mais esse facto.

Exprimindo as crenças da sua geração revolucionária, foi mais uma vez Jefferson quem afirmou que os governos se devem comportar com «absoluta aquiescência das decisões da maioria». Os Estados Unidos e a Europa, ainda no alvorecer da Segunda Vaga, estavam apenas a iniciar o longo processo que eventualmente os transformaria em sociedades industriais de massas. O conceito de domínio da maioria ajustava-se perfeitamente às necessidades dessas sociedades.



Hoje, como vimos, estamos a deixar o industrialismo para trás e a tornar-nos rapidamente numa sociedade desmassificada. Em consequência disso, esta a ser cada vez mais difícil - muitas vezes até impossível - mobilizar uma maioria ou constituir sequer um governo de coligação. Foi por isso que a Itália, durante seis meses, e a Holanda, durante cinco, estiveram completamente sem governo. Nos Estados Unidos, o cientista político Walter Dean Burnham, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, diz: «Não vejo a base para nenhuma maioria positiva em coisa alguma, hoje».

Porque a sua legitimidade dependia disso, as elites da Segunda Vaga afirmaram sempre falar em nome da maioria. O governo dos Estados Unidos era «do [...] para o [...] e pelo povo». O Partido Comunista soviético falava pela «classe trabalhadora». Nixon alegava representar a «Maioria Silenciosa» da América. E nos Estados Unidos, hoje, intelectuais neoconservadores atacam as exigências de novas minorias activas coma os negros, as feministas ou os chicanos e afirmam que falam pelos interesses da grande, sólida e moderada maioria do meio da estrada.

Sediados nas grandes universidades do Nordeste e nos depósitos de pensamento de Washington, raramente pondo os pés em lugares como Marietta, no Ohio, ou Salina, no Kansas, neoconservadores académicos aparentemente consideram a «Médio-América» como uma grande massa uniforme e suja de trabalhadores da construção mais ou menos ignorantes e anti-intelectuais e empregados dos escritórios e serviços moradores nos subúrbios. No entanto, estes grupos são muito menos uniformes ou monocromáticos do que parecem, à distância, aos intelectuais e políticos. O consenso é tão difícil de encontrar na Médio-América como noutro lado - na melhor das hipóteses é tremeluzente, intermitente e limitado a muito poucos problemas. Os neoconservadores podem muito bem-estar a envolver a sua política anti-minorias no manto de uma maioria mais mítica do que real.

Na verdade, acontece o mesmo no outro extremo do espectro político. Em muitos países oeste-europeus, partidos socialistas e comunistas alegam falar pelas massas trabalhadoras. No entanto, quanto mais nos afastamos da sociedade industrial de massas, tanto menos sustentáveis são as concepções marxistas. Pois tanto massas como classes perdem muito do seu significado na emergente civilização da Terceira Vaga.



Em lugar de uma sociedade estratificada, na qual alguns blocos maiores se aliam para formar uma maioria, temos uma sociedade configurativa - uma sociedade em que milhares de minorias, muitas delas transitórias, giram e formam padrões muito novos e transitórios, que raramente congelam num consenso de 51 % acerca de problemas importantes. O avanço da civilização da Terceira Vaga enfraquece assim a própria legitimidade de muitos governos existentes.

A Terceira Vaga também desafia todas as nossas ideias convencionais acerca do relacionamento do domínio da maioria com a justiça social. Também aqui, como em muitas outras coisas, assistimos a uma assustadora reviravolta histórica. Durante a era da civilização da Segunda Vaga a luta pelo domínio da maioria foi humana e libertadora. Nos países ainda em industrialização, como a África do Sul de hoje, continua a sê-lo. Nas sociedades da Segunda Vaga o domínio da maioria significou quase sempre uma sorte mais justa para os pobres. Pois os pobres eram a maioria.

Hoje, no entanto, em países abalados pela Terceira Vaga, acontece frequentemente o oposto. Os verdadeiramente pobres já não têm necessariamente a foça dos números do seu lado. Em muitos países, eles - como toda a gente - tornaram-se uma minoria. E, a não ser que se verifique um holocausto económico, assim continuarão.

Portanto, além de já não ser adequado como princípio legitimador, o domínio da maioria deixou de ser necessariamente humanizante ou democrático em sociedades a caminho da Terceira Vaga.

Os ideólogos da Segunda Vaga lamentam rotineiramente a desintegração da sociedade de massas. Em vez de verem nesta diversidade enriquecida uma oportunidade de desenvolvimento humano, atacam-na como «fragmentação e balcanização» e atribuem-na ao «egoísmo» despertado de minorias. Esta explicação trivial substitui a causa pelo efeito. O crescente activismo das minorias não é resultado de um súbito avanço do egoísmo; É, entre outras coisas, um reflexo das necessidades de um novo sistema de produção que requer para a sua própria existência uma sociedade muito mais variada, colorida, aberta e diversa do que jamais conhecemos.

As implicações deste facto são enormes. Significa, por exemplo, que quando os Russos tentam reprimir a nova diversidade ou conter o pluralismo político que a acompanha, estão na realidade (para usar o seu próprio calão) «a acorrentar os meios de produção» - desaceleram a transformação económica e tecnológica da sociedade. E nós, no mundo não comunista, enfrentamos a mesma opção: podemos resistir ao ímpeto para a diversidade num inútil esforço de ultima trincheira para salvar as nossas instituições políticas da Segunda Vaga ou aceitamos a diversidade e mudamos, consequentemente, essas instituições.

A primeira estratégia só pode ser implementada por meios totalitários e está condenada a ter coma resultado a estagnação económica e cultural; a segunda conduz a evolução social e a uma democracia do seculo XXI baseada na minoria.

Para reconstituirmos a democracia em termos de Terceira Vaga, precisamos de abandonar a assustadora, mas falsa ideia de que o aumento de diversidade traz automaticamente um aumento de tensão e conflito a sociedade. Na realidade, pode dar-se precisamente o inverso. O conflito na sociedade não só é necessário, como é também, dentro de certos limites, desejável. Mas se cem homens desejam todos desesperadamente o mesmo anel de latão, podem ser forçados a lutar por ele. Por outro lado, se cada um dos cem homens tem um objectivo diferente, e muito mais compensador para eles negociar, cooperar e formar relações simbióticas. Dentro de condições sociais apropriadas, a diversidade pode contribuir para uma civilização estável e segura.



É a falta, hoje, das instituições políticas apropriadas que agudiza desnecessariamente o conflito entre minorias, até ao gume de faca da violência. É a falta de tais instituições que torna cada vez mais difícil encontrar a maioria.

A solução destes problemas não consiste em sufocar a discordância nem em acusar as minorias de egoísmo (como se as elites e os seus peritos não fossem similarmente egoístas). A solução reside em novos arranjos imaginativos para acomodar e legitimar a diversidade - novas instituições que sejam sensíveis às necessidades rapidamente mutáveis de minorias que mudam e se multiplicam.

O advento de uma civilização desmassificada traz à superfície profundas e perturbadoras questões acerca do futuro do domínio da maioria e de todo o sistema mecanicista de votar para exprimir preferências. Um dia, futuros historiadores podem considerar a votação e a procura de maiorias um ritual arcaico realizado por primitivos comunicacionais. Hoje, no entanto, num mundo perigoso, não nos podemos dar ao luxo de delegar o poder total em alguém, não podemos prescindir sequer da fraca influência popular que existe nos sistemas maioritários, e não podemos permitir que minúsculas minorias tomem grandes decisões que tiranizem todas as outras minorias.

É por isso que devemos rever drasticamente os grosseiros métodos da Segunda Vaga pelos quais procuramos a esquiva maioria. Precisamos de novas abordagens concebidas para uma democracia de minorias: métodos cujo propósito é mais revelar diferenças do que encobri-las com maiorias forçadas ou forjadas baseadas na votação exclusivista, no enquadramento sofístico das coisas ou em processos eleitorais fraudulentos. Precisamos, em resumo, de modernizar todo o sistema a fim de fortalecer o papel de diversas minorias e, ao mesmo tempo permitir-lhes que formem maiorias.

Para isso, no entanto, serão precisas mudanças radicais em muitas das nossas estruturas políticas - a começar pelo próprio símbolo da democracia: a urna dos votos.

Em sociedades da Segunda Vaga, votar para determinar a vontade popular proporcionou uma importante fonte de feedback às elites dominantes. Quando as condições, por qualquer razão, se tomaram intoleráveis para a maioria e 51 % dos votantes manifestaram o seu descontentamento, as elites puderam, no mínimo, mudar de partidos, modificar políticas ou fazer qualquer outra acomodação.

Até mesmo na sociedade de massas de ontem, contudo, o princípio dos 51 % era um instrumento decididamente rombo, puramente quantitativo. Votar para determinar a maioria não nos diz nada a respeito da qualidade das opiniões das pessoas. Pode dizer-nos quantas pessoas em dado momento, querem X mas não com que intensidade o querem. Sobretudo, não nos diz nada acerca do que elas estariam dispostas a trocar por X - informação crucial numa sociedade composta de muitas minorias. Tão-pouco nos assinala quando uma minoria se sente tão ameaçada, ou atribui um significado de vida ou de morte a um único problema, o que talvez justificasse que as suas opiniões tivessem mais do que o peso habitual.



Numa sociedade de massas, essas conhecidas fraquezas do domínio da maioria foram toleradas porque, entre outras coisas, faltava a muitas minorias poder estratégico para perturbar o sistema. Na sociedade apurada de hoje, em que todos nós somos membros de grupos minoritários, isso já não acontece.

Para uma sociedade desmassificada de Terceira Vaga os sistemas de feedback do passado industrial são completamente grosseiros. Assim, teremos de usar a votação e o apuramento de votos de uma maneira radicalmente nova.

Em vez de procurarmos votos simplistas de sim ou não, precisamos de identificar trocas potenciais com perguntas como: «Se eu abandonar a minha posição sobre o aborto, abandonarão a vossa sobre despesas para a defesa ou sobre a energia nuclear?». Ou: «Se eu concordar com um pequeno imposto adicional sobre os meus rendimentos pessoais para o ano, a fim de ser destinado ao vosso projecto, o que é que oferecem em troca?»

No mundo para o qual estamos a correr, com as suas ricas tecnologias de comunicação, há muitas maneiras de as pessoas darem a conhecer tais opiniões sem sequer porem os pés numa cabina de voto. E há igualmente maneiras, como veremos em breve, de transmitir essas opiniões ao processo de tomada de decisões políticas.

Também podemos querer desmantelar as nossas leis eleitorais a fim de eliminar preconceitos anti-minoritários. Há muitas maneiras de o fazer. Um método completamente convencional seria a adopção de uma variante de votação cumulativa. Como a usada hoje por muitas corporações para proteger os direitos dos accionistas minoritários. Tais métodos permitem aos votantes manifestar não somente as suas preferências, mas também a intensidade e a ordem das suas opções.

Teremos quase com certeza de abandonar as nossas obsoletas estruturas partidárias, concebidas para um mundo de mudança lenta, de movimentos de massas e de comercialização em massa, e inventar partidos modulares temporários que sirvam configurações mutáveis de minorias - partidos de ligar e desligar do futuro.

Podemos precisar de nomear «diplomatas» ou «embaixadores» cuja missão não seja mediar entre nações, mas sim entre minorias dentro de cada país. Podemos ter de criar instituições quase políticas para ajudar minorias - quer profissionais, étnicas, sexuais, regionais e recreacionais, quer religiosas - a fazer e desfazer alianças mais rápida e facilmente.




Podemos, por exemplo, precisar de fornecer recintos em que diferentes minorias, numa base rotativa e talvez até ao acaso, se reúnam para comparar problemas, negociar acordos e solucionar disputas. Se médicos, motociclistas, programadores de computadores, adventistas do sétimo dia e panteras cinzentas se reunirem, com a assistência de mediadores treinados para clarificar problemas, estabelecer prioridades e resolver disputas, poderão ser formadas alianças surpreendentes e construtivas. No mínimo, as diferenças de opinião podiam ser apresentadas e a base de troca política explorada. Tais medidas não eliminarão (nem deverão eliminar) todo o conflito. Mas podem elevar a luta social e política a um nível mais inteligente e potencialmente construtivo - especialmente se estiverem ligados ao estabelecimento de objectivos a longo prazo.

Hoje, a própria complexidade dos problemas gera inerentemente uma maior variedade de pontos negociáveis. No entanto, o sistema político não está estruturado para tirar vantagem desse facto. Alianças e trocas potenciais passam despercebidas, aumentando assim desnecessariamente as tensões entre grupos, ao mesmo tempo que sobrecarregam as instituições políticas existentes.

Finalmente, podemos muito bem precisar de dar a minorias o poder de resolver maior número dos seus próprios assuntos e encorajá-las a formular objectivos a longo prazo. Podíamos, por exemplo, ajudar as pessoas de um bairro específico, de uma subcultura bem definida ou de um grupo étnico a formar os seus próprios tribunais de jovens sobre a supervisão do estado, disciplinando assim a sua própria juventude em vez de depender do estado para o fazer. Tais instituições criariam comunidade e identidade e contribuiriam para a lei e para a ordem, ao mesmo tempo que aliviariam as instituições governamentais sobrecarregadas de trabalho desnecessário.

Podemos, no entanto, achar necessário ir muito além de tais medidas reformistas. Para fortalecer a representação da minoria num sistema político concebido para uma sociedade desmassificada, podemos até, eventualmente, ter de eleger pelo menos alguns dos nossos funcionários da maneira mais antiga de todas: à sorte. Assim, algumas pessoas sugeriram seriamente a escolha de membros da legislatura ou do parlamento do futuro do modo como hoje escolhemos membros do júri ou tropas.

Theodore Becker, professor de Direito e Ciência Política da Universidade do Havai, pergunta: «porque será que decisões importantes de vida e de morte podem ser tomadas por pessoas que prestam serviço em [...] júris, mas as decisões quanto ao dinheiro que deverá ser gasto em centros de cuidados infantis e despesas de defesa estão reservadas aos seus "representantes"?».

Acusando as condições políticas existentes de enganar sistematicamente as minorias. Becker, uma autoridade constitucional, recorda-nos que embora os não brancos constituam cerca de 20% da população americana, detinham (em 1976) apenas 4% dos lugares na Câmara dos Representantes e apenas 1 % no Senado. As mulheres, que são mais de 50% da população, detinham somente 4% dos lugares na Câmara e nenhum no Senado. Pobres, jovens, gente inteligente mas sem capacidade de expressão e muitos outros grupos encontram-se em desvantagem similar. Mas isto não é apenas verdade nos Estados Unidos. No Bundestag, apenas 7% dos lugares são ocupados por mulheres e semelhantes preconceitos são evidentes em muitos outros governos. Tão grosseiras distorções não podem deixar de embotar a sensibilidade do sistema para as necessidades de grupos sub-representados.



Palavras de Becker: «Entre 50 e 60% do Congresso americano deveriam ser escolhidos ao acaso entre o povo americano, de modo muito similar, ao que leva as pessoas para o serviço militar, por recrutamento, quando são consideradas necessárias.» Por surpreendente que a sugestão possa parecer a primeira vista, obriga-nos a considerar seriamente se representantes escolhidos ao acaso fariam (ou poderiam fazer) pior papel do que os escolhidos pelos métodos de hoje.

Se nos permitirmos imaginar livremente por um momento, podemos descobrir muitas outras alternativas surpreendentes. Na realidade, dispomos agora das técnicas necessárias para escolher amostras mais genuinamente representativas do que o sistema de júri ou de sorte, com as suas exclusões preferenciais, sempre fizeram. Podemos construir um congresso ou parlamento do futuro ainda mais inovador - e fazê-lo, paradoxalmente, com menos perturbação da tradição.

Não temos de escolher um grupo de pessoas à sorte e remetê-lo literalmente, como outros tantos Mr. Smiths, para Washington, Londres, Bona, Paris ou Moscovo. Podíamos, se quiséssemos, conservar os nossos representantes eleitos, mas permitindo-lhes apenas empregar 50 % dos votos em cada questão, deixando os outros 50 % para uma amostragem de público ao acaso.

Usando computadores, telecomunicações avançadas e métodos de votação, tornou-se simples não só seleccionar uma amostragem ao acaso do público, mas também ir actualizando essa amostragem dia a dia e fornecer-lhe informações de último minuto acerca das questões em causa. Quando uma lei fosse necessária, o complemento total dos representantes tradicionalmente eleitos, reunindo-se do modo tradicional sob a cúpula do Capitólio, ou em Westminster, ou na Bundeshaus, ou no edifício da Dieta, poderia deliberar e discutir, corrigir e estruturar a legislação.

Mas quando chegasse o momento da decisão, os representantes eleitos usariam apenas 50 % dos votos, enquanto a amostragem ao acaso corrente - que não se encontraria na capital, mas sim geograficamente dispersa nas suas próprias casas ou nos seus escritórios - utilizaria electronicamente os restantes 50%. Tal sistema proporcionaria não só um processo mais representativo do que o governo representativo jamais apresentou, mas desferiria também um tremendo golpe nos grupos de interesses especiais e nos lobbies que infestam os corredores da maioria dos parlamentos. Tais grupos teriam de passar a «lobbyzar» o povo e não apenas alguns funcionários eleitos.

Indo ainda mais longe, poderíamos imaginar votantes de um distrito eleitoral a eleger não um único individuo como seu representante., mas sim uma amostra ao acaso da população.

Essa amostra ao caso podia servir directamente no Congresso como se fosse uma pessoa - com as suas opiniões estatisticamente computadas em votos. Ou podia escolher um único individuo, à vez, para o representar, instruindo-o (a ele ou a ela] quanto à maneira de votar. Ou...



As permutações oferecidas pelas novas tecnologias de comunicações são intermináveis e extraordinárias. Se reconhecermos que as nossas instituições e constituições actuais são obsoletas e começarmos a procurar alternativas, apresenta-se-nos subitamente toda a espécie de espantosas opções políticas nunca antes possíveis. Se queremos governar sociedades que correm para o século XXI, temos pelo menos de considerar as tecnologias e os instrumentos conceptuais postos a nossa disposição pelo século XX.

O que é importante aqui não são estas sugestões específicas. Trabalhando juntos no assunto, podemos sem dúvida encontrar ideias muito melhores, mais fáceis de implementar e de concepção menos drástica. O que é importante é o caminho geral que escolhermos percorrer. Podemos travar uma batalha perdida para suprimir ou submergir as minorias que hoje desabrocham, ou podemos reconstituir os nossos sistemas políticos para acomodarem a nova diversidade. Podemos continuar a utilizar os instrumentos toscos dos sistemas políticos ou conceber novos e sensíveis instrumentos para uma democracia de amanhã baseada na minoria.

À medida que a Terceira Vaga desmassificar a velha sociedade de massas da Segunda Vaga, creio que as suas pressões ditarão essa escolha. Pois se a política foi «pré-maioritária» durante a Primeira Vaga e - «maioritária» durante a Segunda, é provável que seja «mini-maioritária» amanhã - uma fusão de governo da maioria com poder das minorias.

quinta-feira, novembro 14, 2013

Que seja declarada literalmente aberta a caça às sanguessugas financeiras e aos lacaios dessa escumalha. As greves e as manifestações que vão à fava…


Depois de ler este texto de António Lobo Antunes (que tanta gente deste país subscreverá na totalidade), como é possível que os cidadãos portugueses não comecem a organizar sessões de caça ao homem, eliminando os banqueiros ladrões (que são todos) e os lacaios que lhes estão no bolso. Isto, porque as instituições que supostamente nos deveriam defender, não estão ao serviço do país mas a soldo da Finança.


a) Membros do Governo e da Oposição (pertencentes ao arco da governação) que têm por missão entregar a riqueza do País à Banca.

b) Deputados - Parasitas, que se filiaram em partidos com o objectivo de viver à custa do país e votar a favor de interesses privados (dos quais receberão as devidas prebendas).

c) Legisladores, normalmente a trabalhar nos mais poderosos escritórios de advogados do país, que criam as leis – demasiadas e complexas para não serem percebidas, e cheias de escapatórias e alçapões para permitir que os graúdos não vão presos.

d) Patrões ou Gestores, cujas empresas prosperam com os favores do Estado.

e) Procuradores-gerais que apenas servem para branquear as grandes trafulhices e travarem qualquer tipo de investigação aos grandes ladrões.

f) Os exércitos de comentadores mediáticos, aldrabões profissionais pagos para mentir e que enxameiam os jornais e telejornais.


E nada de andar à pancada com a polícia ou o exército em manifestações, gente que é tão vítima das sanguessugas financeiras como todos os outros cidadãos portugueses. Evidentemente que, se se verificar que um determinado «agente da autoridade» mostra um prazer sádico em malhar na população, então matem-no. Com os telemóveis de hoje, com capacidades fotográficas e de vídeo, não é difícil identificá-lo e localizá-lo. Coloquem-no no Youtube. Um grupo de cidadãos caçadores, organizados Ad Hoc, tratará do assunto...


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Portugal visto por António Lobo Antunes


Agora sol na rua a fim de me melhorar a disposição, me reconciliar com a vida.

Passa uma senhora de saco de compras: não estamos assim tão mal, ainda compramos coisas, que injusto tanta queixa, tanto lamento.

Isto é internacional, meu caro, internacional e nós, estúpidos, culpamos logo os governos.

Quem nos dá este solzinho, quem é? E de graça. Eles a trabalharem para nós, a trabalharem, a trabalharem e a gente, mal agradecidos, protestamos.



Deixam de ser ministros e a sua vida um horror, suportado em estoico silêncio. Veja-se, por exemplo, o senhor Mexia, o senhor Dias Loureiro, o senhor Jorge Coelho, coitados. Não há um único que não esteja na franja da miséria. Um único. Mais aqueles rapazes generosos, que, não sendo ministros, deram o litro pelo País e só por orgulho não estendem a mão à caridade.

O senhor Rui Pedro Soares, os senhores Penedos pai e filho, que isto da bondade as vezes é hereditário, dúzias deles.

Tenham o sentido da realidade, portugueses, sejam gratos, sejam honestos, reconheçam o que eles sofreram, o que sofrem. Uns sacrificados, uns Cristos, que pecado feio, a ingratidão.

O senhor Vale e Azevedo, outro santo, bem o exprimiu em Londres. O senhor Carlos Cruz, outro santo, bem o explicou em livros. E nós, por pura maldade, teimamos em não entender. Claro que há povos ainda piores do que o nosso: os islandeses, por exemplo, que se atrevem a meter os beneméritos em tribunal. Pelo menos nesse ponto, vá lá, sobra-nos um resto de humanidade, de respeito.

Um pozinho de consideração por almas eleitas, que Deus acolherá decerto, com especial ternura, na amplidão imensa do Seu seio. Já o estou a ver: - Senta-te aqui ao meu lado ó Loureiro - Senta-te aqui ao meu lado ó Duarte Lima - Senta-te aqui ao meu lado ó Azevedo que é o mínimo que se pode fazer por esses Padres Américos, pela nossa interminável lista de bem-aventurados, banqueiros, coitadinhos, gestores que o céu lhes dê saúde e boa sorte e demais penitentes de coração puro, espíritos de eleição, seguidores escrupulosos do Evangelho. E com a bandeirinha nacional na lapela, os patriotas, e com a arraia miúda no coração. E melhoram-nos obrigando-nos a sacrifícios purificadores, aproximando-nos dos banquetes de bem-aventuranças da Eternidade.



As empresas fecham, os desempregados aumentam, os impostos crescem, penhoram casas, automóveis, o ar que respiramos e a maltosa incapaz de enxergar a capacidade purificadora destas medidas. Reformas ridículas, ordenados mínimos irrisórios, subsídios de cacaracá? Talvez. Mas passaremos sem dificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos abdicam, por amor ao próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência deste acto dá-me vontade de ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à sua frente indigno de lhes desapertar as correias dos sapatos. Vale e Azevedo para os Jerónimos, já! Loureiro para o Panteão já! Jorge Coelho para o Mosteiro de Alcobaça, já! Sócrates para a Torre de Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão feia. Para a Batalha.

Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o Herculano, as criaturas de pacotilha com que os livros de História nos enganaram. Que o Dia de Camões passe a chamar-se Dia de Armando Vara. Haja sentido das proporções, haja espírito de medida, haja respeito. Estátuas equestres para todos, veneração nacional. Esta mania tacanha de perseguir o senhor Oliveira e Costa: libertem-no. Esta pouca vergonha contra os poucos que estão presos, os quase nenhuns que estão presos como provou o senhor Vale e Azevedo, como provou o senhor Carlos Cruz, hedionda perseguição pessoal com fins inconfessáveis.

Admitam-no. E voltem a pôr o senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado, de onde o obrigaram, por maldade e inveja, a sair.

Quero o senhor Mexia no Terreiro do Paço, no lugar D. José que, aliás, era um pateta. Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no lugar do Marquês de Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos Sindicatos. Acabem com as manifestações, as greves, os protestos, por favor deixem de pecar.

Como pedia o doutor João das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E tereis mais fominha e, em consequência, mais Paraíso. Agradeçam este solzinho.

Agradeçam a Linha Branca.

Agradeçam a sopa e a peçazita de fruta do jantar.

Abaixo o Bem-Estar.



Vocês falam em crise mas as actrizes das telenovelas continuam a aumentar o peito: onde é que está a crise, então? Não gostam de olhar aquelas generosas abundâncias que uns violadores de sepulturas, com a alcunha de cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não comem carne mas podem comer lábios da grossura de bifes do lombo e transformar as caras das mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval. Para isso já há dinheiro, não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha, e vocês cartazes, cortejos, berros. Proíbam-se os lamentos injustos.

Não se vendem livros? Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e, enquanto vender, o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade, a Academia Francesa. Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os ministros e os ex-ministros a tomarem conta disto. Sinceramente, sejamos justos, a que mais se pode aspirar?

O resto são coisas insignificantes: desemprego, preços a dispararem, não haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias. Como é que ainda sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma forma que os processos importantes em tribunal a indignação há-de, fatalmente, de prescrever. E, magrinhos, magrinhos mas com peitos de litro e beijando-nos uns aos outros com os bifes das bocas seremos, como é nossa obrigação, felizes.

terça-feira, novembro 12, 2013

Mais um caso fatal de abuso existencial. Sgundo se diz, será um flagelo crescente para os têm o hábito de andar mergulhados nas águas pútridas da Finança


O Céu Não Pode Esperar


Piada original rapinada ao Quino e adaptada por mim à política nacional


Sinopse

O Presidente da República Portuguesa (Aníbal Cavaco Silva) [1939 - 2013] nunca se deu conta dos problemas que atormentavam o país. Constantemente acossado por uma cara-metade saloia, odiado pela população portuguesa e tendo de conviver com um partido que o desprezava, a dado passo, o Silva já não dizia nem pensava coisa com coisa.




Quando já todos lhe diziam para desaparecer, Cavaco convenceu-se de que ainda podia persuadir as gentes de que era "O escolhido para manter Portugal em "banho-maria". Sempre hesitante, convencido de que a "Crise" era para aguentar, «ah pois era», achou que podia piorar ainda mais a situação sem um respingo de revolta da gentalha. Até que a população se fartou e lhe esticou o pernil (recorrendo a um tronco sólido de carvalho, uma corda, um nó corredio e um cavalo assustadiço).






No meio, jaz o tipo[1964 - 2013] que, igualmente a pedido da Banca, fez o papel do «Cobrador do Fraque», e que nessa tarefa reduziu os salários, as pensões e os empregos, destruiu a segurança social, a saúde e a educação, e entregou de mão beijada aos privados os monopólios públicos lucrativos. Foi espancado, empalado e incinerado quando ainda libertava CO2 pelas narinas. Apesar dos esforços do INEM para o reacender, as cinzas do Coelho já não deram fumo nem fogo.





Mais à esquerda, no jardim onde descansa agora o Silva, jaz o sujeito [1957 - 2013] que, a pedido da Banca, pediu empréstimos a juros agiotas para fazer obras faraónicas, inúteis, pornograficamente dispendiosas e com derrapagens financeiras inexplicáveis. A maior parte destas obras foi feita a meias com empresas privadas em era estabelecido que estas ficavam com os lucros e o Estado com os prejuízos. Acabou por falecer num infeliz acidente de caça, em pleno centro de Lisboa, em que cerca de uma dúzia de balas perdidas se lhe alojaram na cabeça e no coração.

terça-feira, novembro 05, 2013

O BCE [Banco Central Europeu] explicado de forma que até uma criança percebe



O que é o BCE?

- O BCE é o banco central dos Estados da UE que pertencem à zona euro, como é o caso de Portugal.


E donde veio o dinheiro do BCE?

- O dinheiro do BCE, ou seja o capital social, é dinheiro de nós todos, cidadãos da UE, na proporção da riqueza de cada país. Assim, à Alemanha correspondeu 20% do total. Os 17 países da UE que aderiram ao euro entraram no conjunto com 70% do capital social e os restantes 10 dos 27 Estados da UE contribuíram com 30%.


E é muito, esse dinheiro?

- O capital social era 5,8 mil milhões de euros, mas no fim do ano passado foi decidido fazer o 1º aumento de capital desde que há cerca de 12 anos o BCE foi criado, em três fases. No fim de 2010, no fim de 2011 e no fim de 2012 até elevar a 10,6 mil milhões o capital do banco. Mas o BCE pode criar virtualmente o dinheiro que quiser limitando-se a digitar as quantias num teclado de computador.



Então, se o BCE é o banco destes Estados pode emprestar dinheiro a Portugal, ou não? Como qualquer banco pode emprestar dinheiro a um ou outro dos seus accionistas.

- Não, não pode.


Porquê?!

- Porquê? Porque... porque, bem... são as regras.


Então, a quem pode o BCE emprestar dinheiro?

- A outros bancos, a bancos alemães, bancos franceses ou portugueses.


Ah percebo, então Portugal, ou a Alemanha, quando precisa de dinheiro emprestado não vai ao BCE, vai aos outros bancos que por sua vez vão ao BCE.

- Pois.


Mas para quê complicar? Não era melhor Portugal ou a Grécia ou a Alemanha irem directamente ao BCE?

- Bom... sim.... quer dizer... em certo sentido... mas assim os banqueiros não ganhavam nada nesse negócio!



Agora não percebi!!..

- Sim, os bancos precisam de ganhar alguma coisinha. O BCE de Maio a Dezembro de 2010 emprestou cerca de 72 mil milhões de euros a países do euro, a chamada dívida soberana, através de um conjunto de bancos, a 1%, e esse conjunto de bancos emprestaram ao Estado português e a outros Estados a 6 ou 7%.


Mas isso assim é um "negócio da China"! Só para irem a Bruxelas buscar o dinheiro!

- Não têm sequer de se deslocar a Bruxelas. A sede do BCE é na Alemanha, em Frankfurt. Neste exemplo, ganharam com o empréstimo a Portugal uns 3 ou 4 mil milhões de euros.


Isso é um verdadeiro roubo... com esse dinheiro escusava-se até de cortar nas pensões, no subsídio de desemprego ou de nos tirarem parte do 13º mês.

As pessoas têm de perceber que os bancos têm de ganhar bem, senão como é que podiam pagar os dividendos aos accionistas e aqueles ordenados aos administradores que são gente muito especializada.


Mas quem é que manda no BCE e permite um escândalo destes?

- Mandam os governos dos países da zona euro. A Alemanha em primeiro lugar que é o país mais rico, a França, Portugal e os outros países.



Então, os Governos dão o nosso dinheiro ao BCE para eles emprestarem aos bancos a 1%, para depois estes emprestarem a 5 e a 7% aos Governos que são donos do BCE?

- Bom, não é bem assim. Como a Alemanha é rica e pode pagar bem as dívidas, os bancos levam só uns 3%. A nós ou à Grécia ou à Irlanda que estamos de corda na garganta e a quem é mais arriscado emprestar, é que levam juros a 6%, a 7 ou mais.


Então nós somos os donos do dinheiro e não podemos pedir ao nosso próprio banco!...

- Nós, qual nós?! O país, Portugal ou a Alemanha, não é só composto por gente vulgar como nós. Não se queira comparar um borra-botas qualquer que ganha 400 ou 600 euros por mês ou um calaceiro que anda para aí desempregado, com um grande accionista que recebe 5 ou 10 milhões de dividendos por ano, ou com um administrador duma grande empresa ou de um banco que ganha, com os prémios a que tem direito, uns 50, 100, ou 200 mil euros por mês. Não se pode comparar.


Mas, e os nossos Governos aceitam uma coisa dessas?

- Os nossos Governos... Por um lado, são, na maior parte, amigos dos banqueiros ou estão à espera dos seus favores, de um empregozito razoável quando lhes faltarem os votos.


Mas então eles não estão lá eleitos por nós?

- Em certo sentido, sim, é claro, mas depois.... quem tem a massa é quem manda. É o que se vê nesta actual crise mundial, a maior de há um século para cá. Essa coisa a que chamam sistema financeiro transformou o mundo da finança num casino mundial, como os casinos nunca tinham visto nem suspeitavam, e levou os EUA e a Europa à beira da ruína. É claro, essas pessoas importantes levaram o dinheiro para casa e deixaram a gente como nós, que tinha metido o dinheiro nos bancos e nos fundos, a ver navios. Os governos, então, nos EUA e na Europa, para evitar a ruína dos bancos tiveram de repor o dinheiro.


E onde o foram buscar?

- Onde havia de ser!? Aos impostos, aos ordenados, às pensões. De onde havia de vir o dinheiro do Estado?...


Mas meteram os responsáveis na cadeia?

- Na cadeia? Que disparate! Então, se eles é que fizeram a coisa, engenharias financeiras sofisticadíssimas, só eles é que sabem aplicar o remédio, só eles é que podem arrumar a casa. É claro que alguns mais comprometidos, como Raymond McDaniel, que era o presidente da Moody's, uma dessas agências de rating que classificaram a credibilidade de Portugal para pagar a dívida como lixo e atiraram com o país ao tapete, foram... passados à reforma. Como McDaniel é uma pessoa importante, levou uma indemnização de 10 milhões de dólares a que tinha direito.


E então como é? Comemos e calamos?