terça-feira, março 15, 2005

O mar dá uma identidade a Portugal

José António Saraiva, director do Expresso, na sua edição de 12-03-2005 aborda os vários problemas que Freitas do Amaral vem trazer ao Governo e ao País. Foquemo-nos, por agora, num deles. Diz Saraiva:

“O problema maior da inclusão de Freitas neste Governo não tem que ver com o passado mas com o futuro.

A política externa portuguesa assenta num tripé constituído pelas relações com a Europa, as relações com os EUA e as relações com as antigas colónias de África e o Brasil.

No meio deste tripé está o mar, que é o nosso principal recurso - a nível económico, estratégico, científico e daquilo que dá uma identidade a Portugal.

A importância de Portugal para a Europa resulta do facto de ser um país marítimo, com umas águas territoriais imensas, membro da NATO, capaz de estabelecer pontes com países de África, com o Brasil e com os Estados Unidos.

É aqui que reside a nossa importância.

Que contributo poderá dar à Europa um país que se apresenta em Bruxelas sem uma ideia clara da importância dos oceanos para a sua economia?”



Vejamos, amigo Saraiva, um pouco da história marítima Europeia:

Os Gregos exploraram o Mediterrâneo desde o século VIII a.C. Em 340 a.C. o grego Piteias viajou de Marselha à Grã-Bretanha, visitando as ilhas Órcades e Shetland; posteriormente visitou a Noruega e a Alemanha do Norte. Os Micenenses foram marinheiros hábeis e comerciantes de longas distâncias.

Roma transformou o Mediterrâneo num lago Romano. Exploraram também partes da África Ocidental e ocuparam parte da Grã-Bretanha.

As condições agrestes do Norte levaram os Viquingues a partir à procura de novas terras e recursos. Começaram por dominar os seus vizinhos bálticos, recebendo impostos em troca de âmbar, parafina, peixe, marfim e peles. Os Noruegueses e Dinamarqueses exploraram a fraqueza da França, Inglaterra e Irlanda. Usando os seus barcos longos, rápidos e manobráveis, para a realização de "raides-relâmpagos", exigiram impostos, conquistaram e colonizaram. Posteriormente, na procura de novas terras atravessaram o Atlântico e chegaram à Islândia em 860 e à Terra Nova cerca do ano 1000. Os comerciantes suecos exploraram os rios navegáveis da Rússia para dominarem o comércio lucrativo com Constantinopla e o mundo Árabe.

No século XVI, a Espanha conquistou um vasto império terrestre que englobava grande parte da América Central e do Sul, as Índias Ocidentais e as ilhas Filipinas.

Simultaneamente, os Portugueses apoderaram-se de um vasto império marítimo que se estendia do Brasil a Malaca e a Macau. Fernão de Magalhães, um navegador português ao serviço da Espanha, demonstrou que os oceanos comunicavam entre si, e criaram-se rotas marítimas no Índico, no Pacífico e no Atlântico, o que, pela primeira vez, deu origem a uma verdadeira rede comercial mundial.

Embora os Portugueses negociassem com o império Ming e com o Japão, os contactos culturais entre os Europeus e a Ásia Oriental eram restritos. Na África, a repercussão europeia também pouco se estendeu para além da costa.

Durante o século XVII os marinheiros holandeses, britânicos e franceses seguiram os ibéricos pelos mares do mundo. Todas as três nações estabeleceram colónias na América do Norte, e todas entraram nas redes comerciais do oceano Índico. Os marinheiros britânicos e franceses procuravam passagens a nordeste e a noroeste da Europa para Ásia e, embora sem sucesso, os seus esforços expandiram o conhecimento da geografia mundial.

As incursões holandesas pelas Índias Orientais começaram a desgastar o domínio do império português nesta região. O comércio entre a Europa, a África, a América do Norte e a América do Sul levou à integração económica da bacia do oceano Atlântico, enquanto o comércio europeu no oceano Índico ligou os mercados europeu e asiático.

Na primeira metade do século XX assistiu-se ao reforço extraordinário da marinha alemã. Os célebres U-boat – submarinos de guerra alemães dominaram o Atlântico. A “Batalha do Atlântico” que opôs alemães a ingleses e americanos na II Grande Guerra foi disso um exemplo.

Nos últimos cinquenta anos, Americanos e Russos dominaram os sete mares com porta-aviões, cruzadores, navios mercantes e submarinos atómicos.


E agora, prezado Saraiva, um pouco de geografia:

Vejamos a relação entre o comprimento de costa e o perímetro total de diversos países europeus:

Portugal - 0,48
Espanha - 0,63
França - 0,62
Itália - 0,78
Inglaterra - 1,00
Holanda - 0,62
Alemanha - 0,30
Grécia - 0,77
Dinamarca - 0.96
Suécia - 0,48
Noruega - 0,58

Dos países acima referidos todos têm uma relação [comprimento de costa – perímetro total] superior à portuguesa (com excepção da Alemanha). Em termos de comprimento absoluto de costa acontece o mesmo (com excepção da Holanda)


Donde se inferem, meu caro Saraiva, algumas conclusões:

Portugal é um país marítimo? Que dizer, então, da Noruega, Suécia, Dinamarca, Alemanha, Holanda, Inglaterra, Irlanda, França, Espanha, Itália e Grécia?

Você afirma: “que contributo poderá dar à Europa um país que se apresenta em Bruxelas sem uma ideia clara da importância dos oceanos para a sua economia?”

Eu penso que Freitas do Amaral é capaz de ter uma ideia clara da importância dos oceanos. Parece-me que quem não a tem é você.

Portugal teve a sua importância há 500 anos, Saraiva. É muito tempo. Desde então, muita água banhou as costas europeias.

A importância do Atlântico para Portugal está hoje reduzida à pesca da sardinha, ao banho de mar e ao bodyboard. E a nada mais, estimado Saraiva!

2 comentários:

  1. Estimado escritor

    Folgo em perceber que há pessoas a ler livros de história e geografia. É pena que não consiga tirar daí as devidas conclusões.
    Talvez nos queira elucidar sobre as verdadeiras mais valias que a realidade geoestratégica de Portugal apresenta. Serão os extensos campos agrículas? Será o consagrado conhecimento em tecnologias de ponta, baseado em anos de experiência na área? Ou talvez a espantosa capacidade/vontade de trabalho/produção do povo português, que aliás é reconhecida internacionalmente?

    P.S.-A alusão ao passado marítimo português não servirá para reflectir sobre aquilo que o país já foi, mas sim para ponderar sobre aquilo a que o país poderá almejar.

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