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sexta-feira, outubro 24, 2008

Boaventura de Sousa Santos - a mentira mediática

Boaventura de Sousa Santos é doutor em sociologia do direito pela Universidade de Yale e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.

A Cultura do Ludíbrio

Publicado na Visão em 5 de Junho de 2008

O ex-secretário de imprensa do Presidente Bush, Scott McClellan, acaba de publicar um livro intitulado "O que Aconteceu: Dentro da Casa Branca de Bush e a Cultura do Ludíbrio em Washington". O furor político e mediático que causou decorre de duas revelações: quando ordenou a invasão do Iraque, a Administração Bush sabia que o Iraque não tinha armas de destruição maciça (ADM) e montou uma poderosa "campanha de propaganda" para levar a opinião pública norte-americana e mundial a aceitar uma "guerra desnecessária"; os grandes meios de comunicação foram "cúmplices activos" dessa campanha, não só porque não questionaram as fontes governamentais como porque incendiaram o fervor patriótico e censuraram as posições cépticas contrárias à guerra.

Estas revelações e as reacções que causaram têm implicações que as transcendem. Antes de tudo, é surpreendente todo este escândalo, pois as revelações não trazem nada de novo. As informações em que assentam eram conhecidas na altura da invasão a partir de fontes independentes. Nelas me baseei para justificar nesta coluna a minha total oposição à guerra que, além de "desnecessária", era injusta e ilegal. Isto significa que as vozes independentes foram estigmatizadas como sendo ideológicas e anti-patrióticas, tal como hoje criticar Israel equivale a ser considerado anti-semita. Em 2001, no Egipto, e antes da máquina de propaganda ter começado a devorar a verdade, o próprio Secretário de Estado Colin Powell dissera que não havia nenhuma informação sólida de que o Iraque tivesse ADM.

Isto me conduz à segunda implicação destas revelações: o futuro do jornalismo. A máquina de propaganda do Departamento de Defesa assentou em três tácticas: impor a presença de generais na reserva em todos os noticiários televisivos com o objectivo de demonstrar a existência das ADMs; ter todos os média sob observação e telefonar aos seus directores ou proprietários ao mínimo sinal de cepticismo ou oposição à guerra; convidar jornalistas de confiança de todo o mundo (também de Portugal) para serem convencidos da existência das ADMs e regressarem aos seus países possuídos da mesma convicção belicista. Vimos isso trágica e grotescamente no nosso país. A verdade é que em Washington e em todo o país circulavam nos média independentes informações que contradiziam o "brainwashing", muitas delas provindas de generais e de antigos altos funcionários da Casa Branca. Porque não ocorreu a esses jornalistas amigos fazer uma verificação cruzada das fontes como lhes exigia o código deontológico?

Para o bem do jornalismo, alguns deles procuraram resistir à pressão e sofreram as consequências. Jessica Yellin, hoje na CNN, e na altura no canal ABC, confessou publicamente que os directores e donos do canal a pressionaram para escrever histórias a favor da guerra e censuraram todas as que eram mais críticas. Um produtor foi despedido por propor um programa com metade de posições a favor da guerra e metade de posições contra. Quem resistiu foi considerado anti-patriótico e amigo dos terroristas. Isto mesmo aconteceu no nosso país. Quantos jornalistas não foram sujeitos à mesma intimidação? Quantos artigos de opinião contrários à guerra foram rejeitados? E os que escreveram propaganda e intimidaram subordinados alguma vez se retrataram, pediram desculpa, foram demitidos? É que eles colaboraram para que um milhão de iraquianos fossem mortos, dezenas de milhares de soldados norte-americanos fossem feridos e mortos e um país fosse totalmente destruído. Tudo isto terá sido preço, não da democracia – ridículo conceber como democrático este estado colonial e mais fracturado que a Somália – mas sim do controle das reservas do petróleo do Golfo e da promoção dos interesses do petróleo, da indústria militar e de reconstrução em que os donos dos média têm fortes investimentos.

Para disfarçar o problema moral dos cúmplices da guerra e da destruição, um comentador de direita do nosso país socorreu-se recentemente da mais desconcertante e desesperada justificação da guerra: se não havia ADMs, havia pelo menos a convicção de que elas existiam. Ora o livro de McClellan acaba de lhe retirar este argumento. De qual se socorrerá agora? O trágico é que a "máquina" de propaganda continua montada e está agora dirigida ao Irão. O seu funcionamento será mais difícil e sê-lo-á tanto mais quanto melhores condições tiverem os jornalistas para cumprir o seu código deontológico.

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Ora, o visado comentador de direita, José Manuel Fernandes, há muito que esclareceu o assunto:

No Público - 2 de Fevereiro de 2004

Enganos não são mentiras

«(...) O que estava em causa era grave. Tratava-se de saber se Blair tinha ou não mentido aos ingleses e ao Mundo sobre a existência de armas de destruição maciça no Iraque. Se [Blair] tinha ou não manipulado relatórios dos serviços secretos. Se tinha agido de acordo com as suas convicções e com os documentos que conhecia ou se tinha, pelo contrário, enganado deliberadamente o povo britânico.»

«(...) Na intervenção que ontem fez perante a Câmara dos Comuns Tony Blair tocou, do meu ponto de vista, na questão central: "é absolutamente correcto que se conteste a correcção das informações dos serviços de espionagem e que nos interroguemos porque é que ainda não encontrámos armas de destruição maciça. É também absolutamente legítimo discutir os motivos que nos levaram a desencadear este conflito. Eu continuo a acreditar hoje, tal como acreditava em Março, que remover Saddam do poder torna o mundo um lugar melhor e mais seguro - mas sei que outros têm todo o direito de discordar. Contudo isto é completamente diferente de uma acusação de manipulação, ou de duplicidade, de uma acusação de que alguém falsificou deliberadamente as informações dos serviços secretos".»

«(...) Estavam todos enganados. Enganados - não manipulados. Todos - e não apenas as administrações americana e britânica. Todos - e não apenas o Presidente Bush (...)»

«(...) Como hoje recordamos, a convicção de que o Iraque possuía armas de destruição maciça não era objecto de discussão há um ano, nos meses e semanas que antecederam a guerra: o que se discutia era se a forma mais eficaz de lidar com o problema era prolongar o mandato e as missões dos inspectores das Nações Unidas ou se se devia intervir (...)»

«(...) Daí que, tal como Tony Blair, continue a considerar que a questão é saber se o Mundo é hoje um lugar pior ou melhor sem Saddam Hussein. Acredito que é melhor (...)»



Comentário:

Não obstante, as centenas de Zés Manéis que colaboraram para que um milhão de iraquianos fossem mortos e um país fosse totalmente destruído, continuam directores de jornais, colunistas de opinião e analistas omnipresentes de todos os programas de debate dos canais televisisvos.

A título de exemplo, alguns dos mais afamados Zés Manéis que escrevinham no Expresso:

terça-feira, julho 10, 2007

José Manuel Fernandes - As inquietações de Sócrates e Barroso com a «independência» do Banco Central Europeu

Segundo José Manuel Fernandes, director do Público, o presidente francês Nicolas Sarkozy tem apresentado propostas que deveriam inquietar José Sócrates e Durão Barroso. A principal, segundo Fernandes, é o ataque à independência do Banco Central Europeu:

Jornal Público – 10 de Julho de 2007

«A primeira [proposta], formalmente descartada pela maioria dos Governos, mas apoiada à boca pequena por alguns dos líderes europeus (incluindo José Sócrates), é a do estatuto de independência do Banco Central Europeu.»

«Neste domínio devemos distinguir dois aspectos: uma coisa é querer discutir as suas prioridades consagradas nos estatutos, outra é querer submetê-lo às orientações de um quimérico "governo económico europeu"

«É possível discutir os estatutos: os do BCE apenas consagram o seu dever de controlar a inflação, mas não é impossível que também incluam como prioridade o crescimento económico, formando o binómio que orienta a Reserva Federal dos Estados Unidos.»

«Mas já não é possível querer que os banqueiros manipulem as taxas de juro ou mesmo as de câmbio em função de directrizes políticas, muitas vezes conjunturais e politiqueiras até ao limite do razoável.»


Comentário:

Estando a inflação controlada abaixo dos 2% e com tendência a diminuir, e com os analistas económicos a afirmar que é difícil entender os motivos que levam o Banco Central Europeu a continuar a subir os juros, é compreensível a preocupação de José Manuel Fernandes com a manipulação das taxas de juro por parte dos banqueiros em função de directrizes políticas.

O conceituado editorialista do Público defende uma manipulação das taxas de juro em função de objectivos mais nobres:

O lucro do Millennium BCP atingiu 191 milhões de euros no primeiro trimestre do ano. Os resultados em base recorrente cresceram 16% nos primeiros três meses do ano.

O Banco Espírito Santo divulgou quinta-feira um lucro de 139,8 milhões de euros no primeiro trimestre, mais 33% que no período homólogo...

O BPI obteve um resultado líquido de 96,8 milhões de euros no primeiro trimestre do ano, um valor que corresponde a uma subida de 30 por cento face a igual período do ano anterior.

O resultado do Banco Bilbao Viscaya y Argentaria (BBVA) subiu para pouco mais de 1,25 mil milhões de euros, mais 23% no resultado líquido no primeiro trimestre de 2007.

O Banco Santander Central Hispano obteve um resultado líquido de 1,8 mil milhões de euros, no primeiro trimestre do ano. Este valor representa mais 21% que no período homólogo...


As sanguessugas partilham das preocupações de Sócrates e Barroso no tocante à «independência» do Banco Central Europeu