sexta-feira, maio 29, 2009

Jon Stewart – O Papa Bento XVI utilizou a palavra "mortos" e não "assassinados" ao referir-se às vítimas do Holocausto



Jon Stewart: Nunca se cansam de carregar o mundo às costas? Fechados na vossa cidade-estado soberano, sempre o mesmo, Sua Santidade isto, Sua Santidade aquilo... Devíamos pôr o Cálice de Viagem na mala, e fazer-nos à estrada.

Esta semana, Sua Santidade o Papa Bento XVI fez a sua primeira visita à Terra Santa, uma passeata de cinco dias com uma agenda modesta.

Jornalista: O que espera ele conseguir?

Um Padre: Paz no Médio Oriente. Paz entre cristãos e judeus, paz entre judeus e muçulmanos. Segundo, relações entre cristãos e judeus. Terceiro, entre cristãos e muçulmanos...

Jon Stewart: Ena, o que será que ele vai fazer no segundo encontro? Meu, ele só vai estar aí cinco dias. Vai com calma. A Kate Hudson demorou o dobro do tempo a perder um só tipo.

Que comece a cura. O Papa aterrou em Israel e foi acolhido de trompetes abertos. Israel presenteou Sua Santidade com um belo prato de iguarias, bem como um ramo de trigo geneticamente modificado, baptizado com o nome do Santo Padre, ao que ele respondeu: "Isto é muito agradável. Sabem que a minha casa é feita de ouro, certo? Mas pronto, fruta e trigo... obrigadinho. O meu decorador foi o Miguel Ângelo. Obrigado pelo trigo."

Houve outras paragens cerimoniais. O Papa depositou uma coroa de flores no Yad Vashem e reacendeu a chama eterna para relembrar o Holocausto. A viagem ao Yad Vashem foi complicada para este Papa. Recentemente, removeu a excomunhão de um bispo que nega o Holocausto. E, claro, na sua juventude fez parte de um grupo algo controverso chamado… Juventude Hitleriana. Estou certo que o fez para melhorar o currículo para a faculdade. Bento XVI tentou acalmar a ansiedade dos judeus devido ao Holocausto com o seu discurso:

Papa Bento XVI: Vim ficar em silêncio perante o monumento erigido para honrar os milhões de judeus mortos na terrível tragédia do Shoah.

Jon Stewart: Os milhões de judeus mortos no Shoah. Muito bem, até utilizou a palavra hebraica para Holocausto - Shoah, foi atencioso, estou certo de que os habitantes não podem arranjar uma razão de queixa.

Rabino: Ele não utilizou a palavra "assassinados", mas sim "mortos".

Jon Stewart: Então agora estão a acusar o santo Padre de ser anti-semântico? De qualquer modo, o Pontífice reuniu-se com clérigos muçulmanos, que também lhe deram um presente... Talvez o momento mais significativo para o Papa tenha sido a reunião com o líder palestiniano Mahmoud Abbas, onde afirmou ser a favor de um Estado palestiniano independente e, depois, ofereceu a sua solução para o conflito, que afecta esta região há dois mil anos.

Papa Bento XVI: Faço este apelo aos muito jovens que vivem hoje nos territórios palestinianos. Não permitam que a perda de vidas e a destruição que testemunharam faça nascer a amargura e o ressentimento nos vossos corações.

Jon Stewart: Acabou de dizer às pessoas para não guardarem rancor? Porque vocês são a Igreja católica. Pediram desculpa ao Galileu apenas há uns dez anos atrás. Eles perderam um país em 1948, ainda falta muito para lhes passar o rancor.

And goes on and on


Vídeo legendado em português:


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quarta-feira, maio 27, 2009

Auschwitz-Birkenau - História de um Inferno feito pelo homem


Artigo de Scrapbookpages

[Tradução minha]


A 14 de Maio de 1946, o ex-comandante de Auschwitz-Birkenau, Rudolf Höss, assinou um depoimento ajuramentado no qual afirmou que dois milhões de judeus tinham sido gaseados em Auschwitz-Birkenau entre 1941 e 1943 enquanto foi o comandante do campo. Isto não inclui o período, durante o qual Höss não foi comandante, quando mais de 300,000 judeus húngaros foram gaseados num período de 10 semanas no Verão de 1944, segundo o Museu de Auschwitz.

A tradução do texto do depoimento de Höss diz: "Declaro aqui sob juramento que nos anos de 1941 a 1943 durante o exercício do meu cargo como comandante do Campo de Concentração de Auschwitz, 2 milhões de judeus foram mortos por gaseamento e meio milhão por outros meios. Rudolf Höss, 14 de Maio de 1946." A confissão estava assinada por Höss e por Josef Mayer do Gabinete do Promotor Público Chefe dos Estados Unidos.

Depoimento ajuramentado pelo comandante Rudolf Höss a 14 de Maio de 1946:

Foto do Museu Memorial do Holocausto dos Estado Unidos

A confissão original, assinada por Rudolf Höss, está exposta numa caixa de vidro no Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos em Washington. A fotografia exposta, bem como o depoimento, mostra mulheres e crianças judias húngaras a caminho de uma das quatro câmaras de gás do campo da morte de Birkenau a 26 de Maio de 1944, carregando as suas malas e sacos.

Judeus a caminho das câmaras de gás de Birkenau

Foto do Museu Memorial do Holocausto dos Estado Unidos

A legenda sob a fotografia diz:

«A 14 de Maio de 1946, Rudolf Höss, o ex-comandante de Auschwitz, assinou uma declaração afirmando que durante o exercício do cargo, 2 milhões de judeus foram gaseados em Auschwitz e outros quinhentos mil foram mortos de outras formas. Höss sobrestimou o número de judeus gaseados em cerca de 1 milhão

Houve allegações de que esta confissão foi obtida de Rudolf Höss por meio de tortura. Rupert Butler escreveu no seu livro intitulado "Legions of Death" [Legiões da Morte], publicado pela Arrow Books de Londres em 1983, que Höss foi espancado durante três dias por uma equipa de torturadores britânicos sob o comando do interrogador judeu Bernard Clarke.

Monumento Internacional de Birkenau, Outubro de 2005

Em Abril de 1967, um Monumento Internacional, dedicado às vítimas do Fascismo, foi erigido em Birkenau, entre as ruínas do Krema II e do Krema III, os dois edifícios crematórios onde as duas maiores câmaras de gás estavam localizadas. O monumento incluía uma série de placas de granito que informavam os visitantes que 4 milhões de pessoas tinham sido assassinadas pelos nazis em Auschwitz-Birkenau. Este número era uma estimativa feita pela União Soviética a 8 de Maio de 1945, baseada na capacidade máxima dos fornos crematórios do Campo Principal e de Birkenau.

Quatro milhões foi o número de mortos em Auschwitz-Birkenau que a União Soviética incluiu nas acusações de crimes de guerra contra os nazis no Tribunal Internacional Militar de Nuremberga em Novembro de 1945. A União Soviética também acusou os nazis de terem morto um milhão e meio de pessoas no campo da morte de Majdanek. Hoje, o museu de Majdanek alega que 78 mil prisioneiros, incluindo 59 mil judeus, morreram em Majdanek.

A Placa original afirmava que 4 milhões morreram em Auschwitz-Birkenau, de 1940 a 1945

Segundo o Museu de Auschwitz, depois da queda do comunismo em 1989, a União Soviética entregou ao Comité Internacional da Cruz Vermelha 46 volumes de livros onde era registada a mortalidade (Sterbebücher) que tinham confiscado do campo de Auschwitz. Estes registos, que foram mantidos pelo departamento político (Gestapo) em Auschwitz, mostram que houve cerca de 69 mil prisioneiros registados que morreram de 29 de Julho de 1941 a 31 de Dezembro de 1943. Os livros onde era registada a mortalidade de 14 de Junho de 1940 a 28 de Julho de 1941 foram perdidos, assim como os de todo o ano de 1944 e Janeiro de 1945. Baseados nestes registos, a Cruz Vermelha Internacional estimou que um total de 135 mil prisioneiros registados morreu nos três campos de Auschwitz. Estes números incluem judeus e não judeus.

O documento na fotografia abaixo, que mostra registos dos campos de concentração nazis, estão armazenados em Arolsen, na Alemanha:

Documento da Cruz Vermelha

Ampliação do Documento da Cruz Vermelha

Em 1990, as placas com o número de 4 milhões foram removidas. Foi só em 1995 que novas placas foram colocadas no Monumento Internacional com 20 placas de metal gravadas em ídiche, inglês e em todas as línguas principais da Europa; as placas foram feitas em granito nas escadas do Monumento Internacional. O número de mortos em Auschwitz, segundo cada uma das 20 placas, é de um milhão e meio.

Tal como se mostra na fotografia abaixo, na inscrição em inglês pode ler-se:

«Que este local seja para sempre um grito de desespero e um aviso à humanidade, onde os nazis assassinaram cerca de um milhão e meio de homens, mulheres e crianças, sobretudo judeus de vários países da Europa. Auschwitz-Birkenau 1940-1945.»

Placa em inglês no Monumento Internacional, Outubro de 2005

Em 1980, Franciszek Piper, o director do Museu de Auschwitz, começou a fazer um estudo de todos os documentos disponíveis sobre Auschwitz, tendo calculado que 1,077,180 prisioneiros, dos quais 90% eram judeus, morreram em Auschwitz, baseado numa estimativa do número de prisioneiros que chegaram ao campo subtraindo o número de prisioneiros que foram libertados, os que foram transferidos e os que fugiram. Este número inclui os judeus, não registados no campo, que se assume terem sido imediatamente gaseados após a sua chegada ao campo.

Em 1946, Rudof Höss foi julgado na Polónia; foi acusado da morte de "cerca de 300 mil pessoas que estavam no campo como prisioneiros e que faziam parte dos registos do campo e cerca de 4 milhões de pessoas, principalmente judeus, que foram trazidos para o campo de outros países europeus para extermínio imediato e que não faziam parte dos registos do campo." Durante os seu julgamento, Höss alterou o número da sua confissão para um total de 1.130.000 judeus que foram gaseados mas declarou: "Durante o tempo em que fui comandante em Auschwitz, milhões de pessoas morreram, um número que não posso determinar com exactidão."

Rudolf Höss escreveu na sua autobiografia que o Tenente-Coronel Adolf Eichmann e o seu adjunto eram os únicos que conheciam o número total de judeus que foram gaseados em Auschwitz-Birkenau, porque o Marechal-de-Campo Heinrich Himmler tinha ordenado que todos os registos fossem queimados após todas as operações especiais (gaseamentos). Os nazis usaram sempre palavras de código quando falavam do genocídio dos judeus: um gaseamento em massa era chamado uma "acção especial."

Nos últimos dias da Segunda Guerra Mundial, pouco antes de Berlim ter sido cercada pelas tropas soviéticas, Eichmann contou a Höss que dois milhões e meio de judeus tinham sido assassinados em Auschwitz-Birkenau. Eichmann era um Tenente-Coronel das SS chefe do Departamento IV, B-4, a do Gabinete de Segurança Central do Reich (RSHA) em Berlim, que era responsável pela deportação dos judeus. Era Adolf Eichmann que estava encarregue da deportação dos judeus nos comboios para os campos da morte.

Segundo o Museu de Auschwitz, nunca foram encontrados registos do número de prisioneiros que morreram em Auschwitz-Birkenau. Num artigo no site oficial de Auschwitz, Franciszek Piper escreveu o seguinte:

"Quando o exército soviético entrou no campo em Janeiro de 1945, não encontraram lá nenhuns documentos alemães com o número de vítimas, ou nada que pudesse ser usado para o cálculo desse número. Tais documentos (listas de transporte, registos de chegada dos transportes, relatórios sobre o resultado das selecções) foram destruídos antes da libertação. Por esta razão, a comissão soviética que investigava os crimes cometidos no campo de concentração de Auschwitz tinha de proceder a estimativas.

[...]

A ausência da parte mais importante das fontes estatísticas que os alemães guardavam em Auschwitz tornava praticamente impossível aos historiadores investigar a questão do número de vítimas. A relutância em investigar esta questão também resultou da convicção da impossibilidade de formular uma lista completa dos transportes reflectindo o número total de deportados, e, acima de tudo, das pessoas que foram mortas nas câmaras de gás e nos crematórios sem registo.
"


No seu livro intitulado "IBM and the Holocaust" [A IBM e o Holocausto], Edwin Black escreveu que os nazis tinham um registo dos prisioneiros usando máquinas Hollerith da IBM que classificavam cartões perfurados onde estava codificada a informação sobre cada prisioneiro. Os números das tatuagens que eram feitas nos braços dos prisioneiros de Auschwitz, que começou em 1943, eram originalmente o número de código de prisioneiro no seu cartão Hollerith.

O seguinte parágrafo é uma citação do livro "A IBM e o Holocausto" de Edwin Black:

"Não eram apenas pessoas que eram contadas e organizadas para a deportação. Vagões, locomotivas e complexos horários de comboios eram programados através de fronteiras marcadas pela guerra – enquanto uma guerra era travada em duas frentes. A tecnologia permitiu à Alemanha nazi organizar a morte de milhões sem omitir um pormenor."

Segundo Edwin Black, os prisioneiros não eram registados num cartão perfurado da IBM enquanto não fossem registados num campo, portanto não existem registos das pessoas que chegaram a Auschwitz e não foram registadas no campo. Dos milhões de cartões perfurados usados pelos nazis, apenas cerca de 100 mil sobreviveram à Guerra, segundo Edwin Black.


O número normalmente aceite de mil e trezentos milhões de pessoas que foram deportadas para Auschwitz não é baseado em registos de transportes de comboios guardados pelos alemães, mas antes por uma estimativa realizada por Fraciszek Piper, que escreveu o seguinte no seu artigo no website oficial de Auschwitz:

"Depois de uma análise completa das fontes originais e do que foi encontrado sobre as deportações para Auschwitz, concluí que um total de pelo menos de um milhão e trezentas mil pessoas que foram deportadas para lá, e que um milhão e cem mil morreram. Aproximadamente 200 mil pessoas foram deportadas de Auschwitz para outros campos como parte de uma redistribuição de força de trabalho e a liquidação final do campo.

Um dos mais distintos investigadores do Holocausto, Raul Hillberg, publicou um trabalho (Auschwitz and the Final Solution) [Auschwitz e a Solução Final] sobre o número de vítimas de Auschwitz. As suas conclusões reafirmam tanto o número de um milhão de vítimas judias em Auschwitz a que ele chegou já em 1961, como as minhas próprias conclusões
."



Os cartões perfurados Hollerith da IBM mantidos pelos alemães sobre os judeus, russos e ciganos, que foram registados no campo e mortos mais tarde nas câmaras de gás, eram codificados como F-6 para "tratamento especial" ou "evacuações" segundo Edwin Black, o autor de "A IBM e o Holocausto." O código para "execução" era D-4.

Em 2002, Edwin Black escreveu o seguinte num artigo sobre os cartões perfurados Hollerith da IBM em Cracóvia que foram usados pelos nazis para manter um registo dos prisioneiros de Auschwitz:

"Quase de certeza que as máquinas não guardavam os totais de extermínio, que eram calculados como "evacuações" pelo Grupo Hollerith em Cracóvia."


Richard Seaver escreveu no prefácio do livro "Auschwitz, a Doctor's Eyewitness Account" [Auschwitz, a descrição do testemunho de um médico], do Dr. Miklos Nviszli que "em 1944 as autoridades alemãs destruíram as listas de transporte de todos os judeus que foram enviados para Auschwitz até essa altura, e nos meses seguintes ordenaram a destruição de todos os outros documentos incriminatórios."

Os registos completos, compilados pelo gabinete de Richard Glüks de todos os campos de concentração nazis dos anos 1935 até 1944, estão agora guardados em microfilme nos Arquivos Centrais Russos nos Arquivos Centrais do Estado nº 18760 nas listas de nomes 281 até 286. Estes registos dão-nos dados sobre o número de mortes em Auschwitz por execução, tifo e outras causas naturais, mas não sobre os judeus que foram gaseados.

Segundo a Wikipedia, Richard Glüks chegou ao lugar de Chefe de Grupo e ao de General das Waffen-SS e foi, desde 1939 até ao fim da Segunda Guerra, o posto mais elevado de "Inspector dos Campos de Concentração" na Alemanha nazi. Próximo de Himmler, Glüks era directamente responsável pelo trabalho forçado dos prisioneiros; era também o supervisor das práticas médicas nos campos, desde as experiências em seres humanos até à implementação do Endlösung [A Solução Final], em particular o assassínio em massa de prisioneiros por gaseamento com Zyklon-B.

Endlösung é o termo alemão para "A Solução Final", que significa o genocídio dos judeus. Himmler e Glüks escaparam ambos à justiça cometendo suicídio imediatamente a seguir a terem sido capturados pelos Aliados em Maio de 1945, antes de poderem ser interrogados.

De acordo com os registos guardados pelo Gabinete de Richard Glüks, houve um total de 121.453 prisioneiros, incluindo 100.743 judeus que foram transferidos de Auschwitz-Birkenau para outros campos. Os mesmos registos mostram que houve um total de 334.785 prisioneiros que chegaram a Auschwitz-Birkenau entre Maio de 1940 e Dezembro de 1944, incluindo 161,785 não judeus.

Os registos guardados pelo Gabinete de Richard Glüks mostram que 103.429 prisioneiros de Auschwitz-Birkenau morreram de tifo, incluindo 58.240 judeus que morreram de tifo entre 1942 e 1944. Há ainda 4.140 prisioneiros que morreram de outras causas naturais entre 1940 e 1944, incluindo 2.064 judeus.

O número de pessoas executadas em Auschwitz, segundo os registos guardados em microfilme nos arquivos Russos, foi de 1.646 incluindo 117 judeus, 1.485 polacos, 19 russos, 5 checos e 20 ciganos.

Os registos alemães guardados pelo Gabinete de Richard Glüks mostram que 173.000 judeus foram trazidos para Auschwitz-Birkenau e que 100.743 foram transferidos de para outros campos; 58.240 judeus que morreram de tifo; 2.064 judeus morreram de causas naturais e 117 judeus foram executados, chegando-se ao número total de judeus que morreram em Auschwitz-Birkenau de 60.421. Nos fins de Outubro de 1944, existiam 11.836 judeus em Auschwitz-Birkenau, um poucos mais do que os que chegaram ao campo em Novembro e Dezembro de 1944, segundo os registos do Gabinete de Richard Glüks.

Os registos alemães mostram que 161.785 não judeus foram trazidos para Auschwitz-Birkenau desde Maio de 1940 até Dezembro de 1944 e que 45.189 deles morreram de tifo; 1.529 prisioneiros não judeus em Auschwitz-Birkenau foram executados; 2.076 não judeus morreram de causas naturais, sem ser de tifo. Isto perfaz um total de 48.794 não judeus que morreram em Auschwitz-Birkenau a somar aos 60.421 judeus que morreram, o que totaliza 109.215 pessoas. Este número não inclui as mortes em Janeiro de 1945 antes de Auschwitz ser libertado a 27 de Janeiro de 1945.

Segundo informação dada no Museu de Auschwitz, 405.222 prisioneiros foram registados em Auschwitz-Birkenau; os judeus que foram imediatamente enviados para a câmara de gás não eram registados e não foram guardados quaisquer registos deles.

Dos 405.222 prisioneiros que foram registados em Auschwitz e Birkenau, cerca de 340.00 morreram lá, de acordo com o livro guia do Museu de 2005. Este número inclui os prisioneiros que foram registados e mais tarde seleccionados para gaseamento porque já não eram capazes de trabalhar, mas não leva em conta os prisioneiros, que foram registados e depois transferidos para outros campos de concentração, tais como Neuengamme ou Gusen. Subtraindo o número de prisioneiros ainda presentes no campo no dia antes deste ser abandonado, o número de prisioneiros enviados para outros campos de concentração, e o número dos fugitivos do número de prisioneiros que foram registados, o que sobra é um número muito aproximado ao de 135.000 mortos que foi estimado pela Cruz Vermelha. Segundo Franciszek piper, o director do Museu de Auschwitz, aproximadamente 500 prisioneiros fugiram de Auschwitz.

A Enciclopédia do Holocausto calcula o número total de judeus húngaros que morreram em Auschwitz-Birkenau entre Maio e Junho de 1944 em aproximadamente 550.000, a maior parte dos quais gaseados, mas Lucy Dawidowicz escreveu no seu livro intitulado "The War Against the Jews" [A Guerra Contra os Judeus], publicado em 1975, que 450.000 judeus húngaros foram trazidos para Auschwitz entre Maio e Outubro de 1944. Raul Hilberg afirmou no seu livro intitulado "The Destruction of the European Jews" [A Destruição dos Judeus Europeus], que o número de judeus húngaros trazidos para Auschwitz foi de 180.000.

Segundo Francispek Piper, a maioria dos judeus húngaros, que foram enviados para Auschwitz-Birkenau, foram imediatamente gaseados. Um folheto vendido no Museu de Auschwitz afirma que 434.351 dos judeus húngaros, dos 437.402 que foram enviados para Auschwitz, foram registados no campo. Contudo, Francispek Piper escreveu que 28.000 judeus húngaros foram registados em Auschwitz-Birkenau. Os registos do Gabinete de Richard Glüks mostram que apenas 23.117 judeus húngaros foram trazidos para Auschwitz-Birkenau e 21.527 judeus húngaros foram transferidos para outros campos.

A 12 de Julho de 1944, existiam 92.705 prisioneiros em todo o complexo do campo, segundo a lista de chamada desse dia. No Campo Principal, havia 14.386 homens. Em Birkenau, havia 19.711 homens e 31.406 mulheres. Havia também 26.705 homens em Auschwitz III. Este total não inclui os judeus húngaros que não foram registados, segundo Danuta Czech. Eles estavam retidos na secção B III de Birkenau, chamada México, enquanto esperavam para serem gaseados ou enviados para ouro campo.


A 12 de Abril de 1947, imediatamente antes da sua execução, Rudolf Höss assinou o seguinte Declaração Final, na qual admitia a sua vergonha por ter cometido Crimes Contra a Humanidade e por ter participado no genocídio perpetrado pelo Terceiro Reich:

"A minha consciência força-me a fazer também a seguinte declaração: No isolamento da prisão eu cheguei à amarga compreensão dos crimes terríveis que cometi contra a humanidade. Como Comandante do campo de extermínio de Auschwitz, tomei parte nos monstruosos planos de genocídio do Terceiro Reich. Por estes meios causei à humanidade e à espécie humana o maior mal, e trouxe sofrimento indizível, particularmente à nação polaca. Pela minha responsabilidade, vou agora pagar com a minha vida. Oh, que Deus perdoe os meus actos! Povo da Polónia, peço-lhe que me perdoe! Só agora nas prisões polacas reconheci o que é a humanidade. Não obstante tudo o que aconteceu, fui tratado humanamente, o que nunca esperei, e isto fez-me sentir profundamente envergonhado. Queira Deus... que o facto de eu revelar e confirmar estes monstruosos crimes contra a humanidade possa evitar para todo o sempre até mesmo as causas que conduziram a acontecimentos tão terríveis."


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Baseada nos 46 volumes de livros que a União Soviética confiscou no campo de Auschwitz, onde era registada a mortalidade no campo, a Cruz Vermelha Internacional estimou que um total de 135 mil prisioneiros registados morreu nos três campos de Auschwitz. Estes números incluem judeus e não judeus...

As placas indicadoras do número de vítimas de Auschwitz, que já foram revistas uma vez, sê-lo-ão de novo num futuro próximo?

segunda-feira, maio 25, 2009

A reintrodução do Escudo na economia portuguesa funcionando em paralelo com o Euro

Murray N. Rothbard [liberal da Escola Austríaca] fala da gigantesca fraude bancária que se vem praticando até hoje:

"Desde então, os bancos têm criado habitualmente recibos de depósitos (originalmente notas de banco e hoje depósitos) a partir do nada [out of thin air]. Essencialmente, são contrafactores de falsos recibos de depósitos, de activos líquidos ou dinheiro padrão, que circulam como se fossem genuínos, como as notas ou contas de cheques completamente assegurados."

"Os bancos criam dinheiro literalmente a partir do nada, hoje em dia exclusivamente depósitos em vez de notas de banco. Este tipo de fraude ou contrafacção é dignificado pelo termo reservas mínimas bancárias [fractional-reserve banking], o que significa que os depósitos bancários são apoiados por apenas uma pequena fracção de activos líquidos que prometem ter à mão para redimir os seus depósitos."


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Caros visitantes habituais deste Blog, visitantes esporádicos, comentadores e internautas em geral:

Neste post proponho a criação de uma moeda nacional – o Escudo, paralela à moeda europeia já existente (o Euro), cuja existência dependeria totalmente do débito (da dívida dos empréstimos).

Este modelo pretende combater a cobrança de juros por empréstimos efectuados por bancos privados com dinheiro que não existe e evitar as contracções e expansões monetárias executadas deliberadamente pela banca privada com o objectivo de criar depressões económicas ou períodos inflacionários, que conduzem à rapina da riqueza nacional por parte dos cartéis dos grandes banqueiros nacionais e internacionais.

Gostaria, por isso, de ouvir, na caixa de comentários, as vossas opiniões fundamentadas sobre a exequibilidade, ou não, deste projecto:


I

Por intermédio da Caixa Geral de Depósitos, o Estado português procederia à introdução de uma nova moeda – o Escudo, que manteria sempre uma paridade de 1 em relação Euro (o valor das duas moedas seria sempre igual), e que seria uma moeda totalmente electrónica: não existiriam notas ou moedas de Escudo em circulação. Todas as transacções seriam feitas por via electrónica – multibanco, Home Banking - computador ou telefone em casa, e também por cheque.


II

O Escudo não teria curso legal para privados, ou seja, ninguém poderia ser obrigado a receber o Escudo em pagamento por quaisquer bens ou serviços. Esta moeda não teria de ser obrigatoriamente aceite como tal pelos agentes económicos. Apenas o Estado Português teria, por lei, de aceitar o Escudo para todo o tipo de pagamentos que lhe fossem devidos (impostos, taxas, etc.).


III

A SIBS - Sociedade Interbancária de Serviços, que disponibiliza o sistema Multibanco, aceitaria efectuar todas as transacções em que Euros fossem transferidos para contas em Escudos na Caixa Geral de Depósitos. Estes Euros seriam, de imediato, substituídos por Escudos nestas contas. Também os cheques em Euros que fossem depositados nas contas em Escudos na Caixa Geral de Depósitos, seriam substituídos por Escudos.


IV

A Caixa Geral de Depósitos cobraria sempre apenas 1% de juros pelos empréstimos que efectuasse em Escudos, percentagem necessária para cobrir os custos operacionais do Banco (balcões, salários, hardware e software, etc.). A Caixa Geral de Depósitos não cobraria quaisquer outras taxas ou spreads. A Caixa Geral de Depósitos não pagaria nenhuns juros pelos depósitos em Escudos ou Euros.


Funcionamento da moeda Escudo

1 - João pretende comprar uma casa a Afonso no valor de 100,000 Euros. Para tal precisa de um empréstimo.

2 - João prefere pedir um empréstimo à Caixa Geral de Depósitos no valor de 100,000 Escudos, pelo qual ficará a pagar apenas amortizações e juros (1%) do montante emprestado, ao invés de pedir um empréstimo em Euros a um banco privado onde ficaria sujeito às flutuações dos juros e aos spreads (taxas de lucro dos bancos), substancialmente mais elevados.

3 - João vai falar com Afonso para saber se este aceita o pagamento em Escudos.

4 - Se Afonso aceitar o pagamento em Escudos, então cada um deles abre uma conta à ordem, em Escudos, na Caixa Geral de Depósitos.


5 - João terá de dar todas as garantias actualmente em vigor neste tipo de transacção à Caixa Geral de Depósitos. A casa ficará hipotecada à Caixa Geral de Depósitos até ao pagamento integral da dívida por parte do João.

6 - João fica com uma dívida de 100,000 Escudos à Caixa Geral de Depósitos e Afonso fica com 100,000 Escudos disponíveis na sua conta à ordem na Caixa Geral de Depósitos.


Repare-se que a Caixa Geral de Depósitos não desembolsou dinheiro algum. Limitou-se a abrir duas contas, uma que creditou – a de Afonso – em 100,000 Escudos, e outra que debitou – a de João – em 100,000 Escudos. A Caixa Geral de Depósitos procedeu apenas a um movimento contabilístico.


7 - João irá pagar, durante todo o período contratado no empréstimo, as respectivas amortizações e juros (1%) à Caixa Geral de Depósitos. Estes pagamentos poderão ser feitos em Escudos, em Euros ou noutra moeda válida. Estas últimas moedas serão substituídas por Escudos.

8 - Agora, Afonso, que possui uma conta com 100,000 Escudos na Caixa Geral de Depósitos, pretende comprar um automóvel a prestações no Stand Autocar no valor de 20,000 Euros.

9 - Afonso vai falar com Jorge, o dono do stand Autocar, para saber se este aceita o pagamento em Escudos.

10 - Se Jorge aceitar, então abre uma conta na Caixa Geral de Depósitos. Este banco credita a conta de Jorge em 20,000 Escudos e debita à conta do Afonso a mesma importância.


Atente-se, uma vez mais, que a Caixa Geral de Depósitos não desembolsa dinheiro nenhum. Procedeu novamente apenas a um simples movimento contabilístico.


11 - Afonso, com os 80,000 Escudos que lhe restam na conta na Caixa Geral de Depósitos, continuará, eventualmente, comprando ou pagando bens e serviços da mesma forma, recrutando, no processo, novos clientes para contas à ordem em Escudos na Caixa Geral de Depósitos.

[...]

12 - Uma altura chegará em que Sicrano pagará em Escudos, através do Multibanco, um almoço num restaurante que terá necessariamente de possuir uma conta em Escudos na Caixa Geral de Depósitos, e que Beltrano pagará um par de calças, em Escudos, por intermédio de cheque, a uma loja de roupas que terá obrigatoriamente de dispôr de uma conta em Escudos na Caixa Geral de Depósitos.



Conclusão:

Dado a pequeno valor da taxa de juros nos empréstimos, as famílias e as empresas teriam clara preferência pelo Escudo da Caixa Geral de Depósitos como agente financiador. O número de contas à ordem de compradores e vendedores neste Banco cresceria exponencialmente, bem como a quantidade e o valor dos movimentos financeiros.

A prazo dar-se-ia a falência dos bancos comerciais privados e o Escudo impunha-se como a moeda preponderante neste país.



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Já alguma vez pensaram porque é que os bancos têm tanto dinheiro, enquanto os países, as empresas e os indivíduos estão tão endividados?

No vídeo, «Money as Debt» [Dinheiro sob a forma de Dívida], Paul Grignon pega num assunto tabu e, de forma inteligente e divertida, torna-o num tópico inteligível. Costuma dizer-se que a verdade liberta, mas que primeiro costuma deixar-nos zangados. Depois de se conhecer a verdadeira história do sistema bancário já não é possível voltar à crença mística da banca privada como um elemento válido da sociedade. Muito pelo contrário!

O vídeo revela os mitos e os conceitos relativos à história do dinheiro. Toda a gente gosta de dinheiro, toda a gente o deseja, toda a gente precisa e depende dele. O que quase ninguém percebe são os fundamentos do dinheiro. O que é o dinheiro e donde é que ele vem? Estas são algumas das difíceis realidades que Grignon expõe em linguagem simples.


Os primeiros oito minutos e vinte segundos (8:20m) do vídeo 'Money as Debt' - legendados em português.




A versão completo do vídeo em inglês (47m): Money as Debt

E a versão completa do vídeo em espanhol (47m): El Dinero es Deuda.
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quinta-feira, maio 21, 2009

Auschwitz - A Pequena Casa Vermelha e a Pequena Casa Branca

Antes de acabada a construção das quatro grandes câmaras de gás em Birkenau em 1943, o gaseamento dos judeus teve lugar em duas velhas casas rurais, descritas como a "Pequena Casa Branca" e a "Pequena Casa Vermelha". A Pequena Casa Vermelha estava localizada a norte do lugar onde a quarta câmara de gás, chamada Krema V, foi construída. A Pequena Casa Vermelha foi completamente destruída pelos nazis e nada sobrou dela. A Pequena Casa Vermelha foi o lugar onde aconteceu o primeiro gaseamento de judeus em Birkenau, que começou em Março de 1942. A Pequena Casa Branca ficou operacional como câmara de gás em Junho de 1942.

Artigo de Scrapbookpages

[Tradução minha]

As ruínas da "Pequena Casa Branca" - Bunker 2

A Pequena Casa Branca [Bunker 2] estava localizada a oeste da Sauna Central, que foi construída em 1943 para acomodar uma sala de chuveiros e numerosas câmaras de desinfecção usadas para matar os piolhos das roupas dos prisioneiros.

As ruínas da Pequena Casa Branca foram preservadas, como se pode ver nas fotos deste artigo. Na foto acima, podem-se ver quatro placas pretas que indicam aos visitantes em quatro línguas que se trata das ruínas da Pequena Casa Branca, chamada Bunker 2. A foto abaixo mostra uma placa que também identifica as ruínas.

Placa identifica as ruínas da "Pequena Casa Branca" - Bunker 2

Depois da Guerra, os antigos habitantes polacos de Birkenau regressaram para reconstruir as suas casas que tinham sido confiscadas pelos nazis e destruídas para construir as barracas de Birkenau. Os polacos levaram os tijolos das câmaras de gás destruídas e usaram-nos para reconstruir as suas casas. Os tijolos que podem ser vistos hoje no lugar do Bunker 2 pode ser uma reconstrução, porque os valiosos tijolos originais foram provavelmente removidos pelos habitantes polacos há sessenta anos.

As fotos deste artigo foram tiradas em Outubro de 2005; quando o autor deste texto visitou Auschwitz-Birkenau em 1998, a guia disse-lhe que as localizações da Pequena Casa Branca [Bunker 2] e da Pequena Casa Vermelha eram desconhecidas.

As ruínas mostram tijolos assentes directamente no chão, sem fundações, como se pode observar na foto abaixo:

Ruínas da Pequena Casa Branca


A Pequena Casa Branca [Bunker 2] estava dividida em quatro salas pequenas

Como mostram as quatro fotos acima, a Pequena Casa Branca [Bunker 2] estava dividida em quatro salas pequenas com capacidade para matar mil e duzentos judeus de cada vez, segundo Laurence Rees, o autor de "Auschwitz, a New History" [Auschwitz, uma História Nova]. Os gaseamentos eram feitos com Zyclon-B, um poderoso gás venenoso usado também em Birkenau para matar os piolhos das roupas dos prisioneiros numa tentativa de travar a disseminação do tifo. O Zyclon-B encontrava-se em forma de grânulos do tamanho de pequenas ervilhas. Os grânulos eram lançados para dentro das salas através de uma abertura na parede.

Segundo um livro intitulado "The Bombing of Auschwitz: Should the Allies Have Attempted It?" [O Bombardeamento de Auschwitz. Deveriam os Aliados Tê-lo Tentado?], de Michael J. Neufeld e Michael Berenbaum, o Bunker 2 tinha 17 metros de comprimento por 8 metros de largura. Cada uma das quatro câmaras de gás tinha 4,2 metros de comprimento por 2,1 metros de largura. O Bunker 1 [a Pequena Casa Vermelha] tinha 15 metros de comprimento por 6,4 metros de largura.

Reconstrução efectuada pela BBC, em 2005, da "Pequena Casa Vermelha" [Bunker 1]
Esta câmara de gás tinha capacidade para matar
oitocentas pessoas de cada vez

Sobreviventes afirmam que as quatro pequenas câmaras de gás na Pequena Casa Branca [Bunker 2] estavam disfarçadas de chuveiros. Esta casa encontrava-se num sítio remoto e provavelmente não possuía água corrente, portanto as vítimas não eram enganadas com este truque. As ruínas do Bunker 2 não mostram nenhuns sinais de canalizações ou escoadouros ligados a canos de esgotos.

Otto Pressburger, um sobrevivente de Birkenau, afirmou que os gaseamentos tinham sempre lugar à noite, nunca durante o dia, para que as vítimas não gritassem ou tentassem escapar das câmaras de gás. Citando Laurence Rees, Pressburger disse, "Só vimos os corpos na manhã seguinte empilhados junto das valas."

Pressburger trabalhou numa unidade especial de prisioneiros cuja tarefa era enterrar os corpos das vítimas que tinham sido gaseadas na Pequena Casa Branca e na Pequena Casa Vermelha. Ele afirmou que os homens das SS traziam os corpos para as valas durante a noite e na manhã seguinte, a sua unidade especial tinha de os enterrar.

Oscar Groening, um homem das SS que trabalhava em Birkenau, também afirmou que o gaseamento dos judeus nas duas casas rurais era executado à noite. Tal como afirmou Laurence Rees, Groening disse que tinha testemunhado um gaseamento numa noite depois de ter sido acordado por um alarme por causa de alguns judeus que tinham fugido quando se dirigiam para a câmara de gás. Ele viu as luzes acesas numa das casas rurais, e sete ou oito corpos em frente da casa. Groening pensou que aqueles corpos eram dos fugitivos que tinham sido apanhados e mortos a tiro.

Groening foi "dominado pela curiosidade", segundo Rees, e ele e os seus camaradas ficaram ali próximo para ver o que é que estava a acontecer na casa agrícola. Viram um homem das SS, usando uma máscara, deitar grânulos de Zyclon-B por uma janela na parede de um dos lados da casa. Ouviram gritar durante um minuto, seguido de silêncio. Então um homem das SS aproximou-se da porta e espreitou pelo óculo para ver se os prisioneiros estavam mortos.

Este sítio remoto era uma boa localização para a utilização de Zyclon-B, o qual era perigoso e podia matar os homens das SS que tinham de atirá-lo para dentro da casa. Até Março de 1942, o gaseamento de judeus era levado a cabo no Krema I no campo principal de Auschwitz. O Krema I estava situado entre o hospital das SS e o edifício da Gestapo, o que não constituía uma boa localização por causa da utilização do perigoso gás venenoso. Na sua autobiografia, Rudolf Höss, o comandante de Auschwitz-Birkenau, escreveu relativamente aos gaseamentos na Pequena Casa Branca:

"Centenas de homens e mulheres em plena flor da vida caminharam sem suspeitar para a morte nas câmaras de gás sob as floridas árvores de fruta dos pomares. Esta imagem da morte rodeada de vida continua comigo até hoje. Eu via-os como inimigos do nosso povo. A lógica para o Programa de Extermínio parecia-me correcta."

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Em 2005 a BBC produziu um documentário: 1942 - Hidden Slovakia History [1942 - A História Encoberta da Eslováquia], onde, a dada altura, mostra uma reconstituição da "Pequena Casa Vermelha", a câmara de gás que media 15 metros de comprimento por 6,4 metros de largura e que tinha capacidade para matar oitocentas pessoas de cada vez.

Este é um excerto do documentário da BBC - 2:58m

[Vídeo legendado por mim em português]

terça-feira, maio 19, 2009

Jon Stewart – A gripe suína e a pandemia do medo


Jon Stewart: Há quem chame a fase que estamos a atravessar "um mau período de notícias", com a... Acho que lhe podemos chamar "depressão económica". Há as guerras, grandes gastos que fazem aumentar o défice, mas só quero dizer que, este fim-de-semana, saí à rua e o tempo estava fantástico. Assim, é impossível evitar sentir alguma esperança. Estamos prestes a dar a volta por cima.

Fox News: Alerta da Foz News! A Casa Branca declarou o estado de emergência para a saúde pública para lidar com a ameaça crescente da gripe suína.

CNN: Notícia de última hora. Há uma nova estirpe altamente contagiosa da gripe e, neste momento, o número de mortos está a aumentar. Vamos a caminho de uma pandemia?

Jon Stewart: M... para isto! Uma pandemia? A sério? Uma pandemia também. [Jon vira-se para Deus] É obra Sua? Uma pandemia? Não acha que já é demais? Elegemos Obama, o muçulmano cristão. Que mais quer Ele de nós? Agora, devia tirar o pé do acelerador! Mas há cerca de duas horas que não vejo as notícias, portanto, vamos ver em que ponto estamos.

Flashes noticiosos: Nos Estados Unidos houve oito casos. Dois casos confirmados no Kansas. Houve mais um caso na Califórnia. Ohio, Nova Iorque. Podem acrescentar o Michigan à lista. A doença altamente contagiosa pode já estar na Europa. França, Espanha. Israel, Nova Zelândia... O Canadá também já confirmou seis casos pouco graves do vírus.

Jon Stewart: Gosto de apanhar um bom susto, mas, por causa de seis casos pouco graves de gripe, vão pôr dez mil milhões de km2 a vermelho vivo? Não quero ser alarmista, mas qual é o aspecto de um surto de herpes por lá? Parece-me que temos um susto à moda antiga na calha.

Jornalista: Há indicações... Sei que ainda é muito cedo, mas há indicações de que a causa desta nova estirpe de gripe seja o bioterrorismo?

Especialista: Não observámos nada no nosso trabalho que sugira outra coisa que não uma ocorrência natural.

Jornalista: Mas, da perspectiva da segurança, também não há nada que exclua a possibilidade de bioterrorismo?

Jon Stewart: Ele disse não! Também pode ser uma das dez pragas profetizadas na Bíblia? Não temos provas disso. Então, não podemos excluir Deus? Alguém faz melhor que transformar febre e garganta inflamada num ataque terrorista?

CNN: A gripe suína pode matar dezenas de milhões de pessoas, se não for travada.

Jon Stewart: É a m... mais assustadora que ouvi a semana toda. Conseguiram. Estou em pânico. Mais alguma coisa que queiram acrescentar?

Flashes noticiosos: 1 - Não quero entrar em pânico. 2 – Não queremos causar pânico. 3 – Não queremos causar o pânico com esta notícia, mas é uma notícia importante.

Jon Stewart: Nem sequer vêem as vossas próprias estações de televisão? Vocês são a única razão para estarmos em pânico! Já que vamos morrer todos, acho que é justo perguntar: O que é a gripe suína?

Especialista: Tem componentes genéticos de uma série de fontes, incluindo humanas, suínas e aviárias.

Jon Stewart: É uma mistura de fontes humanas, suínas e aviárias. Só há duas formas de isso acontecer: uma mutação genética que atravessa as três espécies ou um idiota que f… uma sanduíche de peru e bacon.

And goes on and on...


Vídeo legendado em português:

domingo, maio 17, 2009

A Guerra das Cruzes de 1998 em Auschwitz ou de quem é o Holocausto, afinal?

Na sequência da actual «guerra» entre a comunidade judaica e o Vaticano, vale a pena relembrar a «Guerra das Cruzes», começada em 1998, entre polacos católicos e judeus de todo o mundo:

Artigo no Scrapbookpages

[Tradução minha]


Cruzes colocadas em 1998 em frente ao Bloco 11 de Auschwitz

Em 1998, nacionalistas polacos decidiram colocar 152 cruzes cristãs em honra dos combatentes católicos polacos da resistência que foram executados pelos nazis numa vala de cascalho atrás do Bloco 11, no principal campo de concentração de Auschwitz. Foi esta a sua forma de protesto contra a exigência judaica, durante os dez anos anteriores, para que uma cruz de 8 metros de altura que recordava uma missa dita pelo Papa em Birkenau fosse removida. A atitude dos polacos foi "este é o nosso país. Vocês têm o vosso país e nós temos o nosso. Se queremos colocar uma cruz católica no nosso país, fazemo-lo".

As 152 cruzes que foram colocadas em 1998, foram depois removidas e a paz foi restabelecida.

Em 1998, grafitis nas placas indicadoras ao longo da estrada que conduz ao campo de Auschwitz alertavam os visitantes para a Guerra das Cruzes ainda antes de chegarem ao campo. Os grafitis eram bem-dispostos e brincavam acerca da controvérsia. Em Outubro de 1998, a Guerra das Cruzes tinha subido de tom ao ponto dos católicos polacos estarem a ameaçar colocar 1000 cruzes, ou uma por cada ano em que a Polónia tinha sido um país católico. Durante os anos em que a Polónia esteve sob domínio estrangeiro, foi a igreja católica que manteve vivo o espírito do nacionalismo polaco.

Os protestos judeus contra os símbolos cristãos estavam a aumentar em 1998, e houve uma nova exigência para que a igreja católica no edifício da ex-administração SS em Birkenau fosse removida, porque não era apropriado num lugar onde mais de um milhão de judeus morreram nas câmaras de gás.

Em Outubro de 2005, quando a foto em baixo foi tirada, a igreja católica ainda estava neste edifício:

Igreja católica no edifício da ex-administração SS em Birkenau

A Guerra das Cruzes foi o culminar de anos de tensão entre polacos e judeus. Os judeus ainda estão ressentidos por alguns polacos terem colaborado com os nazis durante a Segunda Guerra Mundial, e, pior do que isso, depois da Guerra, em 1946, houve progroms nos quais mais judeus foram mortos por polacos civis. Os judeus afirmam que os nazis mataram os judeus no cumprimento de ordens, mas os polacos mataram os judeus de livre vontade. Em 1968 houve violência contra os judeus na Polónia, e mesmo hoje, memoriais judeus e sinagogas em Varsóvia têm de ser constantemente guardadas contra vandalismos e fogos postos.

O desejo dos judeus é fazerem de Auschwitz um lugar internacional, em vez de um lugar sob controlo do governo polaco. Estudantes judeus vêm de Israel e de países de todo o mundo, para um evento bianual chamado "A Marcha dos Vivos", e nesta altura, eles encontram-se e falam informalmente com judeus polacos numa tentativa de compreender o passado e prevenir derramamentos de sangue futuros.

Auschwitz é o maior cemitério judeu do mundo. Foi aqui que mais de um milhão de judeus inocentes perderam a vida às mãos dos nazis. O próprio termo Auschwitz é sinónimo de sofrimento judeu e genocídio. Então, porque é que alguém haveria de querer colocar cruzes cristãs mesmo junto dos terrenos do memorial do holocausto, donde podem ser vistas por judeus enlutados a orar?

A fotografia abaixo mostra o Bloco 11, o edifício prisão no campo principal de Auschwitz como o muro das execuções, chamado "o muro preto", à esquerda. Uma pessoa que estivesse aqui em Outubro de 1998 não seria capaz de ver as cruzes que foram erigidas na vala de cascalho do outro lado deste edifício.

O outro lado do edifício do Bloco 11, visto do lado de dentro do campo

Na verdade, o local onde a maior parte dos judeus morreu no Holocausto não foi no campo principal de Auschwitz, chamado Auschwitz I, do lado de fora do qual foram colocadas as cruzes em 1998, mas em Auschwitz II, um enorme campo subsidiário, a três quilómetros do campo Auschwitz I. Auschwitz II é mais conhecido como Birkenau, e todo o complexo é agora conhecido por Auschwitz-Birkenau.

Todas as crianças nas escolas americanas sabem do Holocausto e do destino de Anne Frank, que morreu de tifo em Bergen-Belsen, para onde foi transferida depois de ter sido prisioneira em Auschwitz-Birkenau. Anne Frank esteve em Auschwitz II, agora chamado Birkenau. Birkenau é o nome alemão para a vila de Brzezinka onde o campo para prisioneiros judeus, trazidos de toda a Europa, foi instalado. Foi em Birkenau que o genocídio dos judeus foi levado a cabo, não no campo principal onde as cruzes foram colocadas.

Para compreender a Guerra das Cruzes, do ponto dos nacionalistas polacos, temos de compreender que o ex-campo de concentração nazi de Auschwitz I, que foi transformado num museu, é denominado o museu do martírio. Quando o campo principal de Auschwitz foi transformado num museu, em 1947, o decreto oficial dizia: "No lugar do ex-campo de concentração nazi, um monumento ao martírio da nação polaca e de outras nações vai ser erigido para todo o sempre". Não havia nenhuma menção aos judeus ou ao Holocausto em nenhum dos folhetos do museu oficial desse tempo. O museu tinha um propósito estritamente político, um monumento à luta dos comunistas contra os fascistas. O museu era oficialmente descrito como um "Monumento Internacional às Vítimas do Fascismo".

Foi apenas depois da queda do comunismo em 1998 que o genocídio dos judeus foi mencionado no monumento do ex-campo de Birkenau. Antes de 1998, poucas pessoas fora da Polónia tinham alguma vez visto Auschwitz-Birkenau, mas existiam mais visitantes durante o regime comunista do que em 1998, porque todos os cidadãos polacos eram encorajados a ir em excursões em grupo ao campo e a maior parte destes visitantes era católica. Em 1998, o maior grupo de visitantes foram estudantes universitários católicos polacos que estavam a cumprir um requisito educacional a visitar Auschwitz onde tantos dos seus católicos avós sofreram e morreram bravamente durante a resistência polaca à invasão nazi.

Desde o primeiro dia em que o campo principal de concentração de Auschwitz abriu, em Junho de 1940, foi o lugar para onde foram enviados os prisioneiros políticos polacos. Foram imagens religiosas católicas que foram arduamente desenhadas com as unhas das mãos nas paredes de concreto numa cela de prisão numa cave em Auschwitz por resistentes polacos que estavam lá presos. Foram sobretudo prisioneiros políticos católicos que foram encostados nus ao muro preto de Auschwitz e executados com um tiro no pescoço. Foram as fotografias de prisioneiros políticos polacos que forraram as paredes dos corredores em 1998 dos edifícios de Auschwitz que foram convertidos num museu.

Para o povo polaco, que era 98% católico, Auschwitz-Birkenau é um lugar onde não um, mas dois dos seus santos católicos morreram como mártires. Tanto o padre Maksymilian Kolbe, um sacerdote católico, como a freira carmelita Edith Stein encontraram a morte em Auschwitz-Birkenau e foram canonizados como santos católicos. A cela prisional no Bloco 11, no campo principal de Auschwitz, que esteve ocupada pelo padre Kolbe que se voluntariou para morrer para salvar a vida a um companheiro prisioneiro, é um local sagrado católico importante. Em 1998, as controversas cruzes foram colocadas em frnte do muro do edifício do Bloco 11, onde o padre Kolbe esteve preso numa "cela da fome".

Na imagem abaixo vê-se o interior da cela na cave onde o padre Kolbe foi deixado a morrer à fome. Na parede está uma placa memorial. Esta cela está sempre decorada com flores, mas note-se que não estão lá nenhuma cruz, porque este edifício está dentro do campo principal de Auschwitz , que é agora um museu.

Foto de 2005 da cela prisional nº 18, a cela do padre Kolbe

Edith Stein nasceu judia e era ateia, mas converteu-se à religião católica e tornou-se numa freira carmelita sob o nome de irmã Benedicta da Cruz. Por ser judia, foi gaseada na câmara de gás na pequena casa rural conhecida como Bunker 2 em Birkenau a 9 de Agosto de 1942. Foi canonizada como santa numa igreja católica em Outubro de 1998.

A original Guerra das Cruzes começou em 1979 depois de católicos piedosos terem erigido uma cruz cristã nas ruínas do Bunker 2, a seguir ao anúncio do Papa de que a igreja estava a iniciar o processo de beatificação, o primeiro passo para a santidade. Então os judeus erigiram um símbolo da Estrela de David e pouco depois já havia uma proliferação de cruzes e estrelas: a guerra tinha começado.

Foto de 2005 das ruínas do Bunker 2

Foram as freiras carmelitas que colocaram a primeira cruz no campo principal de Auschwitz em 1988, próxima do seu convento que era próximo das paredes do campo. O convento carmelita foi estabelecido em 1984 num edifício de tijolo que fora usado pelos nazis para guardar o Zyclon que foi usado para gasear os judeus. Existe também um convento carmelita mesmo junto ao antigo campo de concentração de Dachau, e a cruz cristã no seu topo está à vista e a poucos metros do memorial judeu que foi construído mais tarde. O convento de Dachau tem uma entrada por uma das ex-torres de guarda do campo e está aberta aos turistas que visitam o antigo campo de concentração.

Os judeus também protestaram contra este convento, mas em vão. Ele continua lá, assim como uma capela memorial protestante e uma capela memorial católica nos terrenos do antigo campo. Não existem cruzes ou símbolos cristãos de qualquer tipo no cimo das capelas memoriais em Dachau, embora o memorial judeu ali próximo tenha um Menorah no topo e uma Estrela de David no portão de entrada.

Os protestos contra o convento de Auschwitz foram mais eficazes e por fim a hierarquia da igreja católica concordou em despejar as freiras do edifício. A controvérsia tornou-se ainda mais acesa no Verão de 1989 quando as freiras, já depois de terminado o prazo que lhes fora dado para saírem, ainda não o tinham feito. Habitantes locais reagiram furiosamente quando activistas judeus dos Estados Unidos e de Israel dirigiram uma série de protestos no local. Os polacos interpretaram os protestos como uma intrusão hostil estrangeira e um assalto à soberania da nação polaca por governos de outros países. As freiras finalmente mudaram-se para novas instalações do outro lado da rua, em 1993, mas deixaram a cruz evocativa da missa do Papa, que tinham erigido próximo do convento.

A Polónia tornou-se o país principal para os católicos do mundo porque foi o lugar de nascimento de Karol Wojtyla, o cardeal-arcebispo de Cracóvia, que foi eleito em 1978 o primeiro Papa polaco e o primeiro Papa não italiano em 450 anos. O lugar de nascimento de João Paulo II fica apenas a 30 quilómetros de Auschwitz, em Wadowice, uma pequena e em tempos obscura cidade que se tornou num local popular de peregrinações para católicos. Wadowice possui hoje um aeroporto internacional para receber os muitos visitantes da cidade.

A 7 de Juho de 1979, o Cardeal Wojtyla voltou à Polónia, como Papa João Paulo II, e honrou o seu país natal dando uma missa no antigo campo de concentração nazi de Auschwitz II ou Birkenau. Birkenau foi escolhido porque é o sítio mais próximo da cidade natal do Papa e que era suficientemente amplo para albergar a multidão de 500 mil pessoas que assistiram a este acontecimento único na história da Polónia católica.

A cruz de 8 metros do altar dessa missa é a mesma que foi erigida pelas freiras carmelitas em 1988 no seu convento num edifício junto aos terrenos do Museu do Martírio em Auschwitz I. O edifício para onde as freiras se mudaram tinha sido um antigo teatro antes da Segunda Guerra Mundial.

As imagens abaixo, tiradas em 1998, representam uma vista panorâmica do local da controvérsia sobre as cruzes. A primeira imagem começa na zona esquerda do local e mostra o antigo edifício ocupado pelas freiras católicas carmelitas; as outras fotos foram sendo tiradas da esquerda para a direita.

Edifício que foi o antigo convento das carmelitas católicas


Bandeira polaca e flores em honra dos 152 polacos católicos executados neste local


Algumas das mais de 200 cruzes erigidas fora do campo principal de Auschwitz. Ao centro está a cruz de oito metros usada pelo Papa João Paulo II na sua Missa em Birkenau

Como mostra a fotografia acima, as cruzes foram colocadas nos três lados da antiga vala de cascalho, rodeando a cruz de oito metros da Missa dita pela Papa em 1979 que foi erigida no meio da vala, agora coberta de erva. Na altura em que estas fotos foram tiradas, a 1 de Outubro de 1998, o número de cruzes será superior a 200. A exposição está feita de forma harmoniosa e não caótica ou desrespeitosa como dava a entender o jornal Los Angeles Times referindo-se à controvérsia.

A placa amarela na cerca, mostrada na primeira imagem, pedia o regresso das freiras carmelitas ao belo edifício de tijolo. As freiras mudaram-se para novas instalações em 1993 em resposta a protestos judeus liderados pelo Rabi Weiss em Nova Iorque, mas deixaram ficar a cruz de oito metros que fora erigida em 1988.

A 28 de Maio de 2006, o Papa Bento XVI, o líder da igreja católica, visitou o antigo campo de Auschwitz, que fora principalmente uma prisão para prisioneiros políticos, e o campo de Birkenau onde 1,5 milhões de pessoas, a maior parte judias, foram assassinadas.

A foto abaixo mostra o Papa a entrar no campo principal de Auschwitz através do infame portão "Arbeit Macht Frei" [O Trabalho Liberta], seguido pela sua comitiva de bispos e cardeais católicos.


A foto abaixo mostra o Papa Bento XVI junto ao Monumento Internacional em Birkenau onde presta homenagem às vítimas que foram gaseadas nos crematórios II e III, as ruínas que estão apenas a poucos metros do outro lado do monumento.


A visita do Papa em nada contribuiu para sarar o conflito entre católicos e judeus. Apesar do Papa Bento XVI ter mostrado reverência aos judeus que foram assassinados e tenha baixado a cabeça em sinal de vergonha, ele foi muito criticado nos meios de comunicação por não ter mencionado o anti-semitismo da igreja católica que contribuiu para o ódio aos judeus na Europa, e por não ter referido a falha de Pio XII em não ter feito tudo ao seu alcance para evitar a deportação de judeus para os campos da morte. O Papa Bento XVI não pediu desculpa aos judeus por Auschwitz.

O Papa falou em italiano, para não ofender os polacos e os judeus, ao falar na odiada língua alemã, mas mesmo assim conseguiu insultar os judeus com estas palavras:

"Num lugar como este, as palavras faltam; no fim só pode haver um silêncio de temor, um silêncio que é um sincero apelo a Deus: Porquê, senhor, ficaste em silêncio? Como pudeste tolerar isto?"

Não foi Deus, mas antes milhões de católicos na Europa que ficaram em silêncio, e não foi Deus, mas os vulgares alemães que toleraram o genocídio dos judeus, segundo os críticos dos meios de comunicação.

No seu discurso em Auschwitz, O Papa Bento XVI culpou os criminosos do regime nazi pelo Holocausto e não reconheceu a culpa colectiva do povo alemão que entusiasticamente apoiou Hitler. O Papa também se esqueceu de reconhecer o seu próprio passado nazi como um involuntário membro da juventude hitleriana e um soldado obrigado a combater no exército alemão.

O Papa visitou o Muro Preto no Bloco 11 e acendeu uma vela em honra dos presos políticos que aí foram executados, mas evitou sensatamente o outro lado do Bloco 11 onde a cruz usada na missa dita pelo Papa João Paulo II ainda se mantém. Bento XVI visitou a cela onde o padre Kolbe morreu, mas manteve-se longe da igreja católica no antigo edifício administrativo de Birkenau e evitou o edifício vazio onde as freiras carmelitas viveram.

O consenso geral dos meios de comunicação foi que o Papa fez o seu melhor, mas o seu melhor não foi o suficiente.


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Comentário:

A controvérsia da Guerra das Cruzes de 1998 é posterior à controvérsia sobre o número de vítimas de Auschwitz-Birkenau:


Em 1988, as placas de Auschwitz, que o Papa João Paulo II abençoou em 1979, e que indicavam terem morrido 4 milhões de pessoas naquele campo de concentração, foram substituídas em 1995 por outras placas que indicam que em Auschwitz morreram aproximadamente 1.5 milhões de pessoas. As novas placas foram abençoadas pelo Papa Bento XVI:

quinta-feira, maio 14, 2009

Mário Soares no "Prós e Contras" – Toda a comunicação social está concentrada nas mãos de meia dúzia de grupos económicos

Mário Soares: [...] E realmente isso mostra que há aí um conúbio... nem é com os jornalistas em si, mas com os directores. Uma das coisas que sucedeu é que formar um jornal, que era fácil logo a seguir ao 25 de Abril, não era difícil, formava-se um jornal, quatro jornalistas e tal, o papel, tudo aquilo era fácil de conseguir. Pois bem, agora um jornal, não há! Uma pessoa não pode formar um jornal, precisa de milhares de contos para formar hoje um jornal e, então, para uma rádio ou uma televisão, muito mais. Quer dizer, toda a concentração da comunicação social foi feita e está na mão de meia dúzia de pessoas, não mais do que meia dúzia de pessoas.

Fátima Campos Ferreira: Grupos económicos, é?

Mário Soares: Grupos económicos, claro, grupos económicos. Bem, e isso é complicado, porque os jornalistas têm medo. Os jornalistas fazem o que lhes mandam, duma maneira geral. Não quer dizer que não haja muitas excepções e honrosas mas, a verdade é que fazem o que lhes mandam, porque sabem que se não fizerem aquilo que lhe mandam, por uma razão ou por outra, são despedidos, e não têm depois para onde ir. É difícil, porque há muito pouca... é por isso que nós vimos muitos jornalistas, dos mais notáveis que apareceram depois do 25 de Abril, já deixaram de ser jornalistas. Fazem outras coisas, são professores de jornalismo, são professores de outras coisas. Bem, há aqui portanto um conúbio.

Fátima Campos Ferreira: Sr. Dr., mas então onde fica aí a liberdade de expressão?

Mário Soares: Ah, fica mal, fica mal, como nós sabemos.

Fátima Campos Ferreira: Mas não é também ao abrigo do chapéu da liberdade de expressão que o jornalismo ainda trabalha?

Mário Soares: Evidentemente que os jornais e os jornalistas e mesmo as televisões têm o cuidado de pôr umas florzinhas para um artigo ou outro. Uma vinda à televisão ou outra, etc., para disfarçar um pouco as coisas, mas não é isso o normal. Se a senhora se der ao trabalho, como eu tenho feito, de apreciar o que é, de uma maneira objectiva e isenta, a comunicação social, e como todos se repetem, ou quase todos os grupos se repetem a dizer as mesmas coisas, uns piores que outros, outros melhores, outros mais... mas todos se repetem, incluindo a televisão oficial, bem, a senhora perceberá...

Fátima Campos Ferreira: A televisão pública?

Mário Soares: A televisão pública! A senhora percebe que a comunicação social está nesta situação. Não culpo os jornalistas. Pelo contrário, os jornalistas são as primeiras vítimas...


Comentário:

Não nutro qualquer simpatia por Mário Soares. Reconheço, contudo, que, graças ao curriculum vitae que acumulou aquando da formação da Emaudio S.A., Sociedade de Empreendimentos AudioVisuais, «para aproveitar os recursos de algumas fundações partidárias que lhe eram afectas na participação da tão falada privatização dos meios de comunicação social e abertura da TV ao sector privado», o ex-Presidente da República deve possuir um conhecimento profundo dos mecanismos de propaganda da «Comunicação Social».

Posto isto, quantos dos seguintes jornalistas-comentadores-analistas, e tantos outros que surgem regularmente nos ecrãs das televisões e nas colunas dos jornais, se limitam a papaguear linearmente o que meia dúzia de grupos económicos lhes dita? Ou farão parte das honrosas excepções – as tais florzinhas, como lhes chama Soares, que servem apenas para dar a aparência de liberdade informativa?

Serviçais ou Florzinhas?

quarta-feira, maio 13, 2009

Nahum Goldmann - Sem as indemnizações alemãs do Holocausto, Israel não teria metade da sua infra-estrutura actual


Alguns excertos da entrevista de Nahum Goldmann ao jornal «Le Nouvel Observateur», de 25 de Outubro de 1976:

«Na sua grande maioria, a opinião judaica era hostil a qualquer contacto com os Alemães. Compreendo bastante bem essa atitude e disse muitas vezes que, se o povo judeu tivesse aceitado unanimemente a ideia de negociar indemnizações em dinheiro com os alemães, teria tido vergonha de ser judeu. O povo judeu devia por isso manifestar a sua oposição mas não era necessário que os seus líderes a tivessem em conta; é isto a política».

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«Sem as indemnizações alemãs, que começaram a chegar durante os primeiros dez anos da existência como Estado, Israel não teria metade da sua infra-estrutura actual: todos os comboios de Israel são alemães, os barcos são alemães, assim com a electricidade, uma grande parte da indústria... já sem falar das pensões individuais destinadas aos sobreviventes. Hoje [1976], Israel recebe ainda, anualmente, centenas de milhões de dólares em moeda alemã».

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«Não compreendo o teu optimismo, disse-me Ben Gourion. Porque é que os Árabes haveriam de fazer a paz? Se eu fosse um líder árabe, jamais assinaria a paz com Israel. É normal, nós tomámos conta do seu país. É certo que Deus no-lo prometeu, mas o que é que isso lhes interessa? O nosso deus não é o deles. Nós somos originários de Israel, é verdade, mas isso foi há dois mil anos: o que é que eles têm a ver com isso? Houve o antisemitismo, os nazis, Hitler, Auschwitz, mas foi culpa deles? Eles não vêem senão uma coisa: nós chegámos e roubámos o seu país. Porque é que eles o iriam aceitar? Talvez eles o esqueçam numa ou duas gerações mas, por ora, não existe essa possibilidade. Portanto, é simples: devemos manter-nos fortes, ter um exército poderoso. Toda a política está aí. Doutra forma, os Árabes destruíam-nos».

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Nahum Goldmann orgulha-se de duas grandes coisas: a fundação do estado de Israel – na qual participou – e as reparações [indemnizações] alemãs após a guerra – que ele negociou. É a história dessas difíceis negociações com Adenauer que expõe aqui aquele que é, aos 82 anos, o mais inconformista dos sionistas, ao mesmo tempo Presidente do Congresso judaico mundial e apoiante de paz com os Árabes.

Pai fundador de Israel – da mesma maneira que um Weizmann ou um Ben Gourion – Nahum Goldmann escolheu a Diáspora. Presidente do Congresso judaico mundial, tomou muitas vezes posições em contradição com a política oficial de Jerusalém. Chefe de Estado sem Estado, é, há mais de sessenta anos – em primeiro plano ou nos bastidores -, um dos personagens principais da história judaica contemporânea. Lituano de origem, alemão de cultura, americano de nacionalidade, Nahum Goldmann é, aos oitenta e um anos, o mais desconcertante dos sionistas. Amigo de Nasser, negociador junto de Adenauer das reparações [indemnizações] alemãs, apoiante de paz com os Árabes, ele não poderia encontrar melhor definição de si próprio que aquela que serve de título ao seu último livro: «le Paradoxe juif» [o Paradoxo judeu], que será lançado em Novembro nas edições Stock.

Ben Gourion com Konrad Adenauer, a 14 de Março de 1960. Poucos sabem que a Alemanha continua a pagar indemnizações a Israel [Foto - Nouvel Observateur].

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A entrevista completa de Nahum Goldmann ao jornal «Le Nouvel Observateur», de 25 de Outubro de 1976:

[Tradução minha]

A obtenção de indemnizações alemãs depois da última guerra [Segunda Guerra Mundial] constitui uma longa história e, talvez, o acontecimento da minha vida ao qual eu estou mais ligado. Creio ter dito que fiquei sobretudo alemão pela minha cultura, sendo sempre judeu, e cosmopolita no sentido «universal» do termo. Antes do hitlerismo, durante um curto século, a Alemanha deu aos judeus todos os direitos e, em troca, os judeus enriqueceram este país em todos os domínios: literário, filosófico, musical, político, financeiro… Certamente, o hitlerismo varreu os judeus alemães mas não conseguiu nada contra esta contribuição múltipla e incomparável.

A grande falha, que novamente sublinho, dos judeus alemães foi de não terem medido a tempo os riscos terríveis da aventura hitleriana. Já afirmei muitas vezes que, se não tivéssemos pertencido à geração que criou o Estado de Israel, teríamos ficado numa das mais dolorosas situações da história judaica em virtude da nossa falta de previsão e da nossa ausência de solidariedade anterior ao período nazi. Com alguns amigos, nunca deixei jamais pessoalmente de lançar gritos de alarme mas não pude, ou não soube, fazer-me entender.

Como eu representava o Congresso judaico mundial e a Agência judaica em Genebra, encontrava regularmente os líderes do judaísmo alemão. Estes encontros eram clandestinos porque lhes era interdito ter contactos com um homem desnaturalizado por alta traição. Tentámos fazer o máximo possível mas o povo judeu não nos ajudou muito. As democracias tiveram, também elas, a sua culpa mas, antes de acusar os não judeus, acusemo-nos a nós próprios. Mais tarde, quando os judeus começaram a compreender o horror da situação, a Alemanha era já tão forte que nada já era possível.

Se não contar com os meus encontros com os sobreviventes dos campos de concentração aquando da libertação, não regressei oficialmente à Alemanha senão para me encontrar com o chanceler Adenauer e empreender as negociações sobre as indemnizações. Estas indemnizações constituem uma inovação extraordinária em matéria de direito internacional. Até então, com efeito, quando um país perdia uma guerra, pagava os prejuízos ao vencedor, mas isso passava-se de Estado para Estado, de governo para governo. Ora, pela primeira vez, uma nação ia indemnizar ou simples indivíduos ou Israel, o que não existia juridicamente na altura dos crimes de Hitler. De resto, devo reconhecer que a ideia não partiu de mim.

Durante a guerra, o Congresso judaico mundial tinha criado em Nova Iorque um Instituto de Assuntos judaicos cuja sede é hoje em Londres. Os directores eram dois grandes juristas judeus lituanos, Jacob e Nehemiah Robinson. Graças a eles, o Instituto formulou duas ideias completamente revolucionárias: o tribunal de Nuremberga e as indemnizações alemãs.

É difícil avaliar a importância que revestiu o tribunal internacional que se instalou em Nuremberga. Segundo a lei internacional, era de facto impossível sancionar os militares por terem obedecido a ordens. Foi Jacob Robinson que teve a ideia extravagante e sensacional. Quando ele começou a falar disso aos juristas do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, tomaram-no por um louco «que fizeram então de extraordinário esses oficiais nazis? perguntaram. Podia-se imaginar que Hitler fosse a julgamento, Goering também, mas não simples militares que executaram ordens e que se comportaram como soldados leais.» Nós tínhamos portanto a maior dificuldade em persuadir os Aliados; os Britânicos eram à partida contra, os Franceses não estavam nada interessados e, se tivessem participado, não teriam desempenhado um papel importante. O êxito resultou do facto de Robinson ter conseguido convencer Robert Jackson, juiz do Supremo Tribunal americano.

A outra ideia do Instituto era que a Alemanha nazi devia pagar depois da sua derrota. Faltava ainda acreditar nessa derrota mas, na altura em que cada um podia supor que a guerra estava perdida para os Aliados, como Churchill, de Gaulle..., eu mantive a esperança. Em nenhum instante duvidei, porque sabia que Hitler não se conseguia moderar e que os seus exageros levariam os Aliados a entrar no conflito. No seguimento das conclusões do Instituto, as indemnizações alemãs deveriam ser dirigidas em primeiro lugar às pessoas que tinham perdido os seus bens por causa dos nazis. Por outro lado, se, como esperávamos, o Estado judeu fosse criado, os Alemães pagar-lhe-ia compensações para permitir aos sobreviventes estabelecerem-se lá. A primeira vez que esta ideia foi expressa, aconteceu durante a guerra, no decurso de uma conferência em Baltimore.

Um vez terminado o processo de Nuremberga, considerámos de novo o problema das indemnizações. Vários líderes judeus tentaram então estabelecer relações com Adenauer mas os seus propósitos eram a maior parte das vezes ridículos. Uma organização sugeriu-lhe pagar vinte milhões de marcos alemães; ora, no fim dos acordos que obtive, serão oitenta mil milhões de marcos que os Alemães deverão pagar no total!

Os nossos «contactos» eram Walter Hallstein, então sub-secretário de Estado, que veio a ser mais tarde presidente da CEE e o diplomata Herbert Blankenhorn, director do departamento político do ministério dos Assuntos exteriores e braço direito de Adenauer. Estes dois homens ficaram meus amigos íntimos.

Aquando da reunião do Congresso judaico mundial em Londres, um judeu russo, Noah Barou, um homem maravilhoso, grande idealista, cuja morte prematura nos deixou abalados, impeliu-me a entrar no jogo e a ter um encontro com Adenauer. No meu íntimo, eu estava muito hesitante porque falar novamente com os Alemães não me era fácil. Foi finalmente o meu cérebro que me decidiu a negociar, não o coração. Mas colocava uma condição prévia: antes de encontrar o chanceler para estabelecer as negociações, era preciso que Adenauer fizesse uma declaração solene no Bundestag [Parlamento alemão]; ele tinha de dizer que a Alemanha de hoje não era certamente aquela que quis Auschwitz (o próprio Adenauer tinha estado preso durante o governo de Hitler, e depois escondeu-se num mosteiro porque o Gestapo o procurava), mas que ela [a Alemanha] herdava a responsabilidade dos nazis e que lhe incumbiam as indemnizações; deveria acrescentar que as indemnizações materiais não iriam apagar o mal feito aos judeus pelos Alemães.

Quis-se por diversas vezes arranjar uma entrevista entre nós mas recusei ver o chanceler enquanto o discurso não fosse pronunciado. Eu estava de férias com a minha mulher no lago suíço dos Quatro-Cantões. Adenauer estava de férias a meia hora de lá, em Burgenstock. Blankenhorn veio-me ver para me dizer: «Adenauer está de férias aqui perto; se você tiver um encontro com ele ninguém o saberá. Ora, ele deseja muito a sua visita.» Eu não cedi.

Um pouco mais tarde, em Paris, mais exactamente no hotel Raphael, que era um estabelecimento excelente onde ficava também Eisenhower (eu fico sempre em hotéis frequentados por generais: eles escolhem os melhores porque não pagam), veio ter comigo um membro do primeiro parlamento alemão, um judeu socialista de nome Jacob Altmaier. Era um dos conselheiros de Adenauer para as questões judaicas. «O chanceler decidiu fazer-lhe a vontade, disse-me; ele vai apresentar uma declaração solene no Bundestag daqui a um dia ou dois e desejava que você a lesse antes para acrescentar possivelmente alguns comentários.» Fiz algumas correcções, que Adenauer levou em conta, e, dois dias mais tarde, fez o seu discurso. Todo o parlamento alemão se levantou e observou, de pé, cinco minutos de silêncio em memória das vítimas judias do nazismo.

Desse lado, as coisas tinham tomado o rumo que eu desejava e doravante podia estabelecer as conversações. Mas restava um grande problema: na sua grande maioria, a opinião judaica era hostil a qualquer contacto com os Alemães. Compreendo bastante bem essa atitude e disse muitas vezes que, se o povo judeu tivesse aceitado unanimemente a ideia de negociar indemnizações em dinheiro com os alemães, teria tido vergonha de ser judeu. O povo judeu devia por isso manifestar a sua oposição mas não era necessário que os seus líderes a tivessem em conta; é isto a política.

Adenauer enviou-me uma mensagem na qual se dizia disposto a negociar com um único representante dos judeus da Diáspora. Quanto às negociações com Israel, ele queria resolver a questão com uma delegação diferente. Inicialmente, o governo israelita tinha enviado notas diplomáticas aos quatro aliados: Soviéticos, Franceses, Britânicos e Americanos. Nelas explicava que o "custo de absorção de meio milhão de refugiados judeus sobreviventes dos campos de concentração era de mil e quinhentos milhões de dólares"; Israel queria que a Alemanha Ocidental pagasse dois terços dessa soma e a Alemanha de Leste um terço. Se Telavive se dirigia ainda aos aliados, era para não falar directamente com os alemães.

Até hoje, os Russos não responderam a esta nota. Quanto aos três outros aliados, disseram que estavam de acordo que a Alemanha pagasse, mas que não podiam negociar em nome dos judeus; eles tinham os seus próprios problemas com os Alemães: negociar as questões da ocupação e da soberania. O governo israelita estava por isso numa situação de constrangimento. Ben Gourion e Moshe Sharett convocaram-me então para me dizer: «O essencial das negociações deve ser feita em nome do povo judeu porque as vítimas do nazismo foram-no na condição de judeus e não na condição de Israelitas. Pessoalmente, não nos podemos expor demasiado porque o Herut fez deste caso um cavalo de batalha político». Haviam de facto grandes manifestações de rua em Israel; atiravam-se pedras a Ben Gourion mesmo no interior do Knesset, a Assembleia nacional israelita.

Mais uma vez eu compreendo esta reacção; compreendo a cólera e a indignação daqueles que tanto sofreram. É um pouco a mesma coisa hoje com os judeus da U.R.S.S., esses que conheceram as prisões e as penitenciárias soviéticas são os mais anti-russos. É preciso respeitá-los, admirá-los, mas sobretudo não fazer o que eles querem. Sem as indemnizações alemãs, que começaram a chegar durante os primeiros dez anos da existência como Estado, Israel não teria metade da sua infra-estrutura actual: todos os comboios de Israel são alemães, os barcos são alemães, assim como a electricidade, uma grande parte da indústria... já sem falar das pensões individuais destinadas aos sobreviventes. Hoje, Israel recebe ainda, anualmente, centenas de milhões de dólares em moeda alemã. Quando Pinhas Sapir fez um grande discurso para me defender diante do Conselho judaico mundial, afirmou: «Goldmann trouxe para Israel oito mil milhões de dólares». Em determinados anos, as somas de dinheiro que Israel recebia da Alemanha ultrapassavam as colectas do judaísmo internacional – multiplicando-as às vezes por dois ou três. Hoje, já ninguém está contra este princípio; mesmo certos membros do Herut entendem as indemnizações.

Convoquei portanto a Nova Iorque 0 Claims Conference [Conferência de Reivindicações] (mais precisamente Conferência das Reivindicações Materiais dos Judeus à Alemanha), representando todas as organizações judaicas. Em frente do hotel onde ficámos, a multidão manifestava a sua cólera e tive de sair sob a protecção da polícia. Em subida de tom, existiam violentas discussões no seio da Conferência porque ninguém estava de acordo sobre a designação dos membros do executivo. A discussão já durava há meio dia, sem resultado, quando um membro do American Jewish Labour Committee [Comité Americano dos Trabalhistas Judeus] se levantou e disse: «só há uma solução, demos plenos poderes a Goldmann para escolher os seus membros e nomeemo-lo presidente!» Fui desta forma nomeado por unanimidade – coisa inimaginável tanto no congresso sionista quanto no Congresso judaico mundial.

A minha primeira entrevista com Adenauer devia ter lugar sem que ninguém o soubesse. O chanceler informou-me então de um dia que iria estar em Londres para dar uma conferência e que nessa ocasião podia-me encontrar no hotel Claridge. Pediu-me para entrar em contacto com Blakenhorn para preparar esta conversa e discutir as modalidades. A Blankenhorn, que eu vi com Barou, pedi imediatamente, como condição preliminar à abertura das negociações propriamente ditas, que a Alemanha aceitasse o pedido de Israel – a saber, mil milhões de dólares não como meta mas como um ponto de partida.

Blankenhorn protestou: «Mas é completamente impossível! Como é que o chanceler poderia tomar um tal compromisso sem consultar os membros do seu governo – e, à partida, o seu ministro das finanças, Fritz Schgeffer, que é uma personalidade tão forte? Você tem de esperar». É bom lembrar que esta cena se passou muito antes do famoso «milagre económico» alemão e que, nos anos 1950, a Alemanha era muito pobre. Mas eu mantive-me inflexível: «sem uma tal promessa, retomei, não aconselharei nem aos meus colegas do Claims [Reivindicações] nem a Ben Gourion a aceitar o princípio da negociação». Chegada a altura, encaminhei-me para o Claridge para ter uma das conversas mais impressionantes da minha vida política. A atmosfera era glacial. Reparem: eu tinha à minha frente o primeiro chanceler da Alemanha depois de Hitler. Então, de repente, entrei directamente no assunto: «Senhor chanceler», disse a Adenauer, este momento é histórico. Normalmente, não gosto de grandes frases mas o momento em que o representante do povo judeu encontra o líder da nação alemã que massacrou seis milhões de judeus é necessariamente histórico, e vou-lhe explicar porquê. «Só lhe peço que me deixe falar vinte minutos sem me interromper». E Adenauer, com a sua figura venerável de estátua medieval, escutou o meu discurso sem abandonar a sua impassibilidade.

E terminei dizendo-lhe: «senhor chanceler, não vou brincar aos diplomatas porque o nosso problema não é um problema de diplomacia mas de moralidade. Se decidir agir, fica empenhado num dever moral. Se decidir abordar o debate em termos diplomáticos, será melhor que não nos tornemos a ver. Os Israelitas pedem mil milhões de dólares e eu pedi que esta soma fosse considerada como base de partida. O Sr. Mankenhorn disse-me que, segundo a vossa constituição, era completamente impossível. Respondi-lhe que não podia esperar porque o povo judeu está numa grande efervescência e na sua maioria opõe-se a todas as negociações susceptíveis de lavar os crimes da Alemanha. Mas agora que isto já é do seu conhecimento, sinto que você tem uma personalidade suficientemente forte para esquecer por um instante os rigores da vossa constituição – quando se trata de um tal assunto.».

Adenauer observou-me antes de responder: «Sr. Goldmann, nunca tive o prazer de o encontrar antes». E, de facto, tal teria sido possível porque ele tinha sido membro do comité pró-palestiniano antes de Hitler subir ao poder. «Você conhece-me à meia hora e devo dizer ao meu amigo Blankenhor, que, a quem eu conheço há tantos anos, - que você me compreende melhor do que ele. Queira passar ao escritório ao lado; vou-lhe enviar a minha secretária: dite-lhe a carta e eu assino-a».

Ditei a carta, à qual Adenauer introduziu uma única alteração; eu tinha escrito que os mil milhões de dólares seria «die Basis», a base, e ele substituiu esta palavra por «die Grundlage», o princípio, o que ia dar ao mesmo. E ele conclui a entrevista com estas palavras: «envie-me o Sr. Barou esta tarde; eu entregar-lhe-ei a carta assinada».

Nenhum outro homem de Estado teria ousado fazer semelhante coisa. Depois desta assinatura, ele teve grandes dificuldades com o seu gabinete que o censurou por se comportar como um ditador, de ter prometido estes mil milhões de dólares sem ter pedido a opinião de ninguém. Mas era Adenauer, um verdadeiro líder, e todos acabaram por aceitar. É muitas vezes assim que é necessário conduzir uma democracia. Esta conversa permaneceu durante muito tempo ignorada porque tínhamos decidido que, se os jornalistas tivessem vindo, ambos negaríamos que alguma vez nos tivéssemos encontrado. De resto, eu tinha feito bem em ter multiplicado as precauções e ter entrado no Claridge pela entrada de serviço, porque muitos sentiram que se passava alguma coisa e mesmo o Times falou em rumores.

Munido da carta, dirigi-me de seguida à Claims Conference onde o comité aprovou por unanimidade a abertura das negociações. Paralelamente, Ben Gourion enfrentou o Knesset onde a oposição vociferava contra os negociadores. A maioria dos líderes do Mapai, com excepção de Golda Meir e alguns outros, eram pelas negociações; os liberais também. Mas o Herut e o Mapam opunham-se a elas. Se Israel tivesse recusado, eu não teria podido negociar: era-me impossível arcar com tais responsabilidades. Finalmente, o knesset designou um grupo dirigido por Giora Josephtal e Felix Shinnar; Israel tinha então a sua delegação e o Claims a sua.

É sabido que as duas delegações negociaram cada uma por seu lado com a delegação alemã, à cabeça da qual se encontravam dois homens lendários: o eminente jurista Otto Küster e o professor Franz Boehm, que festejou recentemente o seu octogésimo aniversário. Ben Gourion disse um dia que, se Israel tivesse dez pessoas com a honestidade de Boehm, a vida nesse país seria melhor. É um exagero típico de Ben Gourion mas é verdade que Franz Boehm é um personagem verdadeiramente extraordinário moralmente e intelectualmente.

Os alemães discutiam então, de manhã, as indemnizações colectivas com a delegação israelita e, de tarde, os direitos do indivíduo com a delegação do Claims Conference. Quando surgia uma dificuldade, preveniam-me e eu ia resolver o assunto com Adenauer. As negociações desenrolavam-se perto de Haia, onde jamais capitulei. Duraram seis meses e não posso entrar aqui em detalhes: está a ser preparado um livro em três volumes!

Uma vez que Adenauer me entregou a famosa carta, tive de me encontrar, mais tarde, com o ministro alemão das finanças, Fritz Schaeffer. Este católico de direita, antinazi desde sempre, duma integridade total, foi um dos melhores ministros das Finanças que a Alemanha jamais teve. Disse-me logo: «Escute, meu caro Goldmann, você não pode exercer nenhuma chantagem sobre mim; nunca fui nazi e Hitler meteu-me na prisão. Isto dá-me liberdade para me opor a si, o que antigos nazis não ousariam fazer».

E continuou: «o que você pede é correctíssimo e tem todo o direito moral do mundo. Simplesmente, repare, não sou um moralista nem um rabi, mas o ministro das finanças de um país actualmente pobre. Portanto, como se diz em Yiddish [língua judaico-alemã], indique-me o valor final da soma [das indemnizações]. Quanto é que isso tudo custará?

- Ignoro ainda os pormenores», respondi-lhe. E era verdade: só os soube recentemente. Digo sempre que um presidente é um homem que assina um acordo mas que não o conhece. Eu sou um negociante por grosso e não tenho nenhuma paciência para examinar os parágrafos um a um. Schaeffer porém insistiu. «O nosso especialista Robinson, disse-lhe, calculou que o total andará pelos seis mil milhões de marcos.

- Mas os nossos especialistas chegaram ao valor de oito mil milhões de marcos e isso é demasiado», replicou.

Na realidade, a Alemanha pagou até hoje sessenta mil milhões de marcos e o total chegará a oitenta mil milhões – doze a catorze vezes mais do que nós tínhamos calculado na altura… não poderíamos portanto censurar os alemães por terem sido mesquinhos e de não terem cumprido as suas promessas. Pelo contrário, desde que as leis foram votadas, Schaeffer desbloqueou imediatamente os fundos e, em várias ocasiões, concedeu-nos mesmo adiantamentos – o que não era fácil, como testemunha uma anedota que vou contar.

A Alemanha tinha contraído dívidas colossais, herdadas tanto de Hitler como da República de Weimar. Para se reabilitar aos olhos do mundo e recomeçar a concluir os pagamentos, precisava primeiro de os fixar. Neste domínio, o director das negociações era o maior financeiro alemão: Hermann Abs. Director do Banco Central Alemão, discutiu ponto por ponto com os Aliados as modalidades de reembolso e defendia que a Alemanha não podia pagar senão uma pequena parte.

Tendo conhecimento das nossas próprias negociações com o governo alemão, Hermann Abs foi-se queixar a Adenauer: «No momento em que eu digo aos Aliados que estamos na bancarrota, o Sr. oferece milhões a Goldmann sem qualquer contrato jurídico. A minha situação é insustentável. Adie as negociações com os judeus para quando eu tiver terminado de negociar com os aliados». Adenauer aceitou a sugestão e enviou-me um recado por intermédio de Blankenhorn que me telefonou para que eu recebesse Abs em Londres.

Abs veio então explicar-se a sua posição: «Sr. Goldmann, aceitei as suas exigências em princípio. Entretanto, terá de esperar seis meses porque, se souberem das suas exigências, os Aliados vão-me fazer a vida difícil. Sugeri, portanto, ao chanceler que vos pague um adiantamento de duzentos ou trezentos milhões de marcos. Dentro de seis meses, poderão retomar as vossas negociações».

- Lamento, mas é impossível, respondi-lhe. Trata-se com efeito de um problema emocional. O povo judeu está agitado até ao fundo da sua alma. Não podemos meter esta questão no congelador e dizer às vítimas do nazismo: «Adiem a vossa agitação. Dentro de seis meses, podem recomeçar a protestar». Ou resolvemos o problema agora, ou não será resolvido jamais.»

Disseram-me mais tarde que Abs ficou muito agastado com a minha resposta, mas, alguns anos depois, ele chegou à conclusão que eu tinha razão. Tal não impedia que Adenauer já não soubesse o que havia de fazer: toda a indústria alemã e a alta finança eram contra as nossas reivindicações. Paralelamente, Shaeffer defendia que o governo de Israel aceitaria muito menos do que aquilo que eu pedia. De facto, ele conhecia a fundo o orçamento israelita que, na época, estava em falência total. Quando eu era presidente do Executivo sionista em Nova Iorque, o representante financeiro de Israel, Martin Rosenblueth, vinha muitas vezes a minha casa, cerca das dez horas da manhã, para me dizer: «Nahum, o que é que tu fazes tranquilamente sentado, quando os bancos fecham à uma da tarde e temos uma factura a pagar?»

Tinha então de telefonar «à pressa» às organizações sionistas para arranjar com urgência cem mil dólares. Schaeffer estava ao corrente desta situação e dizia-nos, tanto a Adenauer como a mim: «Como? Os Srs. Julgam que Israel recusaria metade ou mesmo um terço desta soma? Um país falido?» Estou a revelar isto aqui pela primeira vez: era ele que tinha razão.

Quando Adenauer nos informou finalmente que a Alemanha não nos podia oferecer nessa altura mais do que duzentos a trezentos milhões de marcos, escrevi-lhe uma carta para romper as negociações. Recebi um telegrama de Ben Gourion pedindo-me para o ir ver.

Quando cheguei a Israel ninguém podia descer do avião antes de mim e um automóvel esperava-me ao pé do aparelho para me levar directamente a casa de Ben Gourion que me repreendeu imediatamente: «Nahum, não sejas demasiado ambicioso. Disseram-me que tu conseguias obter imediatamente trezentos milhões de marcos. Israel pedia mil milhões mas tu conheces a situação…

- Escuta, Ben Gourion, respondi-lhe, se os alemães se ficarem pelos trezentos milhões, eu não assino. Mas, a ti, aconselhar-te-ia a assinar.

- Qual é a diferença entre ti e mim?

- É simples: eu represento o povo judeu, que é demasiado rico para o meu gosto. Tu representas um Estado em situação de falência. Eu posso permitir-me recusar; tu não o podes fazer...

- Desta maneira, tu serás o herói e eu o cobarde! Pois bem, já que tu não assinas, eu também não o faço.»

Depois, Ben Gourion perguntou-me qual era o meu mínimo. Respondi-lhe que com menos de quinhentos milhões de dólares, eu não aceitaria qualquer acordo, mas que esperava obter entre seiscentos a setecentos milhões. Acabei por obter finalmente três mil milhões de marcos, ou seja oitocentos e vinte e três milhões de dólares; partindo de uma base de mil milhões de dólares, receber 82% não se pode considerar um mau negócio [...].

Se David Ben Gourion e eu fomos muitas vezes adversários, foi essencialmente a propósito dos árabes. Quanto ao resto, sentíamo-nos muito próximos, e mesmo sobre a partilha da Palestina, desde as negociações com a Alemanha pós-nazi, ele ficou do meu lado. Na sua concepção fundamental do carácter do movimento sionista e do Estado de Israel, Ben Gourion estava completamente de acordo comigo; estávamos os dois convencidos de que se Israel se tornasse um Estado como os outros, não sobreviria

Nós tínhamos um amigo comum – um homem extraordinário que, se não tivesse morrido tão jovem, ter-se-ia tornado sem dúvida um Primeiro-ministro – que se chamava Giora Josephtal. Era um judeu alemão, pertencendo a uma família assimilada, que representava oficialmente Israel nas negociações com Adenauer. Depois disso, foi durante vários anos secretário geral do Mapai, o partido socialista israelita.

Membro do Executivo sionista, do qual eu era então presidente, Josephtal tinha uma grande ligação com Ben Gourion, que tinha por ele uma grande admiração, e ele queria a qualquer preço que eu fosse nomeado presidente do Movimento sionista mundial. Acabou por convencer Ben Gourion a influenciar-me.

Este último convidou-me um dia para me apressar a aceitar o lugar de presidente. Ao princípio fiquei muito surpreendido porque sabia que ele era bastante crítico em relação à organização sionista. «Ainda por cima, disse-lhe, nós temos tido conflitos públicos; não percebo portanto porque me estás a impelir em ir em frente. Não será uma jogada da tua parte?» Então, respondeu-me: «Vou-te pedir duas coisas. A primeira, é que me deixes falar vinte minutos sem me interromper; a segunda é que te vires para a parede: quero-te ver de costas

Julgando que ele tinha ficado louco, disse-lhe que não percebia onde é que ele queria chegar. Mas ele explicou-me: «Quero-te falar durante vinte minutos cara a cara, mais francamente do que alguma vez fiz, mas devo-te também elogiar bastante. Agora, tu já me conheces e sabes que eu não gosto de fazer elogios. Também te conheço e sei que não gostas disso. A situação será muito embaraçosa para os dois se tu estiveres a olhar para mim: portanto vira-te para a parede!»

Virei-me então para a parede, como um idiota, e ele falou acerca de mim durante vinte minutos. Eis o que era muito característico de Ben Gourion: este homem que podia ser muito violento, até mesmo cruel, era capaz deste tipo de gentilezas. Não posso relatar aqui todo o seu discurso mas, no geral, disse-me isto: «Tenho a certeza que no fundo do teu coração tens uma censura a fazer-me, e essa censura é justificada. Tivemos terríveis derrotas; seis milhões de judeus foram exterminados. Mas também obtivemos duas imensas vitórias históricas: a criação do Estado de Israel e as indemnizações da Alemanha. Sempre estive convencido que haveríamos de ter um Estado mas duvidei muito de receber um cêntimo dos Alemães. Tu és o arquitecto dessas indemnizações e nós em conjunto somos os arquitectos da partilha da Palestina e da criação de Israel. Aos dois triunfos da nossa geração, a tua contribuição foi essencial. Portanto, tens o direito de perguntar porque é que eu não te incumbo do problema que vai decidir o futuro do Estado de Israel: a paz com os árabes. Vou-te explicar as razões.

«Porque é que tu convenceste Acheson e os outros membros do Comité para a Palestina designados pelo presidente Truman? Porque tu és outro Acheson. Tu podias perfeitamente ter sido um secretário de Estado [ministro] americano, tens o mesmo talento, a mesma cultura, o mesmo charme e os mesmos dons de persuasão que Dean Acheson. Porque é que convenceste Adenauer, de quem te tornaste amigo, que ele tinha de dar indemnizações ao povo judeu? Porque tu és outro Adenauer, e podias ter-te tornado Chanceler da Alemanha. A estes homens, falaste de igual para igual porque vocês partilham as mesmas qualidades. Mas com os Árabes, que são bárbaros, todos os talentos não têm valor nenhum. Nem a tua cultura, nem o teu charme, nem a tua arte de persuasão teriam efeito sobre eles. Eles só compreendem a força, e a mão de ferro sou eu, não tu. É esta a explicação. Podes-te voltar para mim agora.

- Compreendo-te perfeitamente. Respondi-lhe, e penso mesmo que existe muita verdade naquilo que disseste. Nasser não é de facto nem Acheson nem Adenauer. Mas porque não utilizar desde logo a política da mão de ferro com luva de veludo? Tu serás a mão e eu serei a luva.

- O momento chegará certamente, reconheceu ele, em que te chamarei. Mas não ainda, não imediatamente…»

Nas minhas numerosas discussões com Ben Gourion, dizia-lhe que as nossas análises eram diferentes sobretudo porque eu estava persuadido que o tempo jogava contra Israel. Repeti-lhe uma centena de vezes: «Faz concessões, faz a paz o mais depressa possível porque a cada ano que passa as coisas tornam-se mais difíceis para nós. Chegará mesmo o momento em que os Árabes não quererão mais ouvir falar de paz, porque o tempo joga a favor deles.» Depois, a crise do petróleo fortaleceu ainda mais o meu argumento.

Mas Ben Gourion manteve as suas posições: «Ao contrário, dizia ele, a distância intelectual e tecnológica entre os Árabes e nós continuará a alargar-se.» E o seu outro leitmotiv [ideia dominante] era que a geração árabe que sofreu as derrotas da guerra de 1948-1949 e a guerra do Sinai não podia fazer a paz com Israel por razões psicológicas. Ele defendia que a geração seguinte teria provavelmente esquecido estas derrotas e, com elas, a vergonha e a humilhação que um pequeno povo infligiu aos exércitos árabes, dez vezes mais numerosos que o seu. Era naturalmente uma análise aberrante porque a nova geração árabe é mais patriota e extremista que a dos seus pais; ela é também menos corrupta [...].

Chaim Weizmann, que, já no fim da sua vida, detestava Ben Gourion ao ponto de se tornar seu inimigo, dizia-lhe: «Ben Gourion criará o Estado de Israel e depois irá arruiná-lo com a sua política.» E, se Israel continua a seguir os preceitos políticos de Ben Gourion, receio que Weizmann acabe por ter razão. Perguntei-me muitas vezes porque é que este homem inteligente, brilhante, que não era um provinciano como tantos dos líderes israelitas, que tinha uma perspectiva de homem de Estado, que um de Gaulle admirava, porque é que um tal homem não via que, sem um acordo com os Árabes, Israel não conheceria o futuro a longo prazo.

Só posso explicar esta atitude pelo seu carácter. Com efeito, pareceu-me muitas vezes que nos homens de Estado, o carácter é mais importante que a inteligência. Muitos deles compreendem com o seu cérebro o que é conveniente fazer, mas o seu carácter impede-os de o realizar. Este comportamento é típico de Ben Gourion; vou dar um exemplo que nunca esquecerei.

Um dia, ou antes, uma noite de 1956, tivemos uma conversa franca sobre o problema árabe. «Não compreendo o teu optimismo, disse-me Ben Gourion. Porque é que os Árabes haveriam de fazer a paz? Se eu fosse um líder árabe, jamais assinaria a paz com Israel. É normal, nós tomámos conta do seu país. É certo que Deus no-lo prometeu, mas o que é que isso lhes interessa? O nosso deus não é o deles. Nós somos originários de Israel, é verdade, mas isso foi há dois mil anos: o que é que eles têm a ver com isso? Houve o antisemitismo, os nazis, Hitler, Auschwitz, mas foi culpa deles? Eles não vêem senão uma coisa: nós chegámos e roubámos o seu país. Porque é que eles o iriam aceitar? Talvez eles o esqueçam numa ou duas gerações mas, por ora, não existe essa possibilidade. Portanto, é simples: devemos manter-nos fortes, ter um exército poderoso. Toda a política está aí. Doutra forma, os Árabes destruíam-nos.»

Fiquei perturbado com este pessimismo mas ele continuou: «Daqui a pouco terei setenta anos. E, Nahum, se me perguntares se quando eu morrer se serei enterrado num Estado judeu responder-te-ei que sim: dentro de dez anos, dentro de quinze anos, creio que ainda existirá um Estado judeu. Mas se me perguntares se o meu filho Amos, que fará cinquenta anos no fim deste ano, terá hipóteses de morrer e de ser enterrado num Estado judeu, responder-te-ei: cinquenta por cento.

- Mas enfim, interrompi-o, como é que tu consegues dormir com a ideia de uma tal perspectiva sendo Primeiro-ministro de Israel? Quem é que te disse que eu durmo?», respondeu-me simplesmente.

Este era o verdadeiro Ben Gourion: tinha-me dito tudo isto para me mostrar que, no seu espírito, Israel não podia existir sem a paz com os Árabes. Mas o seu carácter obstinado, agressivo, incapaz de fazer concessões impedia-o de seguir os conselhos da sua inteligência. A melhor prova é que uma vez afastado do poder, a inteligência retomou os seus direitos: ele tornou-se mesmo «goldmannista» declarando que era necessário entregar todos os territórios ocupados excepto Jerusalém. Neste ponto estou de acordo com ele: Israel devia manter Jerusalém. Tal não impede que em minha opinião Ben Gourion tenha sido o grande responsável da política anti-árabe […].

Ben Gourion teve sucessores e, entre eles, Golda Meir, que tinha os seus defeitos sem possuir a sua grandeza. Golda tem uma personalidade muito forte mas falta-lhe subtileza. A grande fraqueza dos intelectuais é que são demasiado intelectuais para serem fortes. O primitivismo dava-lhe a segurança e a força! Golda esteve sempre totalmente convencida que tinha razão […].

A propósito de Palestinianos, Golda teve sempre posições muito vincadas, em oposição às de Weizmann que dizia: «O conflito entre nós e os Palestinianos não é um conflito de direitos nem de justiça contra a injustiça. É um conflito entre dois direitos iguais.» Quanto a mim, penso que o nosso direito é superior porque a Palestina é para os judeus uma questão de vida ou de morte, enquanto que para os Árabes ela não representa senão 1% dos seus imensos territórios.

Mas Golda Meir não se atrapalhava com este tipo de subtilezas – o que explica por sua vez a sua autoridade e a sua completa ruína: durante os quatro em que foi Primeira-ministra, a política israelita não se alterou; a guerra do Kippour e o isolamento completo de Israel foram as consequências deste imobilismo.

Mais uma vez passámos ao lado da solução. O governo repetia que não era necessário fazer nenhuma concessão, manter um super-armamento, não dar aos Árabes a impressão que Israel era fraco e que tinha medo. Tudo deriva desta teoria: a aliança informal com os Estados Unidos, a hostilidade da União Soviética, o perigo de que esta jogasse a carta árabe, etc. Em política, nunca podemos ter a certeza mas tenho a impressão que em várias ocasiões podíamos ter obtido a paz.

Desde as negociações do primeiro armistício com o Egipto, a 24 de Fevereiro de 1949, em Rodes, alguns participantes israelitas afirmaram-me que podíamos ter transformado o armistício em paz verdadeira. Não sei dizer porque é que não estive presente mas, e disto estou seguro, nós perdemos uma nova ocasião em 1967, depois da vitória estrondosa israelita que pôs termo à guerra dos Seis-Dias. Dois dias antes do ataque, Levi Eshkol tinha declarado solenemente: «Não temos nenhuma ambição territorial.» Por isso, depois desta vitória miraculosa – sobre a qual Dayan me disse várias vezes que ele não conseguia explicar -, se Israel tivesse dito aos Árabes: «Assinem a paz amanhã, e nós entregamos-vos todos os territórios excepto Jerusalém», talvez tivesse havido paz. Muitos especialistas árabes confirmam hoje esta hipótese, mas as pessoas querem manter o que conquistaram; é assim a natureza humana. E esta falsa política que consiste em manter o status quo, o não mudar, que era a técnica preferida de Golda Meir, conduziu ao impasse de hoje.

Notem que em relação a este assunto eu culpo sobretudo os Estados Unidos da responsabilidade desta situação, antes mesmo de Israel. A guerra do Yom Kippour foi por culpa dos Americanos que, por razões de política interna (Nixon, os judeus americanos, a opinião anti-soviética) que não vou analisar aqui em detalhe, não fizeram nada durante anos. Quando tentaram alguma coisa, fizeram-no muito timidamente: os Israelitas sabotaram a missão Rogers bem como terminaram a missão Jarring. Acusaram-se então os Egípcios mas eu tive depois acesso a informações segundo as quais eles estavam prestes a negociar. Israel, não obstante, insistia em falar aos Árabes directamente, sem intermediário, exigindo negociações cara a cara – que teriam anulado uma das famosas «recusas de Cartum [capital do Sudão]» dos governos árabes – mas não tenho a certeza de que isso não seria senão um pretexto para não negociar de todo.
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