Jean-François Steiner nasceu em 1938 de pai judeu, que morreu em Treblinka, e de mãe católica. Segundo George Steiner, foi uma viagem a Israel e o mal-estar sentido pelos jovens judeus durante o julgamento de Adolf Eichmann pela passividade das vítimas do Holocausto, que levaram Jean-François Steiner a entrevistar um punhado de sobreviventes de Treblinka e a escrever uma exposição da revolta no campo de extermínio. O seu livro "Treblinka" foi primeiro publicado em França em 1966, e a tradução em inglês publicada no ano seguinte.
Simone de Beauvoir escreveu o prefácio do livro "Treblinka"
Simone de Beauvoir
A seguir, o parágrafo final do prefácio escrito por Simone de Beauvoir:
Simone de Beauvoir
A seguir, o parágrafo final do prefácio escrito por Simone de Beauvoir:
"O tom geral do livro é absolutamente singular: nem patético nem indignado, e sim de uma frieza calculada e às vezes mesmo de um sombrio humorismo. O horror é apresentado na sua banalidade quotidiana e quase como inevitável. Como uma voz que recusa as inflexões humanas, o autor descreve um mundo desumanizado; no entanto, é de homens que se trata; o leitor não o esquece e esse contraste provoca nele um escândalo intelectual mais profundo e mais durável do que qualquer emoção. O escândalo, entretanto, não passa de um recurso. Acima de tudo, Steiner, quis compreender e fazer compreender. Acreditamos que tenha atingido plenamente seu objectivo".
**********************
Jean-François Steiner descreve no seu livro o método empregue para fazer desaparecer os 800.000 ou mais cadáveres de Treblinka sem deixar rasto - (Steiner, Treblinka, editorial Gerhard Stalling Verlag, 1966, pág. 294 e seguintes):
"Era loiro e magro, possuía uma fisionomia amável, actuava de forma despretensiosa e chegou numa manhã luzidia ao portão do reino da morte. Chamava-se Herbert Floss e era especialista em cremação de cadáveres..."
"No dia seguinte construiu-se a primeira pira e Herbert Floss revelou o seu segredo: a composição da pira. Segundo explicou, nem todos os cadáveres se queimavam de maneira semelhante. Havia cadáveres bons e maus, incombustíveis e facilmente inflamáveis. A arte consistia em usar os bons para queimar os maus. Segundo as suas investigações – que obviamente eram muito avançadas – os cadáveres velhos ardiam melhor que os jovens, os gordos melhor que os fracos, as mulheres melhor do que os homens, e as crianças, não tão bem como as mulheres, mas melhor do que os homens. Donde resultava que os cadáveres de mulheres gordas eram os cadáveres ideais. Herbert Floss mandou separá-los a um lado assim como os dos homens e das crianças."
"Depois de terem sido desenterrados e classificados quase 1.000 cadáveres, começou-se a empilhá-los, colocando os de melhor material combustível em baixo e os de menor qualidade acima. Floss rejeitou os bidões de gasolina que lhe ofereceram e em seu lugar mandou trazer madeira. O seu trabalho devia ser perfeito. A lenha foi colocada debaixo da grelha da pira formando pequenos focos, tipo fogachos. A hora da verdade tinha chegado. Com solenidade foi-lhe entregue uma caixa de fósforos; ele debruçou-se, acendeu o primeiro foco seguido dos outros e entretanto a madeira começava a queimar-se paulatinamente. Floss, com o seu caminhar tão estranho, aproximou-se dos oficiais que esperavam a uma certa distância."
"As chamas cresciam mais e mais, lambendo os cadáveres, vacilando primeiro, mas depois lambendo com força. De repente, toda a pira ficou envolta em chamas que cresciam expulsando nuvens de fumo. Ouviu-se um crepitar intenso, os rostos dos mortos contraíam-se dolorosamente e a sua carne rebentava. Um espectáculo infernal. Por momentos, até os homens das SS ficaram como que petrificados, observando mudos o milagre. Herbert Floss estava radiante. A pira expelindo chamas era a experiência mais bonita da sua vida."
"Um tal acontecimento devia festejar-se. Trouxeram-se mesas que foram colocadas em frente da fogueira e caixas de garrafas de aguardente, cerveja e vinho. O dia estava a chegar ao fim e o céu estrelado parecia reflectir as chamas altas da fogueira, para lá do horizonte, onde o sol se punha com o esplendor de um incêndio."
"A um sinal de Lalka [o comandante do campo] saltaram as rolhas e começou uma festa fantástica. O primeiro brinde foi dedicado ao Führer. Os operários das escavadoras tinham regressado com as suas máquinas. Quando os homens das SS levantaram as taças aos gritos, as máquinas pareceram ganhar vida; com um movimento abrupto levantaram o braço de aço ao céu numa repentina e vibrante saudação hitleriana. Foi como um sinal. Dez vezes levantaram também os homens o braço fazendo ressoar de cada vez o «Sieg-Heil». As máquinas animadas respondiam às saudações dos homens-máquina e o ar retumbou de vivas ao Führer. A festa durou até que a fogueira se extinguiu. Depois dos brindes cantou-se; ouviram-se cantos selvagens e cruéis, cantos cheios de ódio, horripilantes, cantos em honra da Alemanha eterna."
Memorial em Treblinka formado de pedras de basalto recriando as fossas onde os corpos eram cremados
.
"Era loiro e magro, possuía uma fisionomia amável, actuava de forma despretensiosa e chegou numa manhã luzidia ao portão do reino da morte. Chamava-se Herbert Floss e era especialista em cremação de cadáveres..."
"No dia seguinte construiu-se a primeira pira e Herbert Floss revelou o seu segredo: a composição da pira. Segundo explicou, nem todos os cadáveres se queimavam de maneira semelhante. Havia cadáveres bons e maus, incombustíveis e facilmente inflamáveis. A arte consistia em usar os bons para queimar os maus. Segundo as suas investigações – que obviamente eram muito avançadas – os cadáveres velhos ardiam melhor que os jovens, os gordos melhor que os fracos, as mulheres melhor do que os homens, e as crianças, não tão bem como as mulheres, mas melhor do que os homens. Donde resultava que os cadáveres de mulheres gordas eram os cadáveres ideais. Herbert Floss mandou separá-los a um lado assim como os dos homens e das crianças."
"Depois de terem sido desenterrados e classificados quase 1.000 cadáveres, começou-se a empilhá-los, colocando os de melhor material combustível em baixo e os de menor qualidade acima. Floss rejeitou os bidões de gasolina que lhe ofereceram e em seu lugar mandou trazer madeira. O seu trabalho devia ser perfeito. A lenha foi colocada debaixo da grelha da pira formando pequenos focos, tipo fogachos. A hora da verdade tinha chegado. Com solenidade foi-lhe entregue uma caixa de fósforos; ele debruçou-se, acendeu o primeiro foco seguido dos outros e entretanto a madeira começava a queimar-se paulatinamente. Floss, com o seu caminhar tão estranho, aproximou-se dos oficiais que esperavam a uma certa distância."
"As chamas cresciam mais e mais, lambendo os cadáveres, vacilando primeiro, mas depois lambendo com força. De repente, toda a pira ficou envolta em chamas que cresciam expulsando nuvens de fumo. Ouviu-se um crepitar intenso, os rostos dos mortos contraíam-se dolorosamente e a sua carne rebentava. Um espectáculo infernal. Por momentos, até os homens das SS ficaram como que petrificados, observando mudos o milagre. Herbert Floss estava radiante. A pira expelindo chamas era a experiência mais bonita da sua vida."
"Um tal acontecimento devia festejar-se. Trouxeram-se mesas que foram colocadas em frente da fogueira e caixas de garrafas de aguardente, cerveja e vinho. O dia estava a chegar ao fim e o céu estrelado parecia reflectir as chamas altas da fogueira, para lá do horizonte, onde o sol se punha com o esplendor de um incêndio."
"A um sinal de Lalka [o comandante do campo] saltaram as rolhas e começou uma festa fantástica. O primeiro brinde foi dedicado ao Führer. Os operários das escavadoras tinham regressado com as suas máquinas. Quando os homens das SS levantaram as taças aos gritos, as máquinas pareceram ganhar vida; com um movimento abrupto levantaram o braço de aço ao céu numa repentina e vibrante saudação hitleriana. Foi como um sinal. Dez vezes levantaram também os homens o braço fazendo ressoar de cada vez o «Sieg-Heil». As máquinas animadas respondiam às saudações dos homens-máquina e o ar retumbou de vivas ao Führer. A festa durou até que a fogueira se extinguiu. Depois dos brindes cantou-se; ouviram-se cantos selvagens e cruéis, cantos cheios de ódio, horripilantes, cantos em honra da Alemanha eterna."
Memorial em Treblinka formado de pedras de basalto recriando as fossas onde os corpos eram cremados
.