terça-feira, março 08, 2005

Tête à tête avec João Pereira Coutinho (JPC)

Banho democrático



JPC - Mina, iraniana, 36 anos, casada, apareceu num tribunal de Teerão com um pedido bicudo: o divórcio. Não necessariamente por razões prosaicas e, atendendo à cultura, aceitáveis - tareias, humilhações, violações, etc. Mas porque o marido, segundo Mina, não toma banho há mais de um ano.

Sofocleto – Não sei o que será pior Mina. Se uma tareia prosaica, se uma tarde de paixão com um badalhoco. O italiano Rocco Butiglione, (“Um senhor” na opinião JPC e uma aposta, vetada, de Durão Barroso para a pasta da Justiça da Comissão Europeia), afirmou relativamente à protecção da família: quase sempre a mulher tem que sacrificar uma parte importante da sua carreira profissional. E, porque não o olfacto, pergunto eu?


JPC - Calma, Mina. Existem sinais de mudança na zona. Para começar, e depois das últimas eleições, o Afeganistão não parece mostrar grandes saudades da rapaziada simpática que gostava de fazer explodir estátuas em nome do Profeta.

Sofocleto – O Afeganistão não parece mostrar grandes saudades da rapaziada que tem controlado aquela merda nos últimos 150 anos. Falemos do período pós-talibã tão caro a JPC: Foi relatado a destruição por bombardeiros B-52 de aldeias «demasiado pequenas para aparecerem no mapa», com «talvez mais de 300 pessoas mortas» numa só noite. Numa família de quarenta, apenas um rapazinho e a sua avó sobreviveram, noticiou Richard Lloyd Parry, do Independent. Longe da vista das câmaras de televisão, «pelo menos 3767 civis foram mortos por bombardeiros americanos entre 7 de Outubro e 10 de Dezembro [...] uma média de sessenta e duas mortes de inocentes por dia», de acordo com um estudo; e isto, num país cujo último orçamento anual - no valor de 83 milhões de dólares - representa um décimo do custo de um bombardeiro B-528.


JPC - No Iraque, uma parte considerável da população apareceu nas urnas de dedo no ar.

Sofocleto - No Iraque, outra parte considerável da população aparece diariamente em urnas com membros no ar, fruto do «rigor mortis». Segundo o Guardian, depois da invasão, já terão morrido 100.000 civis iraquianos, na sua maior parte mulheres e crianças.


JPC - No Egipto, Hosni Mubarak, um simpático faraó que reina há vinte anos, chegou à conclusão que concorrer sozinho a eleições não tem grande piada; Hosni quer meninos para brincar.

Sofocleto – Querer, não queria. Mas que remédio. Os meninos Cheney, Rumsfeld, Rice e Wolfowitz são tão insinuantes. Têm brinquedos tão caros. Como não brincar com eles?


JPC - E no Líbano, a «rua» saiu à rua para denunciar o «paternalismo militar» sírio. Damasco, muito compreensivelmente, treme.

Sofocleto – A morte do Primeiro Ministro Libanês Rafik Hariri, imputada aos sírios, forneceu um excelente pretexto aos Estados Unidos e Israel para ameaçarem a Síria. Os media americanos e outros têm avançado argumentos violentos contra a Síria. Exploram a situação para atacar a Síria e implementar a sua agenda. O assassínio de Hariri serviu tudo menos a Síria. Nas semanas que se vão seguir, a “rua” abrigar-se-á em casa, temerosa do paternalismo militar americano, já testado com tanto êxito no Afeganistão e Iraque.


JPC - E até na Arábia Saudita já se comenta que as mulheres talvez tenham cérebro para votar.

Sofocleto – Onde quer que haja petróleo, a “democracia” não tardará, «Bush dixit». Mesmo com associados de longa data. É verdade meu pobre Fahd. Mesmo consigo.


JPC - Por outras palavras: um banho democrático vai escorrendo pelo Médio Oriente. Mérito do cobói texano que mora nas pradarias de Washington? Mistério.

Sofocleto - Por outras palavras ainda: um banho de sangue vai escorrendo pelo Médio Oriente. Mérito do cobói texano que mora nas pradarias de Washington? Sem dúvida.


JPC - Mas sabendo, como todos sabemos, que a turba iraniana não simpatiza particularmente com os «ayatollahs» locais, talvez o banho chegue ao Irão. E, com sorte, talvez Mina consiga enfiar o marido na rua. Ou, pelo menos, na banheira conjugal.

Sofocleto – Sabemos igualmente que a turba iraniana, e certas outras, inclusive europeias, russas e chinesas, não simpatizam particularmente com os «neoconservadores» do lado de lá do Atlântico. O banho talvez chegue ao Irão. Talvez chegue também a Israel. Talvez chegue a toda a parte. Neste cenário querida Mina, não vai precisar de dar banho ao seu marido. O duche é garantido.

2 comentários:

Anónimo disse...

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