quarta-feira, dezembro 13, 2017

Fará sentido continuar à procura de emprego quando a tecnologia o está a suprimir a ritmo acelerado?


Excerto de - UMA ESTRANHA DITADURA - de Viviane Forrester

«Que bem desejamos para nós?» Uma pergunta que deveríamos poder fazer permanentemente a nós próprios em vez de termos que nos perguntar incessantemente a que mal nos é mais urgente escapar. «Que bem desejamos para nós?» Pergunta proibida: seria bonito ver reclamar coisas supérfluas, ou mesmo uma norma favorável, ou uma travessia cativante e harmoniosa da existência, quando o indispensável se torna um género em vias de desaparecimento! Será razoável preocuparmo-nos com condições de trabalho ou de vida, quando é preciso procurar tanto, esfalfarmo-nos tanto para encontrar esses empregos impostos e recusados num mundo em que a sobrevivência depende deles, mas em que eles faltam?

Que bem desejamos para nós?» Deveria ser, no entanto, o embaraço da escolha a perturbar-nos. Este tempo da História, o nosso, detém uma capacidade até aqui desconhecida de se revelar benéfico para a maioria, precisamente graças às fabulosas novas tecnologias, capazes de oferecer abundantes possibilidades de escolha de vida, em vez de as esgotar.

Sem por isso nos perdermos na utopia nem sonharmos com um paraíso terrestre, seria possível hoje em dia imaginar que fossem permitidas vidas levadas de maneira inteligente e também mais divertidas que, libertas de tantos constrangimentos, encontrassem todas um sítio onde fossem bem-vindas! Temos meios para isso. Adquirimos os meios para isso. A nossa espécie adquiriu-os. Deixou-se extorquir por alguns que os atribuíram a si próprios ou os perverteram. Mas são recuperáveis.



Libertados pelas tecnologias da maioria das tarefas penosas, ingratas ou destituídas de sentido, todos poderíamos e deveríamos tornar-nos infinitamente mais disponíveis em oportunidades mais alargadas - e não, como actualmente, alargadas ao desemprego. Oportunidades de agir num mundo em que os dons, os gostos já não têm as mesmas razões para serem reprimidos, guardados para benefício de tarefas daqui em diante transferidas para as máquinas;, poderiam, finalmente, ser tidos em conta, ter pelo menos as suas possibilidades de desabrochar, ser dedicados a valores, a necessidades reais, sem ligação obrigatória à rentabilidade.

Hoje devia desenvolver-se como nunca a prática de misteres, de ofícios, de empregos indispensáveis, mas cuja penúria se torna paradoxalmente cada vez mais manifesta. A educação. gratuita e obrigatória, a democratização dos estudos, deram, no entanto, à maioria, a capacidade de os exercer. Elas prepararam para isso. Ora, vê-se por um lado esses empregos desaparecerem a uma velocidade vertiginosa, ou tornarem-se caricaturas de empregos, pagos com remunerações de gozo, enquanto, por: outro lado, os misteres e os ofícios são ignorados, automaticamente negligenciados, postos de lado sem terem sido tomados em consideração, condenados como luxos extravagantes, como caras velharias passadas de moda, armadilhas de prejuízo, de desperdício, o sumo da não rentabilidade. A prova concreta de que, fora dos caminhos da especulação, não há salvação possível.

É alucinante que nestes tempos de luta proclamada contra o desemprego e a favor do emprego, profissões inteiras, repita-se, tenham uma falta cruel de efectivos. A ponto de, por exemplo, liceais, estudantes, desçam à rua com os seus professores para reclamar em vão docentes em número aceitável, pessoal cuja necessidade é evidente e cuja falta é angustiante. Que resposta lhes é dada, expressa ou subentendida? Demasiado caro. Que ar daríamos em Bruxelas e noutros locais, «enfarpelados» com tais despesas públicas? E vá de continuar a suprimir lugares, a comprimir virtuosamente os efectivos. Ou, quando a contestação começa a provocar desordem, utilizar contratados a prazo impedindo-os de entrar no quadro, desencantar antigos professores não reciclados. Os quais terão todos em comum serem mal pagos, entregues à insegurança. Sorte a que estão destinados tantos desses estudantes que tentam escapar-lhe.

Será verdadeiramente razoável deixar a vida económica depender de lógicas tais que se possa - e até que «seja preciso», segundo os seus postulados! - deitar fora homens e mulheres como se fossem escovas de dentes gastas, a fim de aumentar a produtividade, em vez de rever o sistema que defende essas lógicas? Será necessário prosseguir o nosso regresso ao século XIX, exigir uma forma de sociedade obsoleta e retrógrada, em vez de adaptar o real às necessidades dos vivos?


1 comentário:

Anónimo disse...

Uma máquina pode fazer uma determinada função, mas os trabalhos da maioria das pessoas envolvem várias funções diferentes. Não se pode automatizar todas as tarefas com uma única máquina.