As contas dos últimos meses na France Télécom: 24 suicídios e 12 tentativas falhadas.
QUANDO O TRABALHO MATA
QUANDO O TRABALHO MATA
Fazer parte de uma empresa cotada nas principais bolsas de todo o mundo, com mais de 186 milhões de clientes em 30 países, poderia ser o sonho de qualquer trabalhador. Para o funcionário da France Télécom que, a 28 de Setembro, se atirou de uma ponte, na auto-estrada A41, na região da Alta Sabóia, não foi, todavia, mais que um pesadelo. Antes de pôr fim à própria vida, o homem de 51 anos, casado e pai de dois filhos, que trabalhava num call-center, em Annecy-le-Vieux, deixou no carro uma carta em que atribuía a culpa do seu acto ao ambiente profissional insuportável.
Pouco tempo antes, a 14 de Julho, o testemunho de um colega de Marselha, que também se suicidou, foi ainda mais corrosivo. Especialista em redes móveis e antigo maratonista, deixou claro que «a única causa» por detrás da sua morte foi o emprego na France Télécom.
Longe de serem pequenas ilhas num universo de 187 mil colaboradores (102 mil só em França), estes dois homens fazem parte de um arquipélago de angústia maior que estrangula grande parte dos quadros do terceiro maior operador móvel europeu. À semelhança do que aconteceu na também francesa Renault, os 24 casos verificados desde Fevereiro de 2008 obrigaram a France Télécom a recuar, no braço-de-ferro com os sindicatos, e a reconhecer a urgência de um plano que ponha água na fervura, a curto prazo, e permita fazer diferente, daqui em diante.
Os números, tomados isoladamente, podem ser enganadores. Uma resposta inequívoca à pergunta sobre o real aumento da taxa de suicídios na multinacional esbarra na ausência de estatísticas entre 2004 e 2007. Mas recuando até aos 22 casos registados em 2003 e aos 29 ocorridos no ano anterior, estes parecem não estar muito desfasados dos dados do último ano e meio. Porquê o grito de alerta só agora?
O drama humano, por si só, não explica que os acontecimentos na France Télécom tenham saltado para o centro da arena mediática, nem a consternação social e política que se fizeram sentir, nos últimos dias. Se assim fosse, não teriam passado praticamente incólumes os 22 mil postos de trabalho suprimidos entre 2006 e 2008 e a alarmante taxa de absentismo, por doença, que disparou para a média de um mês por cada funcionário.
Pouco tempo antes, a 14 de Julho, o testemunho de um colega de Marselha, que também se suicidou, foi ainda mais corrosivo. Especialista em redes móveis e antigo maratonista, deixou claro que «a única causa» por detrás da sua morte foi o emprego na France Télécom.
Longe de serem pequenas ilhas num universo de 187 mil colaboradores (102 mil só em França), estes dois homens fazem parte de um arquipélago de angústia maior que estrangula grande parte dos quadros do terceiro maior operador móvel europeu. À semelhança do que aconteceu na também francesa Renault, os 24 casos verificados desde Fevereiro de 2008 obrigaram a France Télécom a recuar, no braço-de-ferro com os sindicatos, e a reconhecer a urgência de um plano que ponha água na fervura, a curto prazo, e permita fazer diferente, daqui em diante.
Os números, tomados isoladamente, podem ser enganadores. Uma resposta inequívoca à pergunta sobre o real aumento da taxa de suicídios na multinacional esbarra na ausência de estatísticas entre 2004 e 2007. Mas recuando até aos 22 casos registados em 2003 e aos 29 ocorridos no ano anterior, estes parecem não estar muito desfasados dos dados do último ano e meio. Porquê o grito de alerta só agora?
O drama humano, por si só, não explica que os acontecimentos na France Télécom tenham saltado para o centro da arena mediática, nem a consternação social e política que se fizeram sentir, nos últimos dias. Se assim fosse, não teriam passado praticamente incólumes os 22 mil postos de trabalho suprimidos entre 2006 e 2008 e a alarmante taxa de absentismo, por doença, que disparou para a média de um mês por cada funcionário.
GESTÃO TERRORISTA
O que permanecia oculto, e que a onda de 24 suicídios e 12 tentativas falhadas dos últimos meses veio pôr a nu, foi a existência de um fio comum que liga todas estas mortes: uma «gestão pelo terror», nas palavras de um dos malogrados colaboradores, posta em marcha na telefónica francesa, desde a sua privatização, em 1997.
Anunciada em 1990, a entrada de capital privado na France Télécom e a sua exposição às leis da concorrência resultaram no abandono da cultura de serviço público. Em contrapartida, o culto da máxima rentabilidade sacrificou os recursos humanos da empresa que, desde 2002, se vêem forçados a mudar de posto todos os 27 meses e de local de trabalho de três em três anos. Os traba1hadores são, aliás, o elo mais fraco de uma cadeia que tem o Estado à cabeça, com uma posição no grupo, de 27 por cento. O Executivo francês privatizou a empresa, mas não pode alterar os estatutos de função pública de 65% do pessoal. O que, à partida, poderia parecer um trunfo para a maioria da força laboral da France Télécom, imune à ameaça do despedimento, tornou-se no seu calcanhar-de-aquiles. Para se tomar lucrativo, o gigante das telecomunicações teve de reduzir drasticamente a massa salarial, o que só tem vindo a ser alcançado pela saída dos funcionários, pelo seu próprio pé.
Funcionários da France France Télécom reunidos em memória de um colega que se suicidou em Julho último (AFP).
Quando as regalias financeiras para quem quisesse abandonar os quadros. se revelaram insuficientes, o passo seguinte foi declarar guerra aos assalariados que não estavam a acompanhar a evolução da empresa. Em seminários internos, os gestores foram mobilizados para uma estratégia de vigilância e humilhação constantes sobre os seus subordinados.
A precariedade e o assédio enredaram os trabalhadores numa espiral de sofrimento, mas bastarão para justificar que alguém ponha termo à vida? Segundo Marianne Lacomblez, coordenadora do Centro de Psicologia da Universidade do Porto, «cada pessoa tem em si uma dose de fragilidade psicológica, mas quando as condições de trabalho exigem que ultrapasse os seus limites, o seu estado de saúde, físico e psicológico, irá, inevitavelmente, sofrer um processo de degradação».
Anunciada em 1990, a entrada de capital privado na France Télécom e a sua exposição às leis da concorrência resultaram no abandono da cultura de serviço público. Em contrapartida, o culto da máxima rentabilidade sacrificou os recursos humanos da empresa que, desde 2002, se vêem forçados a mudar de posto todos os 27 meses e de local de trabalho de três em três anos. Os traba1hadores são, aliás, o elo mais fraco de uma cadeia que tem o Estado à cabeça, com uma posição no grupo, de 27 por cento. O Executivo francês privatizou a empresa, mas não pode alterar os estatutos de função pública de 65% do pessoal. O que, à partida, poderia parecer um trunfo para a maioria da força laboral da France Télécom, imune à ameaça do despedimento, tornou-se no seu calcanhar-de-aquiles. Para se tomar lucrativo, o gigante das telecomunicações teve de reduzir drasticamente a massa salarial, o que só tem vindo a ser alcançado pela saída dos funcionários, pelo seu próprio pé.
Funcionários da France France Télécom reunidos em memória de um colega que se suicidou em Julho último (AFP).
Quando as regalias financeiras para quem quisesse abandonar os quadros. se revelaram insuficientes, o passo seguinte foi declarar guerra aos assalariados que não estavam a acompanhar a evolução da empresa. Em seminários internos, os gestores foram mobilizados para uma estratégia de vigilância e humilhação constantes sobre os seus subordinados.
A precariedade e o assédio enredaram os trabalhadores numa espiral de sofrimento, mas bastarão para justificar que alguém ponha termo à vida? Segundo Marianne Lacomblez, coordenadora do Centro de Psicologia da Universidade do Porto, «cada pessoa tem em si uma dose de fragilidade psicológica, mas quando as condições de trabalho exigem que ultrapasse os seus limites, o seu estado de saúde, físico e psicológico, irá, inevitavelmente, sofrer um processo de degradação».
A RAIZ DO MAL
Questionada sobre a influência da política de mobilidade nos suicídios, a direcção da France Télécom começou por refutar uma responsabilidade institucional por estas mortes. Mas, encostado às cordas pelos meios de comunicação social, a opinião pública, os sindicatos e os partidos Socialista e Comunista franceses, que exigiram a sua demissão, o presidente-executivo Didier Lombard foi obrigado a retractar-se do modo atabalhoado como classificou os acontecimentos do Verão de «pequeno choque» ou «moda dos suicídios».
Desprezado por grande parte dos seus empregados, Lombard não é uma figura consensual, nem para o Governo. Depois de Christine Lagarde e Xavier Darcos, ministros da Economia e do Trabalho, terem dado um voto de confiança ao líder da operadora, Christian Estrosi, titular da pasta da Indústria, admitiu que considera Lombard «um pouco responsável» pelo sucedido.
No rescaldo da tragédia, há um inquérito a decorrer sobre as condições em que ocorreram as mortes e a satisfação dos trabalhadores e foi declarado o fim do princípio de mobilidade sistemática a cada três anos, para alívio de quem ainda está nas fileiras da France Télécom. Entretanto, o nº2 da companhia, Steophane Richard, ex-conselheiro da ministra francesa da Economia, não resistiu à polémica e apresentou a demissão. Mantém-se Lombard, olhado por muitos como a raiz dos problemas na empresa. O gestor enfrenta, agora, o desafio de, até 2011 - ano em que termina o seu mandato - criar um plano que, sem hipotecar a política de dividendos, tenha em conta o bem-estar de todos, dentro do grupo, para que a saúde financeira passe a ser sinónimo de saúde de quem trabalha.
No rescaldo da tragédia, há um inquérito a decorrer sobre as condições em que ocorreram as mortes e a satisfação dos trabalhadores e foi declarado o fim do princípio de mobilidade sistemática a cada três anos, para alívio de quem ainda está nas fileiras da France Télécom. Entretanto, o nº2 da companhia, Steophane Richard, ex-conselheiro da ministra francesa da Economia, não resistiu à polémica e apresentou a demissão. Mantém-se Lombard, olhado por muitos como a raiz dos problemas na empresa. O gestor enfrenta, agora, o desafio de, até 2011 - ano em que termina o seu mandato - criar um plano que, sem hipotecar a política de dividendos, tenha em conta o bem-estar de todos, dentro do grupo, para que a saúde financeira passe a ser sinónimo de saúde de quem trabalha.
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Comentário
A necessidade de um Thermidor na France Télécom
Comentário
A necessidade de um Thermidor na France Télécom
E assim, o funesto funcionário da France Télécom, colocado ao nível da mais miserável maquineta da empresa, feito girar de lugarejo para terriola como um pião demente, espiado, fiscalizado e controlado como se fora um ratoneiro, é conduzido ao desespero, à desorientação e ao suicídio, tudo em nome dos direitos divinos da máxima rentabilidade, sob a batuta assassina do presidente-executivo, Didier Lombard, o louvado «Guru da Gestão pelo Terror».
E por falar em Gestão de Terror, vale a pena lembrar o período da Revolução Francesa, no qual Robespierre, através do Tribunal Revolucionário, iniciou um período que ficou conhecido como "la Terreur" [o Terror], que consistiu no exercício de amplos poderes ditatoriais usados para instigar execuções em massa e purgas políticas.
A repressão acelerou em Junho e Julho de 1794, um período denominado "la Grande Terreur" [O Grande Terror], e acabou com o golpe de 9 de Thermidor (27/7/1794), na qual vários líderes do Reino do Terror foram guilhotinados, incluindo o seu principal responsável, Robespierre.
Pode acontecer que a desmedida apetência de Didier Lombard por "la Gestion du Terreur", tal como sucedeu a Robespierre duzentos anos antes, o leve a perder o discernimento e a cabeça...
E por falar em Gestão de Terror, vale a pena lembrar o período da Revolução Francesa, no qual Robespierre, através do Tribunal Revolucionário, iniciou um período que ficou conhecido como "la Terreur" [o Terror], que consistiu no exercício de amplos poderes ditatoriais usados para instigar execuções em massa e purgas políticas.
A repressão acelerou em Junho e Julho de 1794, um período denominado "la Grande Terreur" [O Grande Terror], e acabou com o golpe de 9 de Thermidor (27/7/1794), na qual vários líderes do Reino do Terror foram guilhotinados, incluindo o seu principal responsável, Robespierre.
Pode acontecer que a desmedida apetência de Didier Lombard por "la Gestion du Terreur", tal como sucedeu a Robespierre duzentos anos antes, o leve a perder o discernimento e a cabeça...
11 comentários:
Quando um patrão preside a um sistema de gestão tão brutal, e tem a ousadia de falar de "moda dos suicídios", só tem que ser despedido.
Uma empresa não é nada sem os seus empregados. Triturá-los e menosprezá-los a este ponto, não é gestão. Um dia, a France Telecom vai pagar isto bem caro.
Isto faz-me lembrar um "gestor" que conheci em tempos. A sua forma de optimizar era a seguinte: se Fulano levou 1 hora a fazer algo, e Sicrano levou 50 minutos, então o tempo de Sicrano passa a ser o mínimo aceitável. Abaixo disso, é insatisfatório.
E se depois Beltrano consegue em 45 minutos, também Sicrano se torna insatisfatório. E assim em diante.
O resultado não é difícl de adivinhar: às tantas, já ninguém era satisfatório, e mesmo bons desempenhos passaram a ser medíocres. O desfecho dessa empresa não foi famoso.
Infelizmente o sector de telecomunicações tem assistido a uma grande redução de lucros em todo o mundo nos últimos dez anos e portanto as margens caíram drasticamente.
Se acrescentarmos o facto de que a France Telecom está num dos mercados onde os tipos de benefícios no emprego que todos os empregados têm são insustentáveis, então percebe-se que a administração esteja sob pressão para fazer dinheiro.
Infelizmente isso está-se a reflectir hoje. Um novo modelo de negócios pode precisar de muito menos empregados com menos benefícios e o sistema francês de emprego torna isso quase impossível.
Vejam-se por exemplo os operadores na Índia, na China e em Singapura que se estão a sair muito bem com trabalho e equipamento relativamente barato.
Caro Diogo
Embora não tenha nada a ver com a sua publicação penso que é de interesse para todos.
Carlos
POR FAVOR, ISTO DIZ RESPEITO A TODOS NÓS! REENCAMINHEM PARA O MAIOR NÚMERO DE PESSOAS POSSÍVEL!
é preciso ultrapassar o 1.000.000 e ainda vai em 400.000
Levantamentos nas caixas ATM vai custar
1,50€
Os bancos preparam-se para nos cobrarem 1,50 Eur por cada levantamento nas caixas ATM.
Isto é, de cada vez que levantar o seu dinheiro com o seu cartão, o
banco vai almoçar à sua conta. Este 'imposto' (é mesmo uma
imposição, e unilateral) aumenta exponencialmente os lucros dos bancos, que
continuam a subir na razão directa da perda de poder de compra dos Portugueses.
Este é um assunto que interessa a todos os que não são banqueiros e não têm pais ricos.
Quem não estiver de acordo e quiser protestar, assine a petição e
reencaminhe a mensagem para o maior número de pessoas conhecidas.
www.petitiononline.com/bancatms
www.petitiononline.com/bancatms
DIVULGUEM ESTE EMAIL, P.F.
JÁ CHEGA DE SERMOS ROUBADOS PELA BANCA AO COBRO DA LEI.
JÁ SÓ FALTA UMA PETIÇÃO PARA MUDAR A LEI.
POR FAVOR, ISTO DIZ RESPEITO A TODOS NÓS! REENCAMINHEM PARA O MAIOR NÚMERO DE PESSOAS POSSÍVEL!
Esta teoria de gestão está muito espalhada e só surge na France telecom por causa da sua dimensão, que gera números absolutos muito grande; mas se formos olhar para as taxas de suicídio, atendendo ao grupo etário e situação laboral, ela é semelhante numa vasta área do globo.
Os nórdicos há muito, pelo menos há mais de 30 anos, que tentam construir teorias laborais muito diferentes; com algum sucesso.
Estes suicídios são o resultado da aplicação de ideias de gestão «simplórias»; a Humanidade tem de encontrar forma de se libertar das ideias simplórias; acho que o próximo post no outramargem vai mesmo ser sobre isso.
João, triturar e menosprezar os empregados não é gestão, é agressão.
Filipe, gostava de ouvir que esse gestor de que falaste (cuja empresa terá falido), fora um dos recentes infelizes empregados da France Telecom que se suicidara.
Lopes, caminhamos, então, para o trabalho barato e para a miséria de milhões...
Anónimo, se os bancos começarem a cobrar 1,5 euros para cada levantamento no multibanco, sugiro que se deite todo o tipo de porcaria na ranhura das máquinas para as encravar. E vai tudo aos balcões levantar dinheiro.
Alf, esta gestão simplória é assassina. Os responsáveis devem pagar por isso.
Diogo,
A guilhotina pode ser o fim para estes gestores do terror.
Para que no meio conhecam o terror de verdades paralelas.
Abraco,
Zorze
Florzinhas de estufa...
qualquer assalariado a recibos verdes sofre mais pressão que estas madonnas mal habituadas.
Diogo
è o neo-liberalismo ou para mim o capitalismo selvagem em todo o seu explendor só falta pedirem para cortar logo a jugular no momento do contrato
Beijos
Zorze, a guilhotina é apenas uma, entre muitas outras soluções.
Schwein Anonym, talvez os assalariados a recibos verdes se devam virar para o governo, e apurar a lâmina.
Ana, exacto. É um mundo cão. A resposta não se pode limitar a rosnar, deve morder até ao osso. Beijo.
Não percebo. então se se querem matar que levem com eles quem lhes fez o caminho... isso é que é ser o derradeiro ato inteligente!
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