quarta-feira, fevereiro 17, 2010

Antes, a previsão da rentabilidade do TGV era negativa na ordem dos -1.097,3 milhões de euros. Agora já é positiva e da ordem dos 383 milhões...


João Duque - Professor Catedrático do ISEG

Texto publicado na edição do Expresso de 6 de Fevereiro de 2010


Duques e cenas tristes

Meu caro António de Almeida, Que esta o vá encontrar de melhor saúde são os meus mais sinceros desejos.

Por cá tudo na mesma: cada vez menos duques, cada vez mais cenas tristes...

Ainda andamos às voltas com o Orçamento e com a novidade de que o programa de obras públicas foi, ou melhor, vai ser revisto, em particular o TGV. Porém, desde que reli o recente estudo sobre a Alta Velocidade (AV) que a RAVE publicou em Setembro passado, que acho que a medida recentemente anunciada não faz qualquer sentido. Vejamos. Nos estudos iniciais, a RAVE projectava um tráfego de 1,8 milhões passageiros, para o início de exploração da linha de AV entre Lisboa e Madrid, processados no troço entre Lisboa e o Caia. Mais tarde provou-se que, para a obtenção de um VAL [Valor Actual Líquido] positivo do investimento, o número mínimo de passageiros neste percurso no primeiro ano de operação da linha era de 6,7 milhões passageiros (só 3,6 vezes mais). Claro que agora a previsão da RAVE é a de uma procura de 6,7 milhões em 2015...

Antes, já se valorizava uma hora poupada por um passageiro numa deslocação entre Lisboa e o Caia em 11,93 euros. Agora, o novo estudo assenta num valor/ hora poupada em viagem na casa dos 26 euros... Antes, a previsão do Valor Actual Líquido do investimento, já depois de se considerarem todos os efeitos económicos e sociais directos e indirectos do projecto, era negativo e da ordem dos -1.097,3 milhões de euros. Agora já é positivo e da ordem dos 383 milhões... Antes, dizia-se que o projecto seria ruinoso para qualquer operador que tentasse explorar a linha, uma vez que a diferença entre as receitas recebidas e os pagamentos realizados era negativa e da ordem dos 6372 milhões de euros. Agora diz-se que com a "... separação entre a operação e a gestão das infra-estruturas verifica-se que um operador independente obteria uma rentabilidade financeira positiva".

Só o TGV paga metade da dívida pública e nem é preciso pôr o país a fazer mais nada!


Claro que hoje a TIR [taxa interna de rendibilidade] cresceu! Passou de negativa para os +5,75%, muito embora tenham esquecido que o Estado ainda exige uma taxa real de 4% e uma taxa de inflação de 2% que se deve colocar sobre aquela... (Pst! Dá mais de 6%, cuidado!...). Mas a delícia final é a estimativa feita no novo estudo para a receita fiscal. Então não é que "este estudo concluiu que, ao fim de 30 anos, a receita fiscal do Estado tenha, em termos acumulados, aumentado 63,6 mil milhões de euros"? Agarrem-me o ministro das Finanças e não o deixem beliscar um centímetro, arrancar uma cavilha que seja ao TGV! Estava eu e as agências de rating preocupados com o saldo da dívida pública portuguesa! É simples! Só o TGV paga metade da dívida pública directa actual, e a coisa é de tal ordem que quase nem é preciso pôr o país a fazer mais nada! Já reparou, António, como será bom? Pomos uns banquinhos ao longo da linha e ficamos a ver passar os comboios! Se tivessem um pouco mais de coragem, estou certo de que ainda seriam capazes de fazer melhor...
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10 comentários:

Zorze disse...

Em tempos a sigla TGV significava; Tequilla, Gin e Vodka. Mistura explosiva!
Este governo em que já ninguém acredita, principalmente, por um primeiro-ministro sem condições éticas de governabilidade, ainda vão insistindo nestes projectos de regime.

Juízo e vergonha na cara são campus zero na mente dos desgovernantes que vão desgovernado o País.

Abraço,
Zorze

Alfredo disse...

É a mais deslavada canalhice.
Vão afundar o país,enquanto os seus offshores transbordam de dinheiro sujo!
O falso engº é o supra sumus da vigarice descarada.
Ao que se ouve,o material a comprar à Alemanha para o TGV é contrapartida para a Sra Merkel aceitar o trafulha Constâncio para o BCE.
Onde vai isto parar????

Anónimo disse...

A estratégia deverá ser substituir o TGV por uma empresa de carroças puxadas por burros, porque embora não seja tão rápido o que se ganha em economia a todos os níveis compensa a velocidade. Tem a vantagem de ser ecológico, não gastar combustível fóssil e não ser necessário importar, assim como o material para fazer as carroças, os arreios será tudo produto Nacional. Tem ainda a vantagem de ser altamente atractivo para o turismo e vai fazer entrar mais uns milhares.

Carlos disse...

As previsões martelam-se a até darem aquilo que queremos.

Ana Camarra disse...

Diogo

Milhares de Espanhois já procuram bilhetes para o Poceirão, milhares de lisboetas compreendem agora que vai ser muito mais rápido ir a Badajoz comprar caramelos de pinhão, pratos de pirex e latas de melocoton...
Claro que vai ser rentável....não?!

beijos

Diogo disse...

Zorze – Isto não são desgorvernantes. Isto são ladrões a soldo dos bancos.


Alfredo – O PM e o Constâncio merecem choça para toda a vida.


Anónimo – E burros por aí não faltam, n’est pas mon chér?


Carlos – Eram certas cabeças que deviam ser marteladas até ficarem numa massa informe.

Diogo disse...

Ana – Vai ser a linha mais concorrida e badalada do mundo! Com praças de touros e casas de fado em todos os apeadeiros. Os bilhetes já estão todos vendidos até 2057. Beijo.

contradicoes disse...

Os projectos megalómanos
não se vão realizar
pois são muitos os incómodos
de quem os quer financiar

Alfredo disse...

Caro Contradições,espero que não.
Mas sei que há desenvolvimentos discretos em sentido contrário.
Esta gente sente-se dona de Portugal.
Estão impunes e acima da lei.Sabem que a escória dos outros partidos não vai levantar ondas.
Se recordar as posições de todos os outros partidos de esquerda,verá que são não só favoráveis ao ruinoso negócio,como são acérrimos defensores.
E não me parece que à direita haja muito interesse em obstacularizar.
Apenas manifestação titubiante de algum receio com as contas públicas,com o défice.
Isto,para mim,indicia que foram todos baptizados.É assim que os partidos são financiados.
A poderosa máquina de propaganda e desinformação mantém a maioria dominada.Jogam com a ignorância,a desinformação e o sentido de pertença que os partidos geram atávicamente nas pessoas,a maioria das quais nem tem ideologia,apenas tem noção do seu interesse imediato,ao estar encarneirado com os caciques locais e acabam sendo apascentados pelos pastores nacionais.

Filipe disse...

ALFREDO, subscrevo o seu comentário na íntegra.

A gamela está posta, e todos vão lá comer. Esquerda e Direita são conceitos ultrapassados, e esta suposta "democracia" não passa duma fantochada para tolos. Os fantoches vêm sempre dos mesmos lados: dos grandes grupos económicos, com a Banca à cabeça.

Votar seja em que partido for, dos que têm assento na AR, é apenas pactuar com este estado de coisas.