terça-feira, abril 20, 2010

A evolução tecnológica está a roubar os nossos empregos?



Texto de Martin Ford - Engenheiro informático de Silicon Valley e empresário.

[Tradução minha]


Desemprego devido à Robótica, à Inteligência Artificial e aos Computadores – Irão os Robots e as Máquinas roubar os nossos empregos? Poderá o trabalho da Automação Tecnológica Avançada causar Desemprego Estrutural?

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A situação do desemprego está a parecer cada vez mais aflitiva. Será possível que esteja a acontecer alguma coisa que ninguém quer reconhecer?

Não existem grandes dúvidas de que os computadores, as tecnologias robóticas e outras formas de trabalho automatizado têm vindo a tornar-se cada vez mais capazes e que à medida que esta tendência continua, mais trabalhadores têm a certeza de que serão substituídos pela máquina num futuro relativamente próximo. A maior parte dos economistas rejeitam qualquer preocupação de que isto possa conduzir a um desemprego estrutural a longo prazo. Correndo o risco de ser rotulado de "neo-Ludita," vou explorar este assunto em mais profundidade.


Wikipedia - [O Ludismo é o nome do movimento contrário à mecanização do trabalho trazida pela Revolução Industrial. Adaptado aos dias de hoje, o termo Ludita (do inglês Luddite) identifica toda a pessoa que se opõe à industrialização intensa ou a novas tecnologias. Os Luditas invadiram fábricas e destruíram máquinas, que, segundo eles, por aquelas serem mais eficientes que os homens, lhes tiravam os seus empregos. Os Luditas ficaram lembrados como "rebenta-máquinas".]


Julgo que existem fortes argumentos de que uma grande percentagem de empregos são, a um certo nível, essencialmente rotineiros e repetitivos por natureza. Por outras palavras, o trabalho pode ser dividido num conjunto discreto de tarefas que se tendem a repetir numa base regular. Parece provável que, à medida que o hardware e o software se continuarem a desenvolver, uma fracção cada vez maior deste tipo de trabalhos será, em última análise, susceptível de ser executado por máquinas ou software automatizado.


Garry Kasparov (à esquerda) versus o computador Deep Blue em 1997 - o Deep Blue venceu Garry Kasparov num confronto de seis partidas, com duas vitórias, três empates e uma derrota.


Não estou aqui a falar de tecnologia de ficção científica: trata-se de uma simples extrapolação dos sistemas especialistas e algoritmos específicos que podem actualmente fazer aterrar aviões comerciais, transaccionar autonomamente em Wall Street, ou vencer praticamente qualquer ser humano numa partida de xadrez. À medida que a tecnologia progride, penso que haverá poucas dúvidas de que estes sistemas vão começar a estar ao nível, ou a ultrapassar, a capacidade dos trabalhadores humanos em muitas categorias de trabalhos de rotina – e isto inclui muitos trabalhadores com graus académicos superiores ou outra formação significativa. Muitos trabalhadores serão também crescentemente ameaçados pela tendência contínua em direcção às tecnologias self-service [faça-você-mesmo] que transfere as tarefas para os consumidores.


O self-service no banco, na bomba de gasolina e no supermercado


Um dos exemplos históricos mais extremos da indução da perda de empregos devido à tecnologia foi, sem dúvida, a mecanização da agricultura. Por volta de 1800, cerca de três quartos dos trabalhadores nos Estados Unidos estavam empregados na agricultura. Hoje, esse valor ronda os 2 a 3 por cento. A evolução da tecnologia eliminou irreversivelmente milhões de empregos.


Em 200 anos a agricultura passou de 75% para 3% da população activa


Obviamente, quando a agricultura se mecanizou, não ficámos com desemprego estrutural a longo prazo. Os trabalhadores foram absorvidos por outras indústrias, e a média dos salários e a prosperidade global aumentou dramaticamente. A experiência histórica com a agricultura é, de facto, uma excelente ilustração da chamada "falácia Ludita." É a opinião – e penso que é geralmente aceite pelos economistas – de que o progresso tecnológico nunca conduzirá ao desemprego massivo a longo prazo.

Os motivos da falácia Ludita prendem-se normalmente com o seguinte: à medida que se aperfeiçoam as tecnologias que poupam trabalho, alguns trabalhadores perdem os seus trabalhos a curto prazo, mas, por outro lado, a produção também se torna mais eficiente. Isto conduz a preços mais baixos para os bens e serviços produzidos, o que, por seu turno, deixa os consumidores com mais dinheiro para gastar noutras coisas. Quando o fazem, a procura aumenta em quase todas as outras indústrias – e isso significa mais empregos. Isto parece ser exactamente o que aconteceu com a agricultura: o preço dos alimentos desceu à medida que eficiência produtiva aumentava, e então os consumidores puderam gastar o dinheiro extra noutras coisas, conduzindo ao aumento de emprego na manufactura e no sector dos serviços.

A questão que devemos colocar é se o mesmo cenário se vai continuar a repetir. O problema é que desta vez não estamos a falar da automação de apenas uma indústria: estas tecnologias vão penetrar em todos os processos produtivos. Quando se mecanizou a agricultura, existiam claramente outros sectores de trabalho intensivo capazes de absorver os trabalhadores. Mas há poucas evidências que seja esse o caso hoje em dia.


A Automação Industrial tornará o desemprego estrutural inevitável


Parece-me que, à medida que automação vai penetrando em todo o lado, chegará um ponto de viragem, a partir do qual a economia no seu conjunto não será suficientemente intensiva para continuar a absorver os trabalhadores que perdem os seus trabalhos devido à automação. A partir desse ponto, os empresários serão capazes de aumentar a sua produção sobretudo pelo emprego de máquinas e software – e então o desemprego estrutural tornar-se-á inevitável.

Se chegarmos a esse ponto, então penso que também teremos um sério problema com a procura dos consumidores. Se a automação é inexorável, então o mecanismo básico que coloca o poder de compra nas mãos dos consumidores começa a desintegrar-se. A título de experiência, vamos imaginar uma economia completamente automatizada. Praticamente ninguém conseguiria arranjar um emprego (ou um rendimento); as máquinas fariam tudo. Portanto, donde viria o consumo? Se se estivesse a considerar uma economia de mercado (em vez de economia planificada), porque é que se continuaria a produzir se não existissem consumidores viáveis para comprar o resultado da produção? Muito antes de chegarmos a esse extremo de total automação, tornar-se-ia perfeitamente claro que os modelos do mercado de massas ficariam insustentáveis.

Uma das coisas que me preocupa mais neste cenário é a influência potencial da psicologia do consumidor. Se num determinado momento no futuro os consumidores se aperceberem que os empregos estão a ser implacavelmente automatizados, e se reconhecerem que mais educação ou treino serão inúteis, haverá muito provavelmente um impacto negativo significativo na atitude do consumidor e nas suas opções de despesas. Se qualquer dia entrarmos num círculo vicioso induzido pelo medo da automação, pode suceder um cenário muito negro. É difícil ver como é que as políticas tradicionais como o estímulo ao consumo ou cortes nos impostos poderiam ter algum efeito porque não se destinariam a resolver as preocupações de consumidores com a continuidade dos seus rendimentos a longo prazo

A maior parte dos economistas provavelmente objectará a estes argumentos como sendo especulativos e carentes de dados objectivos. Julgo que se olharmos para as questões como a estagnação ou o declínio dos salários médios dos trabalhadores, para a desigualdade crescente dos rendimentos, para a produtividade acrescida, e para o consumo baseado em dívida em vez de no rendimento, encontrar-se-ão seguramente provas que geralmente sugerem que nos estamos a aproximar do ponto de viragem, no qual o desemprego se irá tornar num problema. Contudo, parece improvável que uma análise econométrica dos dados passados possam oferecer um apoio claro a esta teoria – e se alguma vez o fizer, será já demasiado tarde.


O Desemprego virá a ser um problema do passado?


Questiono-me sobre a sabedoria da ênfase extrema na análise dos dados quantitativos que parecem caracterizar a economia. Devemos pilotar o barco focando exclusivamente os nossos binóculos no sentido da rota que temos vindo a trilhar? Pode muito bem existir um iceberg no caminho…


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Conclusão (minha)

A tecnologia está a destruir, a uma velocidade exponencial, os empregos. Sem assalariados não há poder de compra. Sem compras, não há vendas nem lucros. Sem lucros não há capitalismo. O paradigma económico tem de mudar rápida e drasticamente.
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11 comentários:

Anónimo disse...

A deslocalização das empresas + a livre circulação de capitais (sobretudo ilícitos) + os esquemas Ponzi = (deu no que deu) economia (bullshit) virtual.
Claro que a evolução/produção tecnológica "mudou-se" de armas e bagagens para a Ásia/Oriente.
Enfim, Europa e EUA nada mais fazem do que formar a juventude para o desemprego!

Diogo disse...

Anónimo - a evolução/produção tecnológica não se mudou de armas e bagagens para a Ásia/Oriente.

Aliás, a evolução/produção tecnológica vai estoirar com a industrialização baseada na escravatura da Ásia/Oriente.

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Hoje comprei o livro de Martin Ford (em PDF) que refiro no post. Quem estiver interessado, envio-lho.

Carlos Marques disse...

A automação está em vias de criar um colapso económico. Se o objectivo da automação é substituir as pessoas no trabalho e se o capitalismo requer pessoas que trabalhem para obterem aquilo que precisam para viver, então, quando as pessoas já não puderem competir com as máquinas vão ter de escolher entre desistir da automação ou do capitalismo.

A automação não vai desaparecer, portanto vamos ter pelo menos de remodelar o capitalismo. Acredito que estamos a caminhar para uma situação em cada pessoa seja possuidora de uma parte do valor das máquinas, dos recursos materiais e da energia, de maneira que todos possam ter um rendimento deles. Devemo-nos assegurar que ninguém fica de fora porque o rendimento do trabalho não vai estar disponível num futuro altamente automatizado.

Não vamos esperar pelo final da transição antes de nos prepararmos para o futuro. Um grande número de pessoas já estão a sofrer com a incompatibilidade entre a automação e a necessidade de trabalho do capitalismo actual.

xatoo disse...

cá-ca-rá-cá-cá!
http://fx.worth1000.com/all-sizes/581016/robo-chicken/medium

Diogo disse...

Xatoo, continuas a viver em finais do século XIX. Apostas na vitória dos trabalhadores precisamente quando estes (e os patrões) estão a desaparecer.

xatoo disse...

ainda que assim fosse, devo continuar mais perto da realidade que os clones do Daniel24 que o Houellebecq romanceou no séculoXXIV

Aníbal Meireles disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Aníbal Meireles disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Aníbal Meireles disse...

Aproveito, nesta primeira visita proveitosa, para lhe dar os parabéns pelo blog, mas também para discordar aqui neste post que me chamou a atenção:

Tudo o que disse inicialmente sobre a impossibilidade de permancer uma situação de desemprego a longo prazo com a introdução de novas tecnologias e maquinarias parece-me certo e advém da experiência que a humanidade foi coleccionando, mas depois chega ao "agora" e parece perder a objectividade e a perspectiva histórica e desaba no dito pessimismo ludita que tão bem trouxe à discussão.

Há inúmeros exemplos que podia citar para demonstrar que a tese de que o automatismo vai retirar os empregos a ponto de implicar uma reformulação do paradigma económico, está errada, mas cito apenas dois.

(Atenção, não digo que não seja desejável fazer uns ajustes - de monta - de equidade no paradigma, mas não é certamente por culpa da tecnologia que os ajustes são necessários.)

Primeiro, a tecnologia, como reflexo do progresso da sabedoria humana que é, permite-nos unicamente continuar a seguir em frente. Tenho a ideia que até foi o ministro da agricultura que mencionou isto noutro dia, e, embora patusco, o exemplo é verdadeiro: das carroças puxadas por bois ou burros passámos para os veículos a motor e deixou de exisitr a necessidade de ter uma indústria de carroças e criações tão grandes de burros e bois, e alimentação para os ditos, e toda a logística que isso implica, mas passou a haver a necessidade de mecânicos e oficinas e toda uma indústria à volta - óleo para o motor, filtros, pastilhas de travões, petróleo(!), escolas de condução, instrutores, fábricas que produzem semáforos e sinalética de trânsito, entre muitas outras, e, além disso, não foi por isso que deixou de haver uma pessoa a comandar os destinos da carroça, ou do automóvel.

Ou seja, além das indústrias ligadas ao desenvolvimento da tecnologia, haverá sempre emprego para o motorista. E digo isto tanto no sentido literal como metafórico. Se pudesse resumir diria: quem é que repara a máquina que repara a máquina se não houver máquina para reparar a máquina ? Há sempre o criador da máquina.

Pergunte-se porque é que ainda hoje, com todos os computadores, as linhas de metro e comboio são vigiadas por humanos e as carruagens são "conduzidas" por humanos. Em bom rigor podia ir sem tripulação - aquilo vai sobre carris, o que é que aquilo tem de difícil para um computador ? Nada. Mas se as coisas correm mal ao computador, tem de lá estar alguém para tomar uma decisão, reagir, activar o meio mecânico, à moda antiga, para nos salvar a nós todos. Ou pura e simplesmente para tomar uma decisão que "sai do sistema", e que se inclui na esfera da política.

Os clubes de vídeo, tema recente da actualidade, por exemplo, estão condenados a deixar de existir. Mas agora há empregos na indústria da fibra óptica, dos computadores, na indústria dos conteúdos digitais, online, etc. Outro caso: há 50 anos não havia jogos de computador. Hoje já quase não se fabricam piões de madeira, mas há uma indústria fulgurante de jogos, programadores, criadores de arte digital, fabricantes de placas gráficas, etc

Aníbal Meireles disse...

Segundo, a própria indústria da tecnologia cria empregos: quem é que desenvolve continuamente as máquinas que nos facilitam a vida (e ao mesmo tempo revelam novas possibilidades de progredir, ou seja, novas complicações, fazendo o ciclo de inovações continuar e com isso novas necessidades de mão-de-obra especializada), seja na agricultura, nas pescas, na aviação, na confeccção têxtil, na alimentação, nas comunicações, no entertenimento, etc? Quem é que as comercializa, distribui, repara, dá assistência técnica e comercial ?

As máquinas ? As máquinas não têm o imaginário humano. Poderia conjecturar aqui um cenário em que sim, mas eu sou péssimo a fazer futurologia; contudo uma certeza tenho: no dia em que isso acontecer, nós cá estaremos para ter uma ideia melhor (ou seja, não acredito nada que as máquinas venham a ter o nosso imaginário). Afinal somos nós que criamos as máquinas e as aperfeiçoamos.

Mas acima de tudo, acreditar que a tecnologia nos vai roubar os empregos é acreditar que quando esse dia chegar, o ser humano e tudo o que nos rodeia chegou ao limite da transformação, da evolução, da criatividade. E isso é negar toda a história que temos para trás e toda a lógica que subjaz à existência "tout court". É a criação ultrapassar o criador, em todos os sentidos. E isso é uma subversão da lógica impossível, no meu entender.

Felizmente, (penso que) está enganado.

Anónimo disse...

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