quinta-feira, setembro 22, 2005

Um exército que já não faz seeeentido nenhum!


Parte de um artigo de Saldanha Sanches no Expresso, edição 1716, com o qual concordo na totalidade.

A união sagrada dos militares

(...)

Mas se há comportamento que desafia explicação é o dos militares. Com sargentos e oficiais na praça pública numa espécie de união sagrada contra a redução da despesa pública.

Vamos falar claro: eles deviam ter percebido já que a sua principal diferença em relação aos demais funcionários públicos (dos quais falam com indisfarçável desprezo) é a sua completa inutilidade.

Existem porque existem, por tradição e por inércia.

A única coisa que o país espera deles é que vão arranjando umas centenas de homens para missões na Bósnia ou em Timor.

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Tirando essas excursões periódicas, o que resta são alguns milhares de sargentos, coronéis e generais que desde o fim da guerra colonial têm tido um interessante comportamento estratégico: como conseguir o máximo rendimento com o mínimo esforço.

O conceito estratégico de defesa nacional tem tido um sem-número de expressões: pensões de valor militar acumuláveis com o vencimento, reconstituição das carreiras prejudicadas com o 25 de Abril, redução da idade de passagem à reserva e à reforma e outras prebendas.

Uma defesa intransigente não diremos da pátria (contra quem?), mas da barriga.

O irracionalismo do comportamento militar é que, com a sua insurreição disfarçada de defesa de direitos fundamentais como a liberdade de manifestação, estão a dar uma esplêndida oportunidade ao Governo.

(...)

Mas na tropa, o que faz parar o Governo? Se os chefes militares nem conseguem deter a indisciplina, para que servem as Forças Armadas?

Se Portugal for atacado (hipótese académica) só começam a combater depois de negociar um novo contrato colectivo de trabalho? Mas se está comprovado que no modelo actual não servem para nada, por que não começar a pensar como se podem gastar aqueles milhões de euros (ou já agora menos) de forma mais útil para o país?

O que é que poderia fazer o sector da Defesa, inteiramente reorganizado e reestruturado para a defesa das nossas riquezas marítimas (sem fragas nem submarinos), para a tutela do território e defesa da floresta (sem quartéis nas cidades) ou mesmo para a investigação científica ligada às indústrias da defesa e às novas formas da guerra?

Por que não mandar aquela gente para casa (eles só vão deixar de se manifestar quando se convencerem que o emprego está em risco), reduzir as despesas de funcionamento e começar a estudar o novo modelo de Forças Armadas. Com menos sargentos e muito menos generais.

Não porque a crise das Forças Armadas seja um exclusivo das Forças Armadas. Se elas deixam de ter disciplina é porque já não são Forças Armadas. A sua dissolução como corpo funcional é um dos principais sintomas de que alguma coisa chegou ao fim.

Os velhos modelos estão esgotados.

Temos sempre a possibilidade de procurar alguma coisa nova ou deixar que tudo se vá arrastando sem mudar nada. Mesmo que isso seja uma espécie de afundamento colectivo.