terça-feira, janeiro 27, 2009

Uma bolha infectada no pé, ou antes, experiências médicas nazis, salvaram a vida a um rabino em Auschwitz


Num post de 9/10/2007 com o título «Os sobreviventes do Holocausto», coloquei um trecho que fazia parte de uma entrevista ao rabino Israel Rosenfeld, publicada no jornal Intermountain Jewish News de 4 de Fevereiro de 2005. Esta entrevista foi apagada da Internet.


Eis o trecho do post:

«O rabino Israel Rosenfeld falou pela primeira vez da sua experiência em Auschwitz ao jornal Intermountain Jewish News, a 27 de Janeiro de 2005, exactamente 60 anos depois do dia em que foi libertado de Auschwitz:

... o trabalho duro, combinado com tudo o resto, conjugaram-se para fazer de Rosenfeld um jovem muito doente. Uma bolha não tratada no pé cresceu e piorou até que se tornou numa infecção debilitante na parte de trás da perna. Por fim, já não podia estar de pé, e muito menos andar, diz ele, enquanto levanta a perna das calças para mostrar a cicatriz deixada pela infecção de há seis décadas atrás. Na altura, a meio do Inverno de 1944-45, foi colocado na enfermaria de Auschwitz, incapaz de trabalhar. Isto provavelmente salvou-lhe a jovem vida

[... the hard work, combined with everything else, combined to make young Israel very sick. An untreated blister on his foot steadily grew worse until it became a debilitating infection on the back of his leg. Eventually, he could no longer stand, let alone walk, he says, lifting his pant leg to show the still-vivid scar left behind by the raging infection of six decades ago. By then, it was the middle of the winter of 1944-45, and he was placed in the Auschwitz infirmary, unable to work. It probably saved the youth's life.]



Contudo, dois anos depois:

Em Fevereiro de 2007, o rabino Israel Rosenfeld contou a um grupo de sete jovens uma versão substancialmente diferente sobre a causa do mal que lhe tolhera a perna em Auschwitz:

«O rabino Rosenfeld contou como sobreviveu miraculosamente ao campo de concentração, embora tenha depois passado três meses num hospital incapaz de estar de pé ou caminhar, porque as pernas tinham sofrido cortes fruto das experiências médicas a que os nazis o submeteram

[Rabbi Rosenfeld spoke about how he miraculously survived the concentration camp, although afterwards he spent three months in a hospital unable to stand or walk, his legs having been cut up by the Nazis performing medical experiments on him.]



Vale a pena ler o artigo do Intermountain Jewish News:

O mundo recorda a libertação de Auschwitz

Por CHRIS LEPPEK, Editor Assistente do IJN (Intermountain Jewish News) - 4/2/2005

(Tradução minha)

Sessenta anos, até hoje, 27 de Janeiro de 2005, foi o tempo que levou para que o rabino Israel Rosenfeld viesse a público falar do tempo que passou em Auschwitz.

Rosenfeld recusou todas as oportunidades anteriores para falar disso publicamente, recusando mesmo, polidamente, uma entrevista à Shoah Visual History Foundation [Fundação de História Visual do Holocausto]. Na mesma linha, nunca leu uma palavra escrita por Elie Wiesel ou qualquer outro autor que escrevesse sobre o Holocausto, nem nunca viu um único fotograma do filme «A Lista de Schindler» ou de qualquer outro filme desse tipo.

"Hoje, é a primeira vez que estou a falar acerca disso," disse o rabino Rosenfeld ao Intermountain Jewish News a 27 de Janeiro de 2005, exactamente 60 anos depois do dia da sua libertação de Auschwitz. Em 25 anos na Hillel Academy – 16 dos quais como director – e em ocupações subsequentes, e como autor de livros encomendados pela Torah Umesorah, o rabino Rosenfeld ganhou a reputação de um educador dedicado e talentoso, como um homem nobre e atencioso – mas não como um homem de sofrimento.

Rosenfeld nasceu em 1928 na província da Carpátia na parte oriental da então Checoslováquia. A região era habitada então por cerca de 100,000 judeus, "a maior parte camponeses pobres, madeireiros, lenhadores – a maior parte piedosos, pessoas religiosas, mas não muito letrados," diz ele.

O seu pai David estudou durante uma década judaísmo hassídico. O resto da família incluía a sua mãe Chana, a irmã mais velha Leah e o seu irmão mais novo Yoel.

Em Maio de 1944, na cidade de Chust onde viviam muitos dos cerca de 100,000 judeus da região, Rosenfeld, a sua família e muitos judeus foram colocados a bordo de carruagens de comboio para gado. O seu destino era uma pequena cidade polaca de nome Oswiecim, próxima de um lugar a que os alemães chamavam Auschwitz.

Rosenfeld lembra-se que saíram cerca do meio-dia de quinta-feira de Chust e chegaram a Auschwitz ao meio-dia de Sábado. Afirma que se lembra muito pouco do pesadelo que foi a viagem.

"Claro que foi quando chegámos a Auschwitz que os verdadeiros problemas começaram," afirma o rabino numa voz que se torna sombria. Lembra-se de chicotes, guardas, cães, comandos berrados, gritos e tiros.

A sua família foi quase imediatamente separada – "não segundo um esquema, mas caoticamente" – mas o rabino Rosenfeld e o seu pai conseguiram ficar juntos. Ele lembra-se de passar pelo imponente e infame portão principal de Auschwitz, próximo do qual Josef Mengele fazia o seu trabalho de escolha, mas ele não se lembra pessoalmente do arqui-nazi, nem dos seus infames comandos "para a esquerda" e "para a direita".

"Quero que perceba que eu vinha directamente do seminário rabínico," diz Rosenfeld. "O meu conhecimento das coisas do mundo era nulo. Eu não fazia ideia de quem eram os SS ou a Gestapo. Tudo o que soube foi que o meu pai me agarrou pela mão e levou-me para fora dali. Se não o tivesse feito, eu teria provavelmente terminado também noutro lugar."

Estes primeiros momentos caóticos foram a última vez que Rosenfeld viu a sua mãe e irmã por um longo período de tempo e a última vez em que viu o seu irmão mais pequeno. Essa lembrança, talvez mais do que tudo o resto, ainda persegue o rabino Rosenfeld.

"Nunca mais voltei a ver o meu irmão mais novo," diz, sem sequer tentar resistir às lágrimas. "Não posso descrever os meus pensamentos aterrorizados, os meus pesadelos, o meu irmãozinho, o que é que ele deve ter sentido quando o gás o alcançou, não sabendo que os seus pais eram impotentes para o salvar. Uma criancinha inocente."

Rosenfeld sonhou com isto todas as noites durante um quarto de século, diz, e ainda sente o fenómeno ilógico e poderoso conhecido por «culpa de sobrevivente» - "perguntando como é que eu sobrevivi e eles não."

Rosenfeld, contudo, tinha ainda o seu pai. Foram ambos destacados para unidades de trabalho, ou comandos, e viviam na mesma secção do complexo de Auschwitz mas em barracões diferentes. Estavam juntos sempre que havia oportunidade.

"Estávamos no mesmo campo. Ele viu-me sofrer. Eu vi-o sofrer. Chorámos juntos." Lembra-se do seu pai rezar nos barracões e dar ao seu filho a sua ração de pão. "Éramos muito, muito chegados," diz o rabino em lágrimas.

Durante os meses que passaram em Auschwitz, pai e filho trabalhavam normalmente em diferentes projectos, principalmente cavando fundações e carregando cimento para novos edifícios. O primeiro saco de cimento que o rabino Rosenberg carregou, pesando cerca de 50 quilos, deixou-o estendido no chão. Um alemão disse-lhe: "Não mereces o pão que comes," um aviso claro.

Mas outros prisioneiros ajudaram o jovem dando-lhe como trabalho empilhar os sacos, em vez de carregar com eles. Mesmo assim, o trabalho duro, combinado com tudo o resto, conjugaram-se para fazer de Rosenfeld um jovem muito doente. Uma bolha não tratada no pé cresceu e piorou até se tornar numa infecção debilitante na parte de trás da perna. Por fim, já não podia estar de pé, e muito menos andar, diz ele, enquanto levanta a perna das calças para mostrar a cicatriz deixada pela infecção de há seis décadas atrás.

Na altura, a meio do Inverno de 1944-45, foi colocado na enfermaria de Auschwitz, incapaz de trabalhar. Isto provavelmente salvou-lhe a jovem vida.

O Exército Vermelho Soviético estava a aproximar-se de Auschwitz e os alemães, desejosos de manter a sua população de escravos, esvaziaram virtualmente Auschwitz da sua população prisional, conduzindo-a numa marcha forçada para ocidente. Abandonando o resto do campo, deixaram apenas para trás as várias centenas de prisioneiros na enfermaria, incluindo o rabino Rosenfeld. O pai do rabino foi levado na marcha forçada para Buchenwald, onde, segundo Rosenfeld, foi morto a uma semana da libertação do campo.

Os últimos dias em Auschwitz são ainda confusos para o rabino Rosenfeld, que os vivenciou próximo da morte por causa da infecção e da febre.

Vieram aviões e metralharam o complexo, incluindo a enfermaria, diz Rosenfeld. Hoje, ainda não tem a certeza se eram aviões aliados ou do eixo. Sabe apenas que um homem da sua cidade natal o tirou da enfermaria, porque as balas tinham pegado fogo ao edifício. Mas estava a nevar e frio, e o fogo apagou-se rapidamente, e assim puderam voltar para dentro.

Muitos doentes morreram no ataque e no incêndio. Mais tarde, aqueles que sobreviveram foram procurar sob as almofadas dos mortos, esperando encontrar um pedaço de pão escondido.

O campo foi abandonado durante 10 dias enquanto os combates continuavam furiosamente à volta dele. "Havia tiroteio por todos os lados," afirma o rabino Rosenfeld. "Os canhões estavam a disparar. Aviões."

Na manhã do dia 27 de Janeiro de 1945, tudo estava acabado. O primeiro tanque russo entrou.

Rosenfeld afirma que nessa altura pesava 22 quilos. "Às vezes ouve-se o cliché pele e osso. Eu era só pele e osso." Rosenfeld foi parar a um hospital da Cruz Vermelha em Oswiecim, onde lhe fizeram várias operações para recuperar o uso da perna.

Foram precisos vários meses de recuperação dolorosa e uma série de viagens frustrantes e cansativas através da Europa para localizar a sua mãe e irmã, tendo ambas sobrevivido às provações.

Encontrando a sua casa em Chust ocupada por uma família cigana, a reduzida família Rosenfeld foi finalmente acomodada pelo governo checo na região dos sudetas, da qual milhões de alemães tinham acabado de ser expulsos [in the Sudeten region, from which millions of Germans had just been ousted].

Rosenfeld estudou num seminário rabínico e um professor do colégio ajudou-o e à sua família a emigrar para a América e finalmente tornar-se um professor judeu.

"Se eu sinto ódio? Sim, sinto. Por quem? Na verdade não sei. Todo o mundo esteve envolvido. O que é que aconteceu? A humanidade foi-se abaixo."



O texto deste artigo que foi apagado na Internet ficou gravado no disco. O original pode ser visto nas seguintes imagens (clicar para ampliar):







2 comentários:

xatoo disse...

ontem fui à Cinemateca ver uma sessão de propaganda (disfarçada) sobre a Conferência de Wannsee. A maneira como a patranha da "solução final" está montada é uma coisa absolutamente inacreditável. Mas aprende-se sempre. (ver o m/ post de hoje) Uma das minhas últimas conclusões a que cheguei é que existem mesmo provas que Israel é filho da Alemanha Nazi. Não é de estranhar o uso dos mesmos métodos do uso do condicionamento feito em campos de concentração como o de Gaza.
Agora também dizem que não assassinam por inanição prisional; que só se defendem. Como sugere o próprio nome do exército Sionista de Israel IDF (em vez de Tsahal) Antes defendiam-se do Comunismo, actualmente defendem-se do Comunismo (isto é, da participação social e de uma maior igualdade a nivel económico: "de cada um segundo as suas possibilidades, a cada um segundo as suas necessidades" é uma bandeira imortal)
a Luta continua!

Anónimo disse...

A idade tolda a memória.