A carismática Lagarde (na foto com uma barba de três dias)
Christine Lagarde, dona de um corpo atlético e de um rosto que uma natureza madrasta não quis favorecer, costuma optar por guarda-roupas em tom pastel e é amante das grifes francesas. Christine é facilmente vista com bolsas Hermès, sapatos Louboutin, vestidos e tweeds Chanel, e é cliente habitual da Dior.
A directora do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde tem um rendimento anual de 380 889 euros [323 257 euros de salário, ao qual acrescem as despesas de representação no valor de 57 889 euros], ou seja, 31 740 euros mensais. O seu estatuto de funcionária internacional permite-lhe não pagar impostos nenhuns.
Guardian: Quando analisa as contas gregas e exige medidas que sabe podem significar que as mulheres não terão acesso à assistência no parto, que os doentes deixam de poder aceder a medicamentos que lhes salvam a vida, e que os idosos vão morrer sozinhos por falta de cuidados - deixa de pensar em tudo isso e concentra-se nas contas?
Christine Lagarde: Não, penso sobretudo nas crianças da escola de uma pequena aldeia no Níger, que apenas têm duas horas de escola por dia e que partilham, cada três, uma cadeira, felizes por estar a aprender. Tenho-as no meu pensamento o tempo todo. Porque acho que elas precisam ainda mais do que as pessoas em Atenas. [...] Sabe que mais? No que diz respeito a Atenas, eu também penso naquelas pessoas que estão sempre a tentar fugir aos impostos.
Guardian: E pensa mais nesses do que naqueles que estão a lutar pela sua sobrevivência, sem emprego nem serviços públicos?
Christine Lagarde: Penso em todos por igual. E acho também que todos têm que se ajudar colectivamente. [...] Pagando os seus impostos. Sim.
Guardian: E os filhos deles, que não podem ser responsabilizados?
Christine Lagarde: Bem, os pais deles são responsáveis, certo? Por isso devem pagar os seus impostos.
Crianças gregas com fome
Comentário
Christine Lagarde, quando confrontada com a situação que a instituição para a qual trabalha, o FMI, criou na Grécia, utilizou inteligentemente o problema escolar das crianças no Níger para relativizar o drama social e humano em que a Grécia se encontra.
Evidentemente que se Christine Lagarde fosse confrontada pelo Guardian sobre o problema escolar das crianças no Níger, a directora do Fundo Monetário Internacional relativizaria provavelmente desta maneira:
Guardian: Quando analisa as contas nigerianas e exige medidas que sabe poderem significar que as crianças desse país, embora felizes por aprender, podem ter de reduzir o período de aulas para apenas meia-hora por dia e que os bancos da escola vão ter de ser presumivelmente partilhados por oito alunos - deixa de pensar em tudo isso e concentra-se nas contas?
Christine Lagarde: Não, penso sobretudo nas crianças-soldado que lutam em guerras e conflitos armados no Uganda, na Libéria, na República Democrática do Congo e no Sudão, e cuja vida é dura e perigosa, pois precisam de transportar explosivos e aprender a manejar pistolas, espingardas e metralhadoras. Penso também nas meninas desses países que frequentemente são obrigadas a satisfazer os desejos sexuais de soldados nos acampamentos. Penso nos miúdos que são obrigados, sob pena de morte, a assassinar amigos e membros da própria família. Penso nos garotos a serem doutrinadas para matar e obedecer sob a influência de drogas e bebida alcoólica. Tenho-os no meu pensamento o tempo todo, porque acho que eles precisam ainda mais do que as crianças do Níger. [...] E sabe que mais? No que diz respeito ao Níger, eu também penso naquelas pessoas que estão sempre a tentar fugir aos impostos.
Guardian: E pensa mais nessas pessoas do Níger que estão sempre a tentar fugir aos impostos, do que nos miúdos nigerianos que estão a lutar por mais horas de aulas e por bancos mais compridos ou carteiras individuais?
Christine Lagarde: Penso em todos por igual. E acho também que todos têm que se ajudar colectivamente. [...] Pagando os seus impostos. Sim.
Guardian: E os filhos desses pais nigerianos, que não podem ser responsabilizados?
Christine Lagarde: Bem, os pais deles são responsáveis, certo? Por isso devem pagar os seus impostos.
Jovem aluno do Níger numa sala de aula sem quaisquer condições
E se a entrevista se prolongasse e Christine Lagarde fosse confrontada pelo Guardian sobre o problema das crianças-soldado que lutam em guerras e conflitos armados no Uganda, na Libéria, na República Democrática do Congo e no Sudão, a mulher-homem Lagarde talvez abordasse o assunto da seguinte forma:
Guardian: Quando analisa as contas do Uganda, da Libéria, da República Democrática do Congo e do Sudão e exige medidas que sabe poderem significar que as crianças-soldado desses países tivessem de matar, não apenas os amigos e a família mais chegada, mas fossem também obrigados a assassinar as famílias desses amigos e sua própria família mais alargada (primos em 3º grau, tios-avós, sobrinhos afastados, etc.), - deixa de pensar em tudo isso e concentra-se nas contas?
Christine Lagarde: Não, partindo do princípio que existiu de facto um holocausto judeu, e estou bastante inclinada a acreditar nisso, penso sobretudo nas crianças judias que foram levadas directamente para as câmaras de gás. Tenho-as no meu pensamento o tempo todo. Porque acho que elas precisavam ainda mais do que as crianças-soldado do Uganda, da Libéria, da República Democrática do Congo e do Sudão. [...] Sabe que mais? No que diz respeito ao Uganda, à Libéria, à República Democrática do Congo e ao Sudão, eu também penso naquelas pessoas que estão sempre a tentar fugir aos impostos.
Guardian: E pensa mais nessas pessoas do Uganda, da Libéria, da República Democrática do Congo e do Sudão que estão sempre a tentar fugir aos impostos, do que nas crianças-soldado que estão a lutar por deixar de ser escravos sexuais e assassinos e a tentar levar uma infância normal?
Christine Lagarde: Penso em todos por igual. E acho também que todos têm que se ajudar colectivamente. [...] Pagando os seus impostos. Sim.
Guardian: E os filhos desses pais ugandeses, liberianos, congoleses e sudaneses, que não podem ser responsabilizados?
Christine Lagarde: Bem, os pais deles são responsáveis, certo? Por isso devem pagar os seus impostos.
Criança-soldado algures no Uganda, na Libéria, no Congo ou no Sudão
E a entrevista a madame Lagarde poderia continuar indefinidamente...