O valor da informação
A informação deve estar associada a um valor social, ou simplesmente valer por si mesma? A questão, que parece académica, tem, nestes dias, especial pertinência
A revista francesa ‘Paris Match’ chocou parte da opinião pública do seu país com uma reportagem que quase todos os jornalistas considerariam, «a priori», um grande «scoop»: entrevistou os guerrilheiros talibãs que há cerca de três semanas mataram, numa emboscada, 10 soldados franceses, além de ferir 21. Os guerrilheiros, que se deixaram fotografar com os rostos encobertos por lenços, nas fotos das páginas da revista vestem fardas dos soldados mortos e ostentam objectos pessoais dos militares assassinados.
Naturalmente, as famílias dos soldados mortos reagiram emotivamente. E o ministro francês da Defesa, Hervé Morin, disse qualquer coisa como ‘é na retaguarda que a guerra corre pior, pois é aí que órgãos de comunicação promovem os nossos inimigos’.
A questão é pertinente. Até à guerra do Vietname, onde havia batalhas, existia censura militar. Hoje, embora ela continue infelizmente a existir sob certas condições, é praticamente impossível fazê-la. E isso, sendo óptimo, deve obrigar a uma responsabilidade acrescida para a informação.
A guerra deixou de ser um clássico embate de exércitos. Agora, as batalhas ganham-se e perdem-se na opinião pública, na frente da comunicação.
Assim sendo, não pode a comunicação social continuar a agir como se não fosse ela própria arma de guerra. Os mesmos motivos éticos que levaram - com bons resultados - a que não fossem relatados raptos em certos países da América Latina, justamente para não os incentivar, deverão levar os editores dos órgãos de comunicação a pensar maduramente no modo de enfrentar as realidades modernas da guerra.
O valor da comunicação livre é inestimável, mas não pode ser infinito. Como para tudo, há que criar regras.
O Editor do Expresso não poderia estar mais de acordo com o Professor canadiano Michel Chossudovsky: «a comunicação social é ela própria uma arma de guerra».
Texto de Michel Chossudovsky, professor de Economia na Universidade de Ottawa:
Os arquitectos militares do Pentágono estão perfeitamente conscientes do papel central da propaganda de guerra. Engendrada pelo Pentágono, pelo Departamento de Estado e pela CIA, já foi lançada uma Campanha de medo e desinformação [fear and disinformation campaign (FDC)] . A distorção grosseira da verdade e a manipulação sistemática de todas as fontes de informação constituem uma parte integral da estratégia de guerra. Em consequência do 11 de Setembro, o secretário da Defesa Donald Rumsfeld criou o Gabinete de Influência Estratégia [Office of Strategic Influence (OSI)] , ou Gabinete de Desinformação" ["Office of Desinformation"] como foi rotulado pelos seus críticos:
"O Departamento da Defesa afirmou ter necessidade de fazer isso, e estavam realmente a caminho de espalhar histórias falsas em países estrangeiros — num esforço para influenciar a opinião pública por todo o mundo. (Entrevista com Steve Adubato, Fox News, 26 Dezembro de 2002.)
Para sustentar a agenda de guerra, estas "realidades fabricadas", canalizadas numa base diária para o interior das cadeias noticiosas devem tornar-se verdades indeléveis, tornando-se parte de um vasto consenso político e dos meios de comunicação. Desta forma, os media corporativos - embora actuando independentemente do aparelho militar de informações - são um instrumento desta evolução totalitária do regime.
Trabalhando em ligação com o Pentágono, Charlotte Beers, uma figura poderosa na indústria da publicidade, foi nomeado para chefe da unidade de propaganda do Departamento de Estado logo após o 11 de Setembro. O seu mandato é "para actuar contra o anti-americanismo no exterior" (Sunday Times, Londres 5 de Janeiro de 2003). O seu gabinete no Departamento de Estado destina-se a:
"assegurar que a diplomacia pública (cativar, informar e influenciar audiências públicas internacionais) seja praticada em harmonia com os negócios públicos (estendendo-se a americanos) e com a diplomacia tradicional para promover os interesses e a segurança dos EUA e proporcionar a base moral para a liderança americana no mundo".
A componente mais poderosa da Campanha de Medo e Desinformação (FDI) pertence à CIA, a qual secretamente subsidia autores, jornalistas e críticos por intermédio de uma rede de fundações privadas e organizações patrocinadas pela CIA.
A desinformação é rotineiramente "espalhada" pelos operacionais da CIA nas redacções do principais diários, revistas e canais de TV. Firmas de relações públicas externas são frequentemente utilizadas para criar "falsas histórias". Isso foi cuidadosamente documentado por Chaim Kupferbert em relação aos acontecimentos do 11 de Setembro.
Iniciativas de desinformação encoberta, sob os auspícios da CIA, também são canalizadas através de vários "procuradores" de informação noutros países. Desde o 11 de Setembro essas iniciativas resultaram numa disseminação diária de informação falsa referente a alegados "ataques terroristas".
Comentário:
Basta passar os olhos pelos artigos semanais do Monjardino, do Cutileiro, do Espada, do Coutinho, do Monteiro e de outros para concordarmos imediatamente com o editor de Expresso e com Chossudovsky: «a comunicação social, Jornal Expresso incluído, é ela própria uma arma de guerra». E é esta perspectiva que os leitores do jornal nunca devem perder de vista. Estas armas de guerra vomitam interminavelmente propaganda, desinformação, mentira, manipulação, medo e ódio.
O Paris Match ao entrevistar e mostrar as fotos dos talibãs que mataram, numa emboscada, 10 soldados franceses e os fotografaram com as fardas e com os objectos pessoais dos soldados mortos, pretende unicamente incitar o cólera da população francesa para a tornar mais maleável a uma maior intervenção militar da França e a uma cooperação mais estreita com o governo americano no envio de mais tropas para o Afeganistão (Obama Quer Mais Tropas no Afeganistão).
A manipulação mediática começa a ser tão transparente…
.
A revista francesa ‘Paris Match’ chocou parte da opinião pública do seu país com uma reportagem que quase todos os jornalistas considerariam, «a priori», um grande «scoop»: entrevistou os guerrilheiros talibãs que há cerca de três semanas mataram, numa emboscada, 10 soldados franceses, além de ferir 21. Os guerrilheiros, que se deixaram fotografar com os rostos encobertos por lenços, nas fotos das páginas da revista vestem fardas dos soldados mortos e ostentam objectos pessoais dos militares assassinados.
Naturalmente, as famílias dos soldados mortos reagiram emotivamente. E o ministro francês da Defesa, Hervé Morin, disse qualquer coisa como ‘é na retaguarda que a guerra corre pior, pois é aí que órgãos de comunicação promovem os nossos inimigos’.
A questão é pertinente. Até à guerra do Vietname, onde havia batalhas, existia censura militar. Hoje, embora ela continue infelizmente a existir sob certas condições, é praticamente impossível fazê-la. E isso, sendo óptimo, deve obrigar a uma responsabilidade acrescida para a informação.
A guerra deixou de ser um clássico embate de exércitos. Agora, as batalhas ganham-se e perdem-se na opinião pública, na frente da comunicação.
Assim sendo, não pode a comunicação social continuar a agir como se não fosse ela própria arma de guerra. Os mesmos motivos éticos que levaram - com bons resultados - a que não fossem relatados raptos em certos países da América Latina, justamente para não os incentivar, deverão levar os editores dos órgãos de comunicação a pensar maduramente no modo de enfrentar as realidades modernas da guerra.
O valor da comunicação livre é inestimável, mas não pode ser infinito. Como para tudo, há que criar regras.
O Editor do Expresso não poderia estar mais de acordo com o Professor canadiano Michel Chossudovsky: «a comunicação social é ela própria uma arma de guerra».
Texto de Michel Chossudovsky, professor de Economia na Universidade de Ottawa:
Os arquitectos militares do Pentágono estão perfeitamente conscientes do papel central da propaganda de guerra. Engendrada pelo Pentágono, pelo Departamento de Estado e pela CIA, já foi lançada uma Campanha de medo e desinformação [fear and disinformation campaign (FDC)] . A distorção grosseira da verdade e a manipulação sistemática de todas as fontes de informação constituem uma parte integral da estratégia de guerra. Em consequência do 11 de Setembro, o secretário da Defesa Donald Rumsfeld criou o Gabinete de Influência Estratégia [Office of Strategic Influence (OSI)] , ou Gabinete de Desinformação" ["Office of Desinformation"] como foi rotulado pelos seus críticos:
"O Departamento da Defesa afirmou ter necessidade de fazer isso, e estavam realmente a caminho de espalhar histórias falsas em países estrangeiros — num esforço para influenciar a opinião pública por todo o mundo. (Entrevista com Steve Adubato, Fox News, 26 Dezembro de 2002.)
Para sustentar a agenda de guerra, estas "realidades fabricadas", canalizadas numa base diária para o interior das cadeias noticiosas devem tornar-se verdades indeléveis, tornando-se parte de um vasto consenso político e dos meios de comunicação. Desta forma, os media corporativos - embora actuando independentemente do aparelho militar de informações - são um instrumento desta evolução totalitária do regime.
Trabalhando em ligação com o Pentágono, Charlotte Beers, uma figura poderosa na indústria da publicidade, foi nomeado para chefe da unidade de propaganda do Departamento de Estado logo após o 11 de Setembro. O seu mandato é "para actuar contra o anti-americanismo no exterior" (Sunday Times, Londres 5 de Janeiro de 2003). O seu gabinete no Departamento de Estado destina-se a:
"assegurar que a diplomacia pública (cativar, informar e influenciar audiências públicas internacionais) seja praticada em harmonia com os negócios públicos (estendendo-se a americanos) e com a diplomacia tradicional para promover os interesses e a segurança dos EUA e proporcionar a base moral para a liderança americana no mundo".
A componente mais poderosa da Campanha de Medo e Desinformação (FDI) pertence à CIA, a qual secretamente subsidia autores, jornalistas e críticos por intermédio de uma rede de fundações privadas e organizações patrocinadas pela CIA.
A desinformação é rotineiramente "espalhada" pelos operacionais da CIA nas redacções do principais diários, revistas e canais de TV. Firmas de relações públicas externas são frequentemente utilizadas para criar "falsas histórias". Isso foi cuidadosamente documentado por Chaim Kupferbert em relação aos acontecimentos do 11 de Setembro.
Iniciativas de desinformação encoberta, sob os auspícios da CIA, também são canalizadas através de vários "procuradores" de informação noutros países. Desde o 11 de Setembro essas iniciativas resultaram numa disseminação diária de informação falsa referente a alegados "ataques terroristas".
Comentário:
Basta passar os olhos pelos artigos semanais do Monjardino, do Cutileiro, do Espada, do Coutinho, do Monteiro e de outros para concordarmos imediatamente com o editor de Expresso e com Chossudovsky: «a comunicação social, Jornal Expresso incluído, é ela própria uma arma de guerra». E é esta perspectiva que os leitores do jornal nunca devem perder de vista. Estas armas de guerra vomitam interminavelmente propaganda, desinformação, mentira, manipulação, medo e ódio.
O Paris Match ao entrevistar e mostrar as fotos dos talibãs que mataram, numa emboscada, 10 soldados franceses e os fotografaram com as fardas e com os objectos pessoais dos soldados mortos, pretende unicamente incitar o cólera da população francesa para a tornar mais maleável a uma maior intervenção militar da França e a uma cooperação mais estreita com o governo americano no envio de mais tropas para o Afeganistão (Obama Quer Mais Tropas no Afeganistão).
A manipulação mediática começa a ser tão transparente…
.
10 comentários:
Pois agora queriam controlar melhor a informação. Ainda mais? Não acham que é abuso?
Aos jornalistas cumpre informar, com rigor e, sobretudo, com verdade.
Por vezes a verdade doí. É o preço a pagar pela inteligência e boa formação de caracter de um povo. Para carneirada, já basta o Status Quo.
E resta saber (sabe-se, pois é quase uma certeza) se a foto foi encenada, não com talibãs, mas com soldados franceses ou pessoal dos serviços secretos a fazer de talibãs «para o boneco». Quando a «gestão da mentira» chega ao ponto a que chegou, isto é o mais provável.
Por isso não leio jornais. Ou seja, informo-me.
Carlos Portugal,
Exactamente. Concordo em absoluto consigo. Eu apostava que a sessão das fotografias foi encenada. Não acrescentei essa opinião ao post para não o tornar demasiado "paranóico".
a diferença da terminologia entre o Match e o Expesso "e ostentam objectos pessoais dos militares assassinados"
contrasta com as palavras do professor Chossudovsky: "os militares franceses foram MORTOS" em combate, é evidente,,
Xatoo,
Tens toda a razão. Tropas invasoras não são assassinadas. São abatidas. Mas já sabemos que o Expresso é um jornal de referência. Ou não tivesse uma coisa chamada Monteiro como director.
Constatando que um dos efeitos laterais do terrorismo tem sido a redução da liberdade individual, não deixa de ser irónico que a liberdade de expressão, tão querida à comunicação social, seja ela própria o seu carrasco. É esta realidade de livremente relatar actos hediondos, quantas vezes até com insistência e detalhe muito superiores à necessidade de informar, que funciona como autofalante de seres cuja voz de outra forma não sairia dos seus próprios escombros.
E, agora, eis uma daquelas afirmações que dá direito a pares de estalos com diversas proveniências: se o indivíduo tem que ver a sua liberdade diminuída em consequência das medidas anti-terroristas, porque não há-de o mesmo suceder com a comunicação social, quando esta nem sequer é um ser humano? É verdade que sem o peso da censura pública certos grupos sentir-se-iam livres para fazerem o que bem entendessem. Mas também não podemos cair no outro extremo, o qual permite a outros grupos ganharem o medo público fazendo o que bem entenderem.
Como um ecossistema, também a sociedade precisa de equilíbrios. A comunicação social precisa de auto-conter a forma predadora como se alimenta das desgraças.
Guerra é guerra. Só por quem passou pela experiência é que nos pode contar certas experiências. Tal como eu ouvi por quem já experimentou. É mau demais.
Misturando a ténue linha da sanidade mental e juntando muita manipulação é das piores experiências que o Ser Humano pode passar.
Abraço,
Zorze
Transparente... mas ainda há muito, muito cego ingénuo.
http://novaaguia.blogspot.com/2008/08/nenhum-soldado-portugus-para-o.html
RV: «a liberdade de expressão, tão querida à comunicação social»
Em que mundo vive você, meu caro?
É verdade, por vezes parece-me que estou em Marte :-)
Mas a comunicação social, quando se trata de aparências, gosta muito lançar parangonas destas.
Enviar um comentário