sábado, novembro 24, 2007

Chávez vs. Bush vs. Sócrates

Miguel Sousa Tavares - Expresso 24/11/2007

«Se as coisas, como as pessoas, fossem sempre lineares, não me custaria nada reconhecer que Hugo Chávez não é o tipo de democrata que eu recomendaria nem a Venezuela é o tipo de democracia em que eu mais gostaria de viver. Mas as coisas não são lineares: se o fossem, ninguém concederia a George Bush o epíteto de democrata. Aliás, na comparação, ele só sai a perder

«Chávez chegou ao poder por golpe de Estado, mas fez-se eleger e reeleger em eleições cuja credibilidade ninguém contestou, assim como ninguém pode seriamente contestar que ele tem o apoio efectivo de uma maioria consolidada de venezuelanos. É certo que vai fazer plebiscitar uma emenda constitucional que lhe permitirá fazer-se reeleger e perpetuar indefinidamente no poder - coisa que não é bonita, mesmo se plebiscitada, mas que tantos outros fazem, sem necessidade de emendas constitucionais: veja-se Alberto João Jardim na Madeira ou Jardim Gonçalves no BCP. Também é verdade que fez com se calasse uma televisão privada que lhe era politicamente desafecta (não a mandou calar, como os críticos gostam de dizer, limitou-se a não renovar a licença) e que domina amplamente os meios de informação venezuelanos. Mas ainda funciona uma estação de televisão, jornais e rádios da oposição e não consta que haja presos políticos

«Em contrapartida, Bush não chegou ao poder por golpe de Estado - pelo menos com armas na mão - mas chegou por batota eleitoral (a menos que se queira acreditar que os negros da Florida votaram maciçamente por ele, contra Al Gore). A seguir, fabricou uma guerra e todas as ‘provas’ necessárias a arrastar para ela os Estados Unidos e os aliados, de modo a fazer valer a tradição americana de que ‘um Presidente em guerra’ é sempre reeleito. Não fechou órgãos de informação, mas falsificou a informação sempre que isso lhe conveio para esconder a verdade e conduzir políticas ocultas do Congresso e da opinião pública. Também não tem presos políticos internos, mas tem-nos, de outras nacionalidades, mantidos em prisão em Guantánamo, sem quaisquer direitos, nem prazo, nem acusações, naquela que é uma das situações mais vergonhosas de direitos humanos em vigor no mundo de hoje e a mais vergonhosa em qualquer democracia

«Odiado pelos Estados Unidos e por meio mundo, Chávez tem feito mais pelo seu povo do que muitos dos seus antecessores, enquanto que George W. Bush o que fez foi gastar o dinheiro que Clinton lhe deixou nos cofres a financiar os ricos e a tirar aos pobres, fez os Estados Unidos regredirem em todos os capítulos económicos, científicos e ambientais, desprestigiou a América aos olhos do mundo e tornou este um lugar bem mais perigoso para viver graças à sua irredutível ignorância e arrogância. Até já o amigo Durão Barroso, que nos tempos épicos da cimeira das Lages gostava que se soubesse que o tratava por ‘George’, acha mais prudente agora cavar distâncias e dizer-se ‘enganado’. Só mesmo o director do ‘Público’ - que tão entusiasta foi da ‘justa’ guerra do Iraque e que conseguiu ver nas imagens da estátua derrubada de Saddam uma espécie de reinvenção das imagens dos marines a desembarcar em Omaha Beach, em nome da liberdade - é que pode achar agora que perigoso é “ficar à mercê de demagogos mediáticos” como Hugo Chávez.»

«É verdade que um demagogo é sempre perigoso, mas um demagogo no poder num país como a Venezuela, mesmo com o petróleo, não pode fazer grande mal ao mundo. Um mentiroso, no poder num país como os Estados Unidos, pode fazer e faz

«Por uma vez, a nossa habitual diplomacia de não fazer ondas com ninguém até teve razão de ser. Por que razão, de facto, haveríamos de ter Chávez como inimigo ou alvo a abater? Porque isso agradaria ao embaixador dos Estados Unidos em Lisboa? É ele que está em condições de garantir que, se hostilizássemos Chávez, em nome de uma estúpida solidariedade ocidental de espécie confusa, os Estados Unidos estariam de braços abertos para acolher a comunidade lusa de 400.000 almas que vive na Venezuela? E em nome de que coerência de princípios disse Luís Filipe Menezes esperar que Sócrates não deixasse de “abordar o tema dos direitos humanos” com Chávez? Será que espera o mesmo nas relações com Angola ou com a China - essas, sim, verdadeiras ditaduras - onde o bloco central dos empresários tem ou espera vir a ter negócios milionários, garantidos pela cobertura do Estado e por relações sem ondas com as nomenclaturas locais? O dr. Menezes sente-se capaz de explicar ao sr. Américo Amorim que, se um dia for primeiro-ministro, vai pôr o tema dos direitos humanos no topo da agenda das relações com Angola

«Eu prefiro Hugo Chávez a George W. Bush. Para começar, porque se fosse venezuelano ou latino-americano e se houvesse um Bush na Casa Branca, eu também seria ferozmente antiamericano. Depois, porque acho mais saudável alguém que diz a verdade que lhe vem à boca, ainda que muitas vezes disparatada e inconveniente, do que alguém que lê frases feitas no teleponto e por trás dos microfones faz o oposto do que diz e promete. E, finalmente e não menos importante, porque preferia mil vezes jantar com Chávez do que com Bush. Mesmo que, a certa altura e cansado de o ouvir, tivesse de o mandar calar, como fez, e bem, o rei de Espanha.»


Comentário:

Miguel Sousa Tavares diz que prefere Hugo Chávez a George W. Bush. Pois eu prefiro Bush a Sócrates.


É verdade que Bush chegou ao poder por batota eleitoral. É verdade que Bush fabricou uma guerra e todas as ‘provas’ necessárias a arrastar para ela os Estados Unidos e os aliados. É verdade que Bush falsificou a informação sempre que isso lhe conveio para esconder a verdade e conduzir políticas ocultas do Congresso e da opinião pública. É verdade que Bush tem presos políticos em Guantánamo, sem quaisquer direitos, nem prazo, nem acusações, naquela que é uma das situações mais vergonhosas de direitos humanos em vigor no mundo de hoje e a mais vergonhosa em qualquer democracia. E também é verdade que Bush engendrou o 11 de Setembro, que causou cerca de 3 mil mortos nos EUA, para justificar uma guerra infinita «ao terrorismo».

Mas Bush fez tudo isso às claras. Toda a gente percebeu que as três torres de Manhattan só podiam ter caído por demolição controlada. Toda a gente compreendeu que o NORAD (Comando de Defesa Aeroespacial Norte-americano) teve todo o tempo do mundo para interceptar os aviões sequestrados e só não o fez por ordens superiores. Toda a gente soube que no buraquito que apareceu na fachada do Pentágono não cabia um Boeing 757. Bush pode não o ter dito directamente, mas deixou os indícios necessários para que qualquer pessoa, por bronca que seja, percebesse de imediato que se tratava de um "inside job". Bush, praticamente, gritou-nos aos ouvidos que era um simples funcionário do complexo militar-industrial e que estava ali unicamente para encher os bolsos às indústrias da defesa e do petróleo. Bush, na sua malvadez, foi franco nas pistas que espalhou por todo o lado.

Sócrates é mais sinistro. Sendo, embora, um declarado funcionário do lobby bancário-betoneiro, o Primeiro-Ministro faz a coisa pela calada. A coberto dos dez úteis estádios de futebol que mandou erigir para o Euro 2004, Sócrates quer impingir-nos agora um megalómano aeroporto que o país não precisa e TGVs desmedidamente dispendiosos de que Portugal não tem necessidade.

Como afirmou Miguel Sousa Tavares (Expresso 07/01/2006):

«Todos vimos nas faustosas cerimónias de apresentação dos projectos da Ota e do TGV, [...] os empresários de obras públicas e os banqueiros que irão cobrar um terço dos custos em juros dos empréstimos. Vai chegar para todos e vai custar caro, muito caro, aos restantes portugueses. O grande dinheiro agradece e aproveita. [...] Lá dentro, no «inner circle» do poder - político, económico, financeiro, há grandes jogadas feitas na sombra, como nas salas reservadas dos casinos. Se olharmos com atenção, veremos que são mais ou menos os mesmos de sempre.»



Não haja dúvida, entre a criminosa honestidade de Bush e a perversidade encapotada de Sócrates, prefiro de longe o primeiro.
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16 comentários:

Anónimo disse...

A lógica que está por detrás destes actos destes assassinos, está estreitamente ligada com a prepotência e a impunidade. Por isso acho inaceitável que a comunidade internacional admita a continuidade da ocupação do Iraque, mesmo depois de se saber que a invasão foi fundamentada em mentiras. E que a comunidade internacional continue a compactuar com o terrorismo do estado de Israel.

Carlos Marques disse...

É normal pensar-se que a cretinice tem limites, mais concretamente naqueles que foram seleccionados para gerir os destinos deste país, desditoso sem que o percebamos, mas tivemos a prova de que a realidade ultrapassa o melhor do anedotário nacional.

Anónimo disse...

Visita o blog de apoio à candidatura de Portugal à organização do Campeonato do Mundo da FIFA de 2018 e aí poderás ver e assinar a petição criada para este propósito.

Divulga ao máximo de pessoas possível o blog e a petição de modo a tornarmos um sonho quase impossível uma realidade!

O endereço do blog é http://www.portugal2018.blogspot.com/ e o da petição é http://www.petitiononline.com/PORT2018/.

Aurora disse...

O Chavez chegou ao pode através de um golpe de estado?

almada disse...

Só não percebo é porque é que o Miguel Sousa Tavares diz uma coisa completamente falsa, que é afirmar que Chavez chegou ao poder por golpe de estado.
É falso!
Hugo Chavez fez uma tentativa de golpe de estado no principio dos anos noventa, falhou e foi preso, depois de ter comprido a pena de prisão, avançou para a conquista da presidência e do parlamento por voto popular e ganhou democraticamente.

David Lourenço Mestre disse...

Isto é cada vez mais o jornal do incrivel

Anónimo disse...

ta, raisparta o sócrates, o bush e o director do público, com todos os iguais sabujos, como o dos Açores

zedotacho

Anónimo disse...

eh, o sousa tavares afirma essa coisa, porque a ouviu dessa maneira a um fascista espanhol, no Prós e Contras, e já chegou a mais gente "ignorante"

não entendo é por que razão Bush e os mais genocidas da guerra do Iraque não são apontados para julgamento no tribunal de Haia, onde uma vaca americana leva a efeito a condenação de assassinos muito mais pequenos...

e tem paciência, ó Diogo, que por mais descarado que é o sócrates, que nos desgraça cada vez mais aos pobres, rais o parta, mentiroso, que ainda lhe aconteça alguma... o Bush desgraça o mundo inteiro e é o pior de todos

rosane

Carlinhos Medeiros disse...

Só uma correção no artigo do senhor Miguel: Chàvez não chegou ao poder através de golpe militar, ele tentou mas não logrou êxito, mesmo com o apoio popular, tendo sido castigado com prisão por isso. Aliás, foi nessa tentativa de golpe, com o apoio das esquerdas e de alguns militares que o povo Venezuelano se libertou das garras do império. Eu preferiria viver numa ditadura, mas que meus filhos pudessem ter uma vida digna, com escolas, universidades, saúde e lazer sem ter que disputar com os urubus numa democracia "bushiana".

Abraços e parabéns pelo post.

Carlinhos Medeiros disse...

A informação de Almada procede...

Carlinhos Medeiros disse...

Só mais uma informação extra-mídia aos leitores do Diogo. Recentemente veio ao Brasil o jornalista venezuelano Teodoro Petkoff, ex-dirigente comunista, guerrilheiro, ministro e candidato derrotado duas vezes à presidência da república, fundador do MAS – “Movimento al Socialismo”, economista e atualmente editor chefe do jornal oposicionista “Tal Cual”.

O repórter do jornal O Estado de S. Paulo, ao perguntar sobre a revogação da concessão da RCTV mencionou a censura que os jornais de oposição enfrentam naquele país. O desavisado foi advertido pelo entrevistado que afirmou várias vezes durante o programa não existir tal censura na Venezuela. Que ele, como editou de um jornal de oposição, nunca sofreu e nem sofre retaliação e que não existe "ditadura" como dizem no Brasil e no mundo.
A ditadura venezuelana é fruto da banda podre da mídia, o que não quer dizer que ele não seja autoritário, claro, mas, e quem não é?

Diogo disse...

Rosane: «e tem paciência, ó Diogo, que por mais descarado que é o sócrates, que nos desgraça cada vez mais aos pobres, rais o parta, mentiroso, que ainda lhe aconteça alguma... o Bush desgraça o mundo inteiro e é o pior de todos»

Evidentemente, Rosane. Foi uma brincadeira minha. Mas não tenha dúvidas que se Sócrates estivesse na Casa Branca, o Irão já tinha sido bombardeado.

a.castro disse...

Amigo Diogo, estou de acordo contigo. De facto, Sócrates é o primeiro-ministro que tivemos e temos desde o 25 de Abril de 1974.
O teu blog é o melhor da minha lista de blogs!
Um grande abraço.

xatoo disse...

Sócrates foi o modo mais simples de se encontrar uma solução de consolidação das politicas de desmantelamento do Estado Social decidido pelos neocons e pelo aplicação prática em Portugal do "golpe da tanga"
Quando viu que estava a ser enganado, o povoléu votou maioritariamente contra o Barroso&Santana no entanto não houve qualquer ruptura na continuidade. Porque entretanto se fez eleger Cavaco, com umas escassas décimas acima dos 50 por cento. Estes três juntos: Barroso, Sócrates e Cavaco não passam de outras tantas faces do mesmo embuste.
Nada do que tem visibildade no espaço mediático acontece sem que seja previamente concertado entre estes três (mais o Eanes da OpusDei e o Soares da Maçonaria) e sem que seja proveniente das directivas exteriores que comandam a politica dita nacional (para a qual os portugueses não têm nada que ser ouvidos nem achados)
PQP

Anónimo disse...

Nao vem ao caso. Diogo, Acabo de ver o video de Paul Gignon Money as Debt, atraves de um link deixado no Prozacland. Tirei a licenciatura de Economia na Nova, e até agora, nunca me foi explicado como as coisas sao. Muito obrigado por ter deixado esse link, e continue por favor.

Aprendiz de Economista Agradecido

Hugo disse...

Apenas resta mesmo dizer que a diferença entre todos os governantes já referidos é que socrates e bush trabalham para os grandes industriais e para os bancos, enquanto Chavéz trabalha para o povo, mas porquê?Porque os dois primeiros foram eleitos pelo apoio dos seus padrinhos,ou por falcatruas, enquanto chavéz foi eleito pelo povo por ampla maioria.
VIVA CHAVÈZ